Ex-presidente do Citibank, William Rhodes liderou nos anos 1980 comitês de bancos internacionais na reestruturação das dívidas externas de países da América Latina, entre eles, o Brasil. Hoje à frente de consultoria que leva seu nome, ele vê com reservas a atuação do Federal Reserve (o banco central americano) nos casos do Silicon Valley e Signature, que quebraram depois de uma onda de saques e reacenderam o temor de que uma nova crise bancária nos EUA pudesse afetar outros mercados no mundo.

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“O Fed precisa adotar novamente os testes de estresse sobre os bancos médios”, afirmou Rhodes, em entrevista ao Estadão/Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado). Essa exigência caiu em 2018 depois de mudanças na chamada legislação Dodd-Frank – que estabelece normas e padrões para o funcionamento do mercado financeiro americano, e que foi criada depois da crise do subprime, em 2008.

“Não há dúvida de que a credibilidade do Fed e de Jerome Powell (atual presidente do órgão) estão em jogo”. 

Veja os principais pontos da entrevista:

Como o Fed falhou para evitar o colapso do SVB e Signature?

O Fed demorou de seis a oito meses para elevar os juros quando a inflação já estava bem alta, o que o levou a correr para subir as taxas em 2022. Vários bancos privados tentaram se proteger ao aplicar seus recursos em Treasuries (títulos do governo americano). O que ocorreu com SVB e Signature é que eles não tinham gestão de riscos e um profissional para cuidar dessa área. O Fed de São Francisco falhou no caso do SVB, pois não fez nada apesar de ter inspecionado o banco em várias ocasiões. Não sei o que será divulgado no relatório que o Fed apresentará em 1.º de maio sobre o que ocorreu com a supervisão do SVB e do Signature, mas obviamente ocorreram falhas.

Qual sua avaliação sobre o fato de um ex-presidente do SVB ter sido também membro da diretoria do Fed de São Francisco?

Não acredito que esse seja um bom procedimento. O Fed pode até dizer que o executivo fazia parte do conselho mas não formulava políticas. Mas isso não faz diferença, pois a sua presença tem efeito sobre o que a instituição oficial fará.

Como vê a desregulamentação da legislação Dodd-Frank ocorrida em 2018?

Foi um erro claro. Se ela estivesse funcionando como anteriormente, o que ocorreu com o SVB e o Signature talvez teria sido evitado. Acredito também que os dirigentes desses dois bancos privados, inclusive os membros do seus conselhos de administração, devem ser responsabilizados pelo que aconteceu. Acredito que é vergonhoso ter alguém como o ex-deputado Barney Frank, cujo nome está na lei Dodd-Frank, ter pressionado pela desregulamentação dos bancos médios porque ele era membro do conselho do Signature. E este banco também não tinha apropriada gestão de riscos.

O que o Fed deveria fazer?

Precisa adotar novamente os testes de estresse sobre os bancos médios, sem dúvida alguma. A legislação Dodd-Frank deve ser reinstituída. E é preciso tornar responsáveis pelo colapso de bancos os seus dirigentes e membros do conselho, pois essas pessoas agora apenas lavam suas mãos sobre tudo o que fizeram nesses bancos. Tais medidas são ainda mais importantes agora do que durante a Grande Recessão, pois temos hoje a velocidade das mídias sociais, onde os fatos ocorrem em nanosegundos e tornam o colapso de bancos muito rápido. Veja o caso do Credit Suisse. O banco estava com problemas há quatro anos, mas o que realmente o levou à situação recente (venda ao UBS) foi o que ocorreu com o SVB e o Signature, pois seus clientes ficaram preocupados que a instituição também pudesse entrar em colapso.

Jerome Powell, presidente do Fed, chegou a defender no Congresso a desregulamentação dos bancos médios adotada em 2018. Seria oportuno dizer agora que aquela sua posição não estava correta?

Penso que ele está esperando a divulgação do relatório de 1.º de maio. Eu estarei aguardando com muita ansiedade o que virá com o relatório, porque não há dúvida de que a credibilidade do Fed e a de Powell estão em jogo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.