13/12/2006 - 8:00
Pierre Faroet, um produtor de vinho francês, aponta para uma pequena porta no número 65 da avenida Champs Elysées, um dos mais luxuosos corredores comerciais do mundo. Em tom amargo, diz: ?É isso que está acabando com nosso negócio.? O local é identificado por uma discreta placa luminosa com os dizeres Culture Bière e se transformou num dos pontos mais badalados de Paris. Trata-se de uma cervejaria gourmet, como os franceses a chamam. O espaço de três andares, sobriamente decorados e ligados por um elevador panorâmico, é dividido entre uma loja de alimentos finos, um restaurante e um bar, onde há rodadas de degustação de cervejas de fabricação própria. Jovens e rodadas de degustação de cervejas de fabricação própria. Jovens e personalidades circulam entre suas mesas e balcões. Paradoxalmente, o sucesso da Culture Bière a colocou na linha de tiro dos produtores de vinho. Sim, porque a cerveja é considerada uma das grandes vilãs na trajetória de queda no consumo de vinho no continente europeu. A ?loira? tem feito o caminho inverso: na União Européia o consumo da bebida saltou 52% entre 1996 e 2001. Nos anos seguintes, a expansão foi menos acelerada e o índice anual ficou abaixo de um dígito. Resultado: está sobrando vinho nas adegas européias, sobretudo as francesas. No mundo, sobram quatro bilhões de litros. Em 2010, calcula-se que a Europa registrará um excedente de 15% de sua produção anual. A ?culpa? da cerveja nessa decadência é apenas meia verdade. Os vitivinicultores franceses também foram duramente atingidos pela inesperada força dos produtores emergentes, como Argentina, Chile, Estados Unidos e Austrália. Com custos menores e um marketing agressivo, esses países passaram a disputar um mercado que crescia num ritmo inferior ao da produção. A cerveja conquistou parte dos antigos apreciadores de vinho porque fez um competente trabalho daquilo que os marketeiros chamam de ?reposicionamento de produto?, utilizando inclusive conceitos dos empresários do vinho. O apelo exclusivamente popular cedeu lugar a uma glamourização da bebida, com a diversificação de sabores e o lançamento de versões aromatizadas (no Culture Bière, há uma opção com frutas da estação, de enjoativo sabor adocicado).
A Culture Bière, encravada na mais francesa das avenidas, personifica essa ameaça à mais francesa das bebidas. Na loja, localizada no térreo junto à entrada, o cliente encontra condimentos e alimentos (inclusive caviares e terrines) com marca própria. Há também temperos feitos à base de cerveja. Uma infinidade de objetos próprios para apreciar a bebida (de abridores de garrafa a pequenas pás para colarinho de cerveja) está ao alcance das mãos, mas nem sempre dos bolsos. Os bebedores podem adquirir os copos mais adequados para apreciar este ou aquele tipo de cerveja ? alguns deles assinados por designers consagrados. No restaurante, o menu sugere harmonização entre as refeições e cada variedade da bebida. Esse estilo moderninho atrai multidões de jovens consumidores que se afastam cada vez mais dos cálices de vinhos, tornando o tom de voz do produtor Faroet cada vez mais amargo.