DINHEIRO ? A Daslu passou por um período difícil nos últimos meses. Qual foi a origem dessas dificuldades?
JOSÉ CARLOS AGUILLERA
? A Daslu é uma empresa considerada, no aspecto mercadológico e estratégico, exemplo internacional. Bom, mas se ela é perfeita, o que aconteceu? Foi a tempestade perfeita. Teve o evento da Operação Narciso que bloqueou os produtos importados. Houve mudança na legislação de importação de vestuário. Surgiu a necessidade de certificados de origem de produtos por causa da cota da China. Além disso, passamos a ter até restrições do Ibama e enfrentamos uma greve da alfândega. Isso impregnou os primeiros sete meses de 2006. A Operação Narciso foi em julho de 2005 e a empresa tinha estoque suficiente até janeiro de 2006. Depois disso, os importados desapareceram. A participação de importados nas receitas caiu para 9%. Antes, representavam cerca de 40% do faturamento da Daslu. Só para deixar claro, estamos falando da butique Daslu, que administra a marca Daslu, mais 120 produtos importados e nacionais. Na Villa Daslu, está inserida a butique Daslu, além de 72 operações. O efeito de queda de faturamento foi na butique Daslu e, evidentemente, também permeou a Villa Daslu.

DINHEIRO ? Este é o maior projeto no qual o sr. já esteve envolvido?
AGUILLERA
? Não, foi na Avipal, onde ocupamos todos os cargos de diretoria. Em todas as empresas que operamos, o segredo da administração é conseguir fazer o link da oportunidade de mercado com os talentos internos das empresas.

?A Eliana entende que a expansão da empresa, com as próprias pernas, é limitada?.

DINHEIRO ? Quais são os principais problemas das empresas?
AGUILLERA
? Existe uma miopia, uma visão distorcida. Em todas as empresas que estivemos, o mundo era culpado e eles não tinham culpa alguma. O que fazemos aqui e nas outras empresas que trabalhamos é ter controles gerenciais que monitorem as pessoas para a tomada de decisão e ter pessoas que consigam entender perfeitamente o contexto. Nesse mundo mais complexo, você tem que ter pessoas com idéias divergentes.

DINHEIRO ? Um dos grandes trunfos da Daslu foi a superexposição. Na Operação Narciso, isso não foi prejudicial?
AGUILLERA
? Não tenho pesquisa específica, tenho dados da Eliana (Tranchesi, principal acionista da Daslu). Ela não esperava que a repercussão do lançamento da Villa Daslu fosse tão grande. Houve uma superexposição. Evidentemente, ela serve para o bem e para o mal. A falta de produtos se reverteu em mídia negativa para a empresa. É interessante que eu vou ao shopping e vejo constantemente lojas abrindo e fechando. Ninguém escreve uma linha mostrando o que aconteceu. Aqui, quando são trocadas as lojas, é um negócio bombástico.

DINHEIRO ? Ao se inaugurar uma loja com toda a pompa como aconteceu, não era de se esperar a superexposição?
AGUILLERA
? Não sei. Eu uso a seguinte metáfora: adoraria ser médico legista. A gente olha o indivíduo morto e diz o que aconteceu com ele. O duro é saber, quando ele estava vivo, se você estava indo para o lado certo ou o errado. A Eliana diz que não conseguiu operar a comunicação para o nicho que ela pretendia. Quando a Galeazzi chegou, pretendíamos vender mais para mais pessoas. Depois chegamos à conclusão de que temos que vender mais para os mesmos. Dos 100 mil clientes cadastrados, dois mil são responsáveis por 54% do faturamento. Desses dois mil, 1.880 continuam comprando. Os 120 clientes que perdemos representam 3% das nossas vendas. Eles pararam de comprar devido à falta de importados.

DINHEIRO ? Então não houve uma fuga de clientes depois da Operação Narciso?
AGUILLERA
? No grupo de grandes consumidores isso não aconteceu. No grupo de clientes esporádicos, faço uma comparação com o fluxo de loja desde o início dessa operação. Nessa comparação, caiu 20%. Mas, observe, estou pegando a abertura da loja comparada a um momento normal. Não sei se é correto fazer isso porque na abertura da loja tive uma exposição de mídia muito grande. Mas compare o que era a loja na Vila Nova Conceição e o que ela é hoje. O fluxo anterior era de 600 pessoas por dia. Hoje passa de mil pessoas.

?Cerca de dois mil clientes
respondem por 54% das receitas”.

DINHEIRO ? O que há de diferente?
AGUILLERA
? Atuávamos só como butique e hoje temos, além da butique, outras 72 operações. Estamos nos recuperando. Vou dar um dado. Em 30 de novembro, tínhamos R$ 20 milhões de estoque de importados, a preço de venda. Fechamos 31 de dezembro com R$ 33 milhões. O ideal é chegar a R$ 40 milhões. Em julho de 2006, tínhamos estoque de R$ 6 milhões a preço de venda. Em 2005, faturamos cerca de R$ 240 milhões. No ano passado, o faturamento caiu para R$ 160 milhões. Pretendemos voltar ao patamar anterior em 2007. Entre o final do primeiro trimestre e o segundo trimestre, teremos uma operação anualizada em torno de R$ 240 milhões.

