25/05/2011 - 21:00
No dia 15 de outubro de 2009, o governo alemão reuniu institutos de pesquisa econômica para ouvir prognósticos sobre a economia da Alemanha, diante da crise que começara a abalar o mundo, um ano antes. Na ocasião, a chanceler Angela Merkel foi prevenida sobre a queda de 5% do PIB naquele ano, em função da drástica redução das exportaçõesde seus carros, máquinas e produtos químicos. Teve, como consolo, a perspectiva de começar a modificar o quadro a partir do ano seguinte, quando poderia alcançar um modesto crescimento de 1,2%.
Cortes de gastos públicos seriam recomendáveis para financiar a recuperação, assim como a busca por novos parceiros comerciais, uma vez que três quartos das exportações da Alemanha seguiam exatamente para os mais afetados pela crise financeira: Estados Unidos e países europeus.
Os alemães mostraram ali uma obstinação e um poder de reação admirável, mudando, por exemplo, o foco do comércio exterior para os países emergentes. Lograram, assim, crescer 3,6% no ano passado, muito acima das expectativas, num recorde para o período pós-unificação das duas Alemanhas, em 1991. Talvez por essa intrincada experiência, de abandonar o socialismo da fronteira oriental, os alemães aprenderam a esperar menos de um Estado paternalista.
Não houve notícias de greves gerais como aconteceram na França, na Grécia, e na semana passada, na Espanha, porque os piores momentos do desapego a benefícios sociais já haviam sido vividos durante o processo de união das duas culturas – os alemães ocidentais que ficaram com o capitalismo perderam muitas vezes a paciência com a necessidade de partilhar espaço, emprego e renda com seus patrícios socialistas.
Foi do alto dessa experiência, e ciente de estar na liderança da recuperação europeia, que a chanceler Angela Merkel disse na semana passada que os europeus do sul deveriam tirar menos férias e se aposentar mais tarde, numa crítica incisiva aos países que não seguem a recomendação da União Europeia de reduzir gastos para sanar suas finanças. A crítica não é gratuita.
É dos cofres alemães que saem parte dos recursos dos pacotes de ajuda financeira a países como Grécia, Irlanda e Portugal. A Alemanha, por sinal, começa a estender a idade mínima para aposentadoria no país de 65 para 67 anos, com o intuito de reduzir o próprio déficit do orçamento. Um assunto que, por sinal, suscitou greves gerais quando cogitado pelos governos da França, Grécia e Portugal.
Em meio a uma discussão geral que a crise de 2009 trouxe sobre o papel do Estado na economia, a Alemanha mostra que o bom-senso supera qualquer debate ideológico. Se a social-democracia exerce ainda hoje uma influência importente na sociedade europeia ao prever um capitalismo mais igualitário, não há sentido para as discrepâncias que existem naquele continente.
“Não podemos ter uma moeda única com pessoas que tiram muitas férias e outras que tiram poucas. A longo prazo, isso não pode funcionar”, provocou a chanceler, que deve surpreender o mundo, uma vez mais, este ano, com os resultados econômicos acima das expectativas.