20/06/2025 - 11:58
Sistema iraniano mistura líderes eleitos, clérigos nomeados e generais poderosos. Trazemos abaixo um guia sobre como tudo isso funciona.A ofensiva militar de Israel contra o Irã neste mês de junho marcou uma escalada dramática em um conflito que já durava há muito tempo.
Mas os ataques visavam mais do que apenas alvos militares e estratégicos. Em um discurso, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, exortou os iranianos a se rebelarem contra o que ele descreveu como um “regime cruel e opressivo”.
Seja como guerra psicológica ou apelo genuíno à revolta, a mensagem ressaltou o fato de que a liderança do Irã enfrenta um momento delicado.
Anos de sanções internacionais, conflitos sociais internos e agora um confronto militar aberto levantaram novas questões sobre como funciona a república islâmica.
A hierarquia de poder no Irã é notoriamente complexa. Existem conselhos e escritórios não eleitos que exercem imenso poder, designados ou monitorados por órgãos eleitos ou semi-eleitos.
Aqui está um guia das principais figuras no topo da hierarquia política e militar do Irã e como o poder é exercido em Teerã.
Líder supremo: Aiatolá Ali Khamenei
Nomeado vitaliciamente em 1989 pela Assembleia dos Peritos
Mais alta autoridade no Irã, o aiatolá Ali Khamenei detém poder direto ou indireto sobre todos os assuntos do Estado — da política externa à política interna. Ele nomeia os principais funcionários, incluindo os chefes da mídia estatal e do Judiciário, e tem representantes em quase todas as principais organizações.
Khamenei foi nomeado pela Assembleia dos Peritos após a morte do aiatolá Ruhollah Khomeini, líder da revolução de 1979. Trata-se de um órgão eleito de clérigos islâmicos encarregado de selecionar, supervisionar e, se necessário, destituir o líder supremo do Irã.
O artigo 110 da Constituição descreve os deveres e poderes do líder supremo, incluindo a declaração de guerra e de paz, bem como a mobilização das Forças Armadas.
Presidente do Irã: Masoud Pezeshkian
Eleito em julho de 2024
Masoud Pezeshkian venceu a eleição presidencial antecipada do Irã em julho de 2024, após a morte repentina do presidente Ebrahim Raisi em um acidente de helicóptero dois meses antes. Ele é o nono presidente da república islâmica e o segundo oficial mais graduado do país, depois do líder supremo.
Pezeshkian, conhecido por sua postura moderada, fez campanha prometendo promover reformas sociais limitadas, retomar as negociações com o Ocidente sobre o programa nuclear do Irã e responder ao descontentamento público provocado pela morte de Jina Amini em 2022, uma mulher curda de 22 anos que morreu sob custódia policial após ser presa por supostamente usar seu lenço de cabeça de forma muito frouxa.
Os presidentes iranianos têm mandatos de quatro anos e são responsáveis pela gestão cotidiana do governo e pela representação do país na diplomacia internacional. No entanto, o poder está nas mãos do líder supremo, que detém autoridade sobre as Forças Armadas, o Judiciário e aspectos-chave da política externa. Os presidentes não podem se sobrepor ao líder supremo em questões de importância estratégica.
Líderes reformistas como Pezeshkian – e, antes dele, Hassan Rouhani, que negociou o acordo nuclear de 2015 com o governo Barack Obama – frequentemente enfrentaram forte resistência de instituições conservadoras, incluindo o Conselho dos Guardiães e a Guarda Revolucionária do Irã (IRGC, na sigla em inglês).
Os esforços de Rouhani para aliviar as tensões com o Ocidente sofreram um revés significativo quando os EUA saíram do acordo nuclear em 2018, após uma decisão do então presidente Donald Trump durante seu primeiro mandato.
Conselho dos Guardiães
Presidente: Ahmad Jannati, eleito em julho de 2024
O Conselho dos Guardiães tem a tarefa de garantir que a legislação aprovada pelo Parlamento iraniano esteja em conformidade com a Constituição e os princípios islâmicos.
O órgão de 12 membros exerce poder significativo: seis membros são clérigos islâmicos nomeados diretamente pelo líder supremo, e os seis restantes são juristas selecionados pelo Parlamento. Além de seu papel legislativo, o Conselho também examina os candidatos a órgãos eleitos importantes, incluindo a presidência, o Parlamento e a Assembleia dos Peritos.