DINHEIRO ? A Daslu fechou 2006 com lucro?
AGUILLERA
? De agosto a dezembro de 2006 tivemos uma geração de caixa positiva de 12%. Mas não há como ter lucro com tamanha queda de faturamento. Não falo o valor porque não tenho balanço publicado. Mas, evidentemente, o meu custo não acompanhou a queda do resultado. Ele ficou num patamar elevado para o tamanho que passamos a ter.

DINHEIRO ? A empresa foi enxugada?
AGUILLERA
? A Daslu tinha 1,1 mil funcionários e hoje tem 570 funcionários. Economizamos R$ 1 milhão por mês na folha de pagamento. A redução não foi percebida pelo cliente. O corte foi feito nos bastidores. Evidentemente, não temos a mesma agilidade hoje que nós tínhamos de receber o produto importado e colocar no ponto-de-venda em algumas horas. Mas voltaremos a ter um quadro de funcionários semelhante ao anterior.

DINHEIRO ? Qual o plano?
AGUILLERA
? Quando a Daslu mudou de endereço, havia a expectativa de que outros dois empreendimentos vizinhos passassem a funcionar em breve. Por exemplo, aqui ao lado há um prédio que deveria ser uma torre de escritórios. Parece que ela sairá até o fim do ano. Isso dará um fluxo de dez mil pessoas na região.

DINHEIRO ? A volta ao faturamento de R$ 240 milhões exigirá o mesmo número de funcionários de antes?
AGUILLERA
? Não, teríamos que faturar 20% a mais. Estimamos o crescimento no número de funcionários em 10% ao ano.

DINHEIRO ? Como ficaram as relações da Daslu com as marcas internacionais depois da Operação Narciso?
AGUILLERA
? Das 120 marcas de importados que eu tenho, o único problema que ainda não resolvi foi a Prada.

DINHEIRO ? Havia problemas de gestão na operação?
AGUILLERA
? O back-office não era proporcional ao tamanho da operação. Para mim, gestão é informação para a tomada de decisão. As informações nas quais se baseavam as tomadas de decisões não eram adequadas ao tamanho do negócio. As primeiras reuniões que tivemos aqui foram muito engraçadas porque tentamos ser cartesianos e lidávamos com gente especializada em arte, moda e design. O modelo que levou a empresa ao patamar de importância em que ela se encontra hoje não servia mais. Por exemplo: temos aqui uma operação chamada Consig, na qual clientes preferenciais recebem peças em sua casa. Ele escolhe algumas, devolve outras. Aí eu emito uma fatura. Pois certa vez tivemos uma reunião de conselho e perguntamos quanto tínhamos de Consig. No início da reunião falaram em R$ 4 milhões e no fim o valor era de R$ 1,9 milhão. O número foi caindo ao longo da reunião porque cada pessoa que era chamada dava uma informação diferente. Hoje temos controles para tomada de decisão.

DINHEIRO ? Quanto tempo a Galeazzi ficará na Daslu?
AGUILLERA
? O nosso contrato é de 18 meses. Entre o oitavo e o décimo segundo mês temos que definir os sucessores. Pode ser equipe interna ou alguns executivos de fora.

DINHEIRO ? E para comandar a empresa?
AGUILLERA
? Não, a presidente é a Eliana Tranchesi.

DINHEIRO ? Mas na época da Operação Narciso ela dizia que não entendia nada de números …
AGUILLERA
? Mas esta empresa vive de marketing.

DINHEIRO ? Ela continuará como executiva ou se recolherá ao papel de acionista?
AGUILLERA
? Ela tem 50 anos de idade e 30 anos de experiência. Depois de ela ter montado a operação da forma como montou na parte mercadológica, não vejo problema algum de ela continuar.

DINHEIRO ? A empresa está sendo preparada para a venda?
AGUILLERA
? Olha, tenho uma carta da Eliana na qual ela diz que não está vendendo a marca, não vende a Daslu e não vende o controle acionário da empresa.

DINHEIRO ? Um parceiro é bem-vindo?
AGUILLERA
? Claro, ela é inteligente. Pode fazer o tipo de que não entende de número, mas vá negociar com ela… Ela entende que o crescimento da empresa, com as próprias pernas, é limitado.

DINHEIRO ? A Daslu procura um sócio?
AGUILLERA
? Se houver alguém interessado em investir, a Eliana e sua família poderão avaliar. Não tenho nada formalizado. Não estamos à procura de um sócio.

DINHEIRO ? Como está a situação da empresa em relação ao Fisco e às acusações de importação irregular?
AGUILLERA
? Eu sou contratado da Lommel, a atual controladora da operação Daslu. A Lommel existe operacionalmente e fiscalmente desde o início do ano passado. A Lommel não foi autuada. Existe, por parte da Procuradoria da República, uma idéia de que a NSCA, que era na época a detentora da Daslu, é solidária numa autuação contra uma trading brasