16/04/2003 - 7:00
O novo relatório do economista Mohamed El-Erian começa com uma reflexão sobre a morte de seu gato, Che. A partir da perda de seu animal de estimação, El-Erian filosofa sobre o lado imponderável da vida, discute a crise da Argentina e o futuro do Brasil. Esse estilo heterodoxo pode confundir os mais conservadores. Mas não se engane. El-Erian é o responsável pelas aplicações em países emergentes da Pimco, empresa que administra fundos de US$ 304 bilhões. Não há números oficiais, mas estima-se que a Pimco seja dona da maior carteira de títulos da dívida externa brasileira. A companhia tem US$ 150 milhões em bônus do País apenas em um dos seus 68 fundos. A aposta é pesada, mas a Pimco não pode reclamar. Enquanto concorrentes
desistiam do Brasil no ano passado, a empresa aumentava seus investimentos. Com a recente recuperação dos papéis brasileiros, a Pimco se deu bem. Seu fundo mais carregado com bônus do País rendeu 14% ? um resultado excelente se comparado a uma perda de 17% da Bolsa de Nova York em 2002. Em 2003, os ganhos somam 10,37%. ?Eu dizia que quem apostasse contra o Brasil ia perder?, diz El-Erian. ?Nós ganhamos, temos os melhores resultados de fundos nos últimos três anos.?
Com um jeito de quem não perde a paciência por nada, El-Erian tem uma longa experiência com o Brasil. Na década de 90, o economista foi o braço direito de Stanley Fischer, o então diretor-gerente do FMI. Quando um ministro de Finanças de um país em dificuldades pedia ajuda a Fischer, passava antes pela sala de El-Erian. Seu nome é cotado, junto com o do ex-ministro Pedro Malan, para ocupar uma vaga na vice-presidência do Fundo. El-Erian não comenta o assunto. No momento, sua maior preocupação é como montar sua carteira de investimentos em meio à turbulência internacional. O Brasil aparece bem posicionado. El-Erian afirma que há um novo ciclo de investimentos em países em desenvolvimento devido a duas mudanças. De um lado, países emergentes, como o Brasil, ajustaram suas contas. De outro, investidores perceberam que, como os juros americanos estão baixos e a Bolsa de Nova York rasteja, são os títulos de nações em desenvolvimento que oferecem o melhor rendimento. ?O Brasil está melhor posicionado do que a maioria dos outros países?, diz Erian.
O otimismo com o Brasil se deve a três razões. El-Erian diz que os papéis brasileiros ainda estão baratos, depois da ?venda irracional? do ano passado. Em segundo lugar, o risco caiu por um motivo simples: quem poderia ir embora já tirou o dinheiro do Brasil em 2002. O terceiro argumento é a melhora nos indicadores financeiros do País. ?A crise da dívida ficou para trás?, afirma. Se não fosse pela guerra, diz El-Erian, a recuperação seria ainda maior. No auge da crise do ano passado, o indicador medido pelo banco JP Morgan alcançou 2 mil pontos ? 20 pontos percentuais acima dos títulos americanos. Hoje, estão por volta de 900 pontos. El-Erian acredita que pode cair abaixo de 800. ?Muitos investidores preferem esperar o fim do conflito para mexer em suas aplicações.? Mas, mesmo depois do fim da guerra, El-Erian afirma que não serão tempos fáceis. O desempenho da economia americana ainda é frágil e a inflação ainda preocupa no Brasil. ?Serão dois passos a frente e um para trás?, diz.
As palavras de El-Erian são muito levadas em conta por outros investidores. Só em países emergentes, a Pimco tem mais de US$ 10 bilhões em aplicações. ?Todos observam os movimentos de El-Erian?, diz o vice-presidente para mercados emergentes do banco Lehman Brothers, Paulo Vieira da Cunha. Mesmo sendo uma referência, El-Erian está acostumado a nadar contra a corrente. Ele vendeu as aplicações da Pimco nos papéis argentinos um ano antes da queda do presidente De La Rúa. Durante o encontro do FMI em Washington, no ano passado, El-Erian circulou com o então ministro Malan e o presidente do BC, Armínio Fraga, garantindo que o Brasil não daria calote. Mesmo assim, os investidores continuaram sacando seu dinheiro do País. ?Perdi algumas noites de sono?, diz o economista. Hoje, El-Erian está aliviado e resolveu dobrar a aposta. O Brasil responde por um quarto das aplicações de seu fundo de países emergentes.