01/04/2015 - 19:00
No bairro nobre do Jardim Botânico, no Rio de Janeiro, os consumidores que desejam contratar um serviço de internet banda larga contam com apenas três das quatro grandes operadoras que atuam no Brasil: Vivo, Oi e Claro. Embora estivesse de olho na renda polpuda dos moradores da zona sul, a companhia italiana Tim chegou tarde demais e não conseguiu espaço para passar a sua rede nos postes do bairro. Por trás do vergonhoso emaranhado suspenso de fios nas metrópoles brasileiras, há um gargalo de infraestrutura comum por todo o Brasil, que distorce o mercado e reduz a competição entre as companhias de telecomunicação.
Uma norma recém-aprovada pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) tenta por fim a uma batalha histórica entre as empresas no compartilhamento de postes, ao organizar melhor os pontos que cada operadora pode ocupar e o preço que devem pagar às distribuidoras de energia, as donas das redes. Nas regiões mais populosas do País, as operadoras novatas não encontram mais espaço para passar a fiação na rede elétrica. É o que acontece principalmente nos bairros centrais de São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. “Para empresas novas, que estão construindo rede, gera-se uma dificuldade de cobertura”, afirma Cícero Oliveira, diretor de Rede Fixa e Transporte da Tim.
“Ou você contorna, aumentando o número de postes – e o custo – ou não conseguirá atender essas áreas.” Basta ver um poste num bairro de uma capital para ter a dimensão exata do problema. Sem fiscalização, as operadoras criam um emaranhado de fios que chega a mais de 50 posições ocupadas, dez vezes o permitido pelo limite atual. Uma boa parte deles nem está mais em utilização, mas acaba se tornando uma arma para impedir o ingresso de mais competidoras. “As empresas mais antigas ocupam várias posições”, diz João Moura, presidente da Associação das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (Telcomp).
“Sobram poucas para as novas entrantes.” A batalha pela divisão dos postes se estende mesmo onde há espaço de sobra. A questão nesses casos é o preço. As novatas acabam pagando um valor até 1.400% maior do que aquelas com as redes mais antigas. De novo, um problema de competição. Em audiência pública promovida pela Anatel, algumas empresas classificaram de “cenário perverso” a atual situação de compartilhamento da infraestrutura de rede. A diferença nos valores é um problema até para companhias mais antigas. A NET, por exemplo, sentiu os custos mais altos quando começou a expansão por novas áreas.
Passou a pagar até R$ 12 pelo espaço, bem acima do R$ 0,50 encontrado nos seus contratos antigos. Sem chegar a um acordo com as distribuidoras de energia, a empresa do bilionário Carlos Slim entrou com processo contra a maior parte delas. “As distribuidoras não querem dividir o poste, e a maneira que encontram para evitar novos entrantes é através de preço”, afirma Fernando Magalhães, diretor de programação e insumos da NET. Segundo ele, a tarifa do poste é o segundo item mais relevante nos custos da TV por assinatura. Para os pequenos provedores de internet, o peso chega a 30% dos custos totais. São eles os mais afetados com os preços elevados cobrados pelas distribuidoras de energia.
A Bignet, uma das fornecedoras de Praia Grande, cidade do litoral paulista onde a renda domiciliar é a metade da de uma casa paulistana de classe média, acredita que seria possível reduzir de R$ 90 para R$ 50 a mensalidade dos seus planos caso a tarifa do poste seguisse a média do mercado, como quer a Anatel. Segundo o presidente da Associação Brasileira dos Provedores de Internet e Telecomunicações (Abrint), Basílio Perez, as tarifas elevadas inviabilizam a operação das menores em várias regiões e diminuem o potencial de clientes atendidos. Cerca de 5.000 pequenos provedores ajudam a complementar a cobertura da internet no Brasil atualmente. As elétricas se defendem. O preço do aluguel não paga o custo da fiscalização dos postes, segundo Nelson Fonseca Leite, presidente da Abradee, a associação do setor.
As novas regras da Anatel entram em vigor neste mês. As operadoras mais antigas serão obrigadas a retirar cabos inutilizados e abrir pontos para concorrentes quando não houver espaço no poste. Para reduzir conflitos no compartilhamento da rede, a agência estabeleceu um preço de referência para as tarifas cobradas às operadoras de telecomunicações. A esperança é que se chegue a um valor próximo dessa referência já nas negociações iniciais entre teles e distribuidoras de energia, mas ainda há dúvidas se isso de fato ocorrerá. As empresas esperam uma enxurrada de conflitos administrativos na Anatel. A guerra vai longe.