27/06/2014 - 20:00
Não há dúvidas sobre a disposição das mulheres para o trabalho. Nem em relação à competência das integrantes do outrora chamado sexo frágil. No entanto, as mulheres continuam sendo uma minoria quando o assunto é poder e riqueza, especialmente no mundo corporativo. Na semana passada, uma pesquisa da consultoria americana Equilar Inc. lançou novas luzes sobre essa questão, com a divulgação da lista dos 200 CEOs mais bem pagos dos Estados Unidos. Do total, apenas 11 são mulheres. E, nessa relação, um detalhe pitoresco chama a atenção.
A mais bem paga delas, Martine Rothblatt, CEO da United Therapeutics, nasceu Martin Rothblatt e foi rebatizada em 1994, após uma cirurgia para mudança de sexo. Em 2013, ela embolsou US$ 38 milhões, despontando na décima posição geral de um ranking liderado pelo egípcio-americano Charif Souki, fundador e CEO da Cheniere Energy, que levou para casa nada menos que US$ 141,9 milhões entre salários, bônus e opções em ações. Neste verdadeiro “Clube do Bolinha” corporativo, o sócio da gigante do setor de gás e petróleo é seguido por Mario Gabelli, fundador e CEO da firma de investimentos GAMCO Investors, com US$ 85 milhões, e Larry Ellison, chefão da Oracle, com US$ 78,4 milhões.
Por sua vez, do lado do “Clube das Luluzinhas”, quem aparece na segunda posição é Marissa Mayer, CEO do Yahoo!, com US$ 24,9 milhões. Um traço marcante nesse levantamento é que, pelo menos nos Estados Unidos, quanto mais perto do topo, menor é a diferença entre os salários de homens e mulheres. Ao analisar a remuneração desse seleto grupo de CEOs de empresas com valor de mercado acima de US$ 1 bilhão, os consultores da Equilar chegaram à conclusão de que quem usa rouge e baton recebe cerca de 80 centavos por dólar embolsado por um alto dirigente do sexo masculino.
Para estudiosos no tema, inúmeros fatores ajudam a explicar a prevalência dos marmanjos nos cargos de direção, especialmente no topo. Um deles é que os homens mantêm um nível de coleguismo e de cumplicidade elevado com a turma do futebol dos tempos da faculdade. Mas não é só isso. “As mulheres levam desvantagem porque para chegar ao topo é necessário construir uma longa carreira executiva”, afirma Heloisa Bedicks, superintendente-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC).
“Em muitos casos, elas deixam de trabalhar para acompanhar o marido quando este é transferido de cidade, ou mesmo para cuidar dos filhos.” Pelas contas de Heloisa, apenas 7,2% dos conselhos das empresas listadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) contam com a presença feminina. Definitivamente, não foram estas as dificuldades vividas por Martine, em boa parte de sua trajetória de 60 anos de vida. Isso porque até os 40 anos ela viveu na pele do respeitado empreendedor serial Martin Rothblatt, casado com Bina Aspen.
Graduado em direito e astronomia, ele acumulou prestígio e muito dinheiro graças a tacadas certeiras e ao fundar a SiriusXM Radio, que possibilitou a criação das rádios via satélite e cujo valor de mercado chega a US$ 19 bilhões. Também lançou o projeto PanAmSat, a primeira rede integrada de satélites para comunicação, além do primeiro sistema de geolocalização do mundo, o Geostar, o avô do GPS. Mais. Para ajudar a curar sua filha, Sunee, que sofria de uma doença rara, ele criou uma empresa de biotecnologia, a United Therapeutics.
Em 2013, o laboratório faturou US$ 1,1 bilhão e, agora, em sua versão feminina, Martine ambiciona desenvolver porcos geneticamente modificados que poderiam funcionar como doadores universais para seres humanos que necessitem de transplante de órgãos. A guerra dos sexos promete novas surpresas. Se levarmos em conta os efeitos da tecnologia da informação (TI) nos usos e costumes e também no jeito de se trabalhar no século 21, dá para imaginar que, no futuro, haja um equilíbrio maior entre homens e mulheres nos cargos de comando.
Alguns indicadores nesse sentido estão presentes no relatório da consultoria americana Equilar. Um deles é o fato de que a média salarial das mulheres que comandam empresas de TI atingiu US$ 17,6 milhões em 2013, ou US$ 1,7 milhão acima do ganho médio de seus colegas homens: US$ 15,9 milhões. Apesar disso, sua presença ainda é rara nos cargos tops, pois apenas 6% das empresas de TI contam com CEO do sexo feminino. Quer tenham nascido assim ou se tornado damas com a ajuda do bisturi, como foi o caso do inventor do rádio digital, Martin Rothblatt.