Com vendas de US$ 4,28 bilhões no ano passado, o Brasil foi alçado ao quinto lugar no ranking global de venda de tintas, atiçando o apetite dos grandes nomes internacionais do setor. Mas é na fatia que responde por 64% dessa dinheirama, o segmento de tintas imobiliárias, usadas em decoração, por exemplo, que acontece uma verdadeira batalha por aqui, colocando em campos opostos a alemã Basf e a holandesa Akzo Nobel. Nos últimos oito meses os departamentos jurídicos das duas fabricantes vêm travando uma disputa que envolve várias instâncias, desde o Judiciário, até a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), passando pelo Conar, órgão que regula a propaganda. 

 

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Antonio Lacerda, vice-presidente da Basf: ele diz que a empresa partiu

para o ataque para proteger a liderança no setor

 

Tudo porque os holandeses lançaram a tinta Coral 3 em 1, de olho na faixa premium, uma seara até então dominada amplamente pela Suvinil, da Basf. Nesse nicho, o preço de venda é mais elevado, resultando em uma margem de ganho maior para os fabricantes. A investida alemã também incluiu uma ação de perdas e danos na Justiça, protocolada no Tribunal de Justiça de São Paulo, no valor de R$ 370 mil. Apesar de todas as evidências, o vice-presidente sênior da Basf para América Latina, Antonio Lacerda, tenta minimizar o clima de conflito. “Tomamos medidas como forma de dar um sinal para o mercado de que não se pode lançar produtos com essa característica sem passar pelo crivo da Anvisa”, diz. 

 

O mais recente movimento foi feito pela Coral. Depois de enfrentar um processo no Conar, no qual a Suvinil pedia a suspensão da publicidade de seu produto, os holandeses deram o troco no mesmo órgão. A alegação se baseou no fato de a Suvinil exibir em seu rótulo a mensagem dizendo ser a única tinta contendo propriedades bactericidas aprovadas pela Anvisa. O que não estaria correto porque, além da Coral, a Lukscolor, da brasileira Dovac, também conseguiu aprovar na Anvisa uma tinta com as mesmas características. Menos diplomático, o diretor-geral da Coral, Jaap Kuiper, não poupa a rival. “A Suvinil lançou um produto com o mesmo nome da Coral, chamado Rende Muito, que poderá causar confusão entre nossos consumidores e desconforto entre as empresas”, afirma Kuiper. 

 

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Jaap Kuiper, diretor da Coral: executivo acusa rival de tentar confundir

os clientes da marca holandesa 

 

O executivo não revelou, porém, se pretende tomar alguma medida em relação à nova investida dos alemães. Com a Suvinil Rende Muito Cobre Mais, a Basf, na prática, busca complicar a vida dos holandeses no segmento no qual eles possuem notória competitividade. Lacerda, da Basf, nega que tenha copiado a Coral. “A menção se deve ao atributo da tinta e não configura uma marca”, diz. Não existe um ranking oficial do setor de tintas no Brasil. No entanto, a Basf afirma que a Suvinil detém 40% do mercado geral, em faturamento, e 60% da fatia premium. Para analistas do setor, a disposição das concorrentes de enfrentar a Basf em todos os nichos, mexeu com o brio dos alemães. No caso da Coral, a estratégia de marketing adotada nos últimos quatro anos permitiu que ela conquistasse pontos preciosos. 

 

Desde 2009, ela cresceu, em volume, de 20% para 27%, segundo Kuiper. Um dos fatores que possibilitaram o avanço foi a maior exposição em eventos comunitários, com o programa Tudo de Cor para Você. O vice-presidente da Basf confirma que as medidas adotadas são uma forma de defender a posição da empresa. “Faz parte do nosso negócio inovar”, diz Lacerda, da Basf. “Prova disso é que 72% de nossas vendas vêm de produtos lançados nos últimos cinco anos.” Procurada pela DINHEIRO, a diretoria da Anvisa informou, por meio de nota, que não permite que qualquer empresa cite o nome do órgão em sua embalagem. Disse ainda que os apelos “bactericida” e “antibactéria” deverão, em breve, constar no rótulo de linhas de tintas de outros fabricantes que já ingressaram com pedido de análise na agência. 

 

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Basf acerta as contas 

 

Um processo que colocava a Basf e a Shell (hoje Raízen) no banco dos réus teve seu desfecho na segunda-feira 8. Em um acordo inédito no País, realizado em uma audiência de conciliação pelo Tribunal Superior do Trabalho, elas concordaram em pagar R$ 400 milhões em indenizações por conta da contaminação provocada por uma fábrica de pesticida, na cidade de Paulínia (SP), desativada em 2002 e que já pertenceu às duas empresas. Desse total, R$ 200 milhões serão pagos a título de dano moral coletivo, pois foi constatada a poluição do solo e do lençol freático. O restante do valor será usado na cobertura do tratamento médico vitalício para os 1.058 trabalhadores e seus familiares diretos, além de uma compensação pelo período em que foram expostos aos produtos químicos. 

 

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O processo se arrastava desde 2007 e, de acordo com o Ministério Público do Trabalho (MPT), a contaminação já matou 61 pessoas. A fábrica surgiu em 1977 como uma unidade da Shell e em 1995 foi vendida para a American Cyanamid, cujo controle foi assumido depois pela Basf. A empresa alemã manteve as operações no local até 2002, quando o MPT interditou a planta. De acordo com o advogado trabalhista Maurício Correa da Veiga, o caso tem caráter educativo. “As multinacionais terão mais cuidado com o que fazem no País”, diz Correa da Veiga.