DINHEIRO ? Quando o sr. era ministro, viveu por um ano uma disputa com o ex-ministro José Dirceu, e ambos perderam. E agora, quem vai ganhar a atual guerra palaciana, Dilma Rousseff ou Antônio Palocci?
ALDO REBêLO
? A disputa sobre as visões da economia e do desenvolvimento do Brasil acontece desde a independência. Mais recentemente tivemos Pedro Malan versus José Serra. Não vejo problema na atual disputa. O problema só acontece porque o Palocci está fragilizado. Mas isso é uma questão política e não se pode atribuir a diferenças de opinião que sempre ocorreram no Brasil

DINHEIRO ? O que é mais importante: fazer um superávit de 5% do PIB para agradar aos mercados ou investir mais em infraestrutura?
ALDO
? O que eu vejo é que a austeridade fiscal deve ser valorizada e a Lei de Responsabilidade Fiscal também. Mas a austeridade é igual a um regime absoluto para emagrecer. Ele pode levar à morte. Então, quem faz austeridade, como quem faz regime, tem de buscar o equilíbrio. Ao mesmo tempo, a ministra Dilma tem razão, porque o Brasil precisa de investimentos.

DINHEIRO ? Não é ruim para a economia ter uma um ministro da Fazenda todo o dia convocado para sentar no banco dos réus do Congresso Nacional?
ALDO
? Se toda vez que um ministro for apontado pela oposição como alvo e o presidente mudá-lo, então seria melhor deixar a oposição nomear os ministros do País. Na minha opinião, o ministro Palocci não tem pedir demissão.

DINHEIRO ? Mas se o ministro Palocci ficar, não estará fragilizado?
ALDO
? A vida é assim. Uma hora você está fraco outra vez você está forte. O que tem que fazer é lutar e viver.

DINHEIRO – Mas ele está pedindo o aumento do superávit primário para permanecer no cargo. O sr. concorda?
ALDO
? Não é porque o ministro está nesta situação que se tem de fazer tudo o que ele quer.

DINHEIRO ? Como o sr. avalia um governo que tem pago R$ 150 bilhões anuais de juros e reservado só R$ 10 bilhões em investimentos?
ALDO
? É preciso examinar como o Brasil tinha R$ 61 bilhões de dívida e ficou com R$ 800 bilhões. O governo atual está pagando pelo que não fez. No Brasil, e no mundo, criou-se a idéia de que pagar dívidas e juros é cumprir contratos, e socorrer os pobres é fazer populismo. Os juros da dívida são de R$ 600 milhões por dia.

DINHEIRO ? Mas o Banco Central não ajuda a manter esse problema ao estabelecer juros estratosféricos?
ALDO
? Eu também acho os juros estratosféricos, mas eu achar não resolve nada. O que resolve é a minha pergunta: sem esses juros estratosféricos nós rolaríamos a dívida monumental que nós herdamos? O Banco Central não age como ente neutro. A política que ele adota defende interesses financeiros e sociais muito fortes na sociedade.

 

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Investir é o caminho: “Dilma tem razão ao dizer que o Brasil precisa de investimentos em infra-estrutura”

DINHEIRO ? O sr. tem conseguido explicar isso aos seus amigos comunistas e à esquerda em geral?
ALDO
? Evidente que todas as pessoas de esquerda têm críticas à política econômica do governo. Ela exige sacrifícios enormes para as metas de crescimento, emprego e renda. A pergunta é: qual o caminho alternativo?Ainda não temos essa resposta.

DINHEIRO ? Por que confiar no Congresso que está aí?
ALDO
? Porque aqui estão as representações dos conflitos, das deformações, dos desequilíbrios, das desigualdades, mas também das virtudes e das qualidades da sociedade. Nenhuma instituição sobreviveria a uma investigação como esta a que a que a Câmara está sendo submetida. O Congresso deixa ver seus defeitos, pune seus integrantes e faz isso com transparência.

DINHEIRO ? Mas como explicar à sociedade, e ao empresariado em particular, que se deve confiar em um Congresso que deixou morrer a Super-Receita por interesses político-partidários?
ALDO
? Não foi o Congresso o culpado, mas a exacerbação da disputa política. A Câmara fez um grande esforço e chegou a aprovar a Super Receita. Mas, no Senado, onde a disputa está em um tom mais elevado, houve a sobreposição dos interesses da oposição sobre o interesse do País. A eleição de 2006 falou mais alto.

DINHEIRO ? Neste momento há cinco matérias com prioridade de votação na Câmara, como a Time Mania, preterindo a aprovação da Lei Geral das Micros e Pequenas Empresas. Por que esse desleixo diante das grandes questões econômicas?
ALDO
? Essa avaliação não é correta. Uma das primeiras medidas quando assumi a Câmara foi acelerar o processo de exame da Lei das Microempresas. Além disso, não é o interesse dos times de futebol que está sendo priorizado com a votação da MP da Time Mania. É um interesse da sociedade. Os times de futebol mobilizam mais recursos do que todo o setor petroquímico, por exemplo, ou todo setor de bebidas. É preciso uma reestruturação do futebol.

 

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Julgado: “Berzoni tentou acertar a Previdência, mas foi taxado de perseguir velhinhos”

DINHEIRO ? Este governo ainda tem condições de propor ao Congresso alguma reforma estrutural?
ALDO
? O conceito de tempo é tríbio, ou seja, só dá para entender o futuro se você ligá-lo ao presente e ao passado. A agenda econômica dos últimos três anos foi muito mais produtiva do que a dos últimos 14 anos. O artigo 192 da Constituição de 1989, que regulamenta o capítulo do sistema financeiro, só começou a ser votado em 2003, na Câmara. A reforma da Previdência ficou por muito tempo parada. Estamos na fase final da reforma tributária, que é a unificação do ICMS. Estou otimista.

DINHEIRO ? O que esperar da fase final do governo?
ALDO
? Nós temos disposição para votar a Reforma Tributária. O fim da guerra fiscal entre os Estados é importante, mas em função desta situação de anormalidade na Câmara, que tem que investigar e julgar 18 deputados, sua votação vai ficar para o próximo ano. Mas o assunto não perdeu a prioridade. As nova Lei das Agências Reguladoras também é prioridade.

DINHEIRO ? E a necessidade de se aprofundar a reforma da Previdência Social, que os economistas tanto reclamam?
ALDO
? A Previdência não é problema só do Governo e do Congresso. É também da sociedade. Por enquanto, a reação é de que apenas se está tirando direitos adquiridos, e não que se está corrigindo uma instituição que amanhã não terá condições de garantir direito a ninguém porque ela pode quebrar. Quando o Ricardo Berzoini (ex-ministro da Previdência) tentou acabar com a fraude, ele foi perseguido. O Berzoini é um homem íntegro e sério, mas foi chamado pela imprensa de perseguidor de velhinho. Enquanto a sociedade, os sindicatos e a imprensa entenderem que a Previdência é um problema só do governo, é claro que vai ficar mais difícil resolver o problema.

DINHEIRO ? Muitos analistas acreditam que este governo não tem mais força para aprovar a própria agenda, e que também teria perdido a força para governar. É isso?
ALDO
? A agenda não tem de ser a agenda do governo. A sociedade não pode ter uma posição passiva. É muito cômodo os empresários e sindicalistas ficarem no conforto de seus sindicatos e de suas empresas esperando que o Congresso resolva o problema deles. Os empresários podem discutir essa agenda com o Congresso. As portas dos gabinetes do presidente do Senado, Renan Calheiros, e do meu gabinete, estarão sempre abertas. Ficar esperando não resolve. Se o governo não tem força, quem tiver força que ajude.

DINHEIRO ? Será que vai dar para votar matérias importantes em uma casa cada vez mais fragmentada e em um ambiente político cada vez mais radical?
ALDO
? Parto da idéia de que se Brasil privilegiar as disputas dos partidos e das facções, mergulhará no imobilismo e no impasse. É evidente que para governar o Brasil só se faz com o diálogo construtivo entre governo e oposição. O problema é que começa a existir um ambiente de radicalização no País. Ela ainda está na superfície, ainda não chegou às entranhas da sociedade. Mas temos representantes da Câmara e do Senado ameaçando surrar o presidente da República. Você imagina o que vai acontecer quando essa atitude chegar nas câmaras municipais no interior do País? A radicalização impede a união de forças e inviabiliza o governo no Brasil.

DINHEIRO ? O presidente Lula também não ajuda a radicalizar quando sobe nos palanques e diz que ninguém é mais ético do que ele?
ALDO
? Eu vejo que o Brasil não tem alternativa a não ser pela negociação e pelo diálogo se alguém achar que vai ganhar no grito vai mergulhar o País em um impasse.

DINHEIRO ? Isso é um conselho para o presidente Lula?
ALDO
? O conselho vale para a oposição e para o governo.

DINHEIRO ? O sr. ainda acredita nas chances do presidente Lula de se reeleger?
ALDO
? O presidente é a principal e mais expressiva liderança popular da história política e democrática. Essa força talvez desconcerte os adversários. O PSDB tem lideranças respeitáveis. O José Serra, por exemplo, tem segurança e credibilidade em qualquer partido e País, pelo espírito público, mas não tem a liderança popular que o presidente Lula tem. Pode estar aí, na raiz, a exacerbação desse processo político.

DINHEIRO ? O presidente Lula deve assumir que é candidato a reeleição?
ALDO
? O presidente pode e deve. Ele é a principal liderança das correntes populares e democráticas do Brasil. Não há porque ele não concorrer. Ele tem esse direito. Por que o presidente abdicaria do direito dele? A reeleição é natural.

DINHEIRO ? O presidente Lula disse que o ex-ministro José Dirceu seria cassado. Ele abandonou o melhor amigo à própria sorte?
ALDO ? A relação entre os dois é partidária e antiga, não creio que haja quebra de solidariedade. Mas só o presidente pode traduzir o que acha. Acredito que ele tenha uma atitude solidária em relação ao ministro.