Isso lhe confere influência considerável sobre quem pode participar do sistema eleitoral rigidamente controlado do Irã.
Ahmad Jannati, um clérigo linha-dura e aliado do líder supremo, preside o Conselho dos Guardiães desde 1992. Conhecido por suas opiniões conservadoras, Jannati tem desempenhado um papel central na avaliação de candidatos e na formulação de legislação em consonância com os princípios da República Islâmica.
Conselho de Discernimento
Outra instituição importante é o Conselho de Discernimento, encarregado de mediar disputas entre o Parlamento e o Conselho dos Guardiães, especialmente quando as leis propostas entram em conflito com a lei islâmica ou a Constituição.
Seus membros, nomeados diretamente pelo líder supremo, incluem clérigos importantes, oficiais militares, ex-presidentes e tecnocratas.
Embora seja oficialmente um órgão consultivo, o conselho frequentemente funciona como uma extensão da autoridade do líder supremo, influenciando a política nacional e garantindo a continuidade do sistema político durante conflitos internos ou crises.
Guarda Revolucionária do Irã
Comandante-em-chefe: General Mohammad Pakpour, nomeado em junho de 2025
Fundada após a Revolução Islâmica do Irã em 1979, a Guarda Revolucionária do Irã (IRGC) começou como uma milícia voluntária encarregada de proteger o regime recém-estabelecido. Durante a Guerra Irã-Iraque de 1980 a 1988, evoluiu para uma poderosa força militar paralela.
Após o conflito, a IRGC expandiu sua influência ao dirigir grandes esforços de reconstrução, o que lançou as bases para sua crescente presença nas esferas econômica e política do Irã.
Hoje, analistas estimam que a IRGC controla de 20% a 40% da economia iraniana, principalmente por meio de seu braço de engenharia, Khatam al-Anbiya, e de interesses abrangentes em setores como energia, agricultura e finanças – oferecendo empregos e influência política.
Militarmente, a IRGC tem a tarefa de defender o regime, tanto internamente como no exterior. Sua milícia Basij monitora a dissidência interna, enquanto a força de elite Quds supervisiona as operações em toda a região. O braço de inteligência da Guarda rivaliza com os serviços de segurança oficiais e desempenha um papel fundamental no combate às ameaças internas e externas. Sob o comando do líder supremo aiatolá Ali Khamenei, os papéis políticos e de segurança da IRGC se expandiram significativamente.
Após o ataque aéreo israelense de 13 de junho que matou o comandante da IRGC Hossein Salami e vários outros generais de alto escalão, Khamenei nomeou o brigadeiro-general Mohammad Pakpour, um veterano da Guerra Irã-Iraque e chefe de longa data das forças terrestres da IRGC, como novo líder da organização.
Parlamento (Majlis)
Presidente: Mohammad Bagher Qalibaf, eleito em maio de 2020
O Parlamento do Irã, conhecido como Majlis, ou ICA, é uma legislatura unicameral de 290 membros eleitos para mandatos de quatro anos por meio de eleições nacionais diretas.
Desde a primeira sessão parlamentar em 1980, a composição do Majlis mudou drasticamente. Embora os clérigos já tenham ocupado mais da metade dos assentos, eles representavam apenas 5,5% dos legisladores em 2020. Em contrapartida, os membros com experiência na IRGC tornaram-se cada vez mais influentes, refletindo o papel crescente das figuras militares e de segurança na política iraniana.
O Majlis detém amplos poderes legislativos, incluindo a elaboração de leis, a aprovação do orçamento nacional e a ratificação de acordos internacionais. No entanto, sua autoridade é limitada pelo Conselho dos Guardiões, que examina todos os candidatos ao Parlamento e tem o poder de rejeitar legislação que considere inconsistente com a Constituição ou os princípios islâmicos.
Mohammad Bagher Qalibaf, um conservador linha-dura, é presidente do Parlamento desde 2020 e foi reeleito para o cargo em maio de 2025. Ex-general da IRGC, ex-chefe da polícia nacional e ex-prefeito de Teerã, Qalibaf é considerado uma das figuras mais influentes do establishment político iraniano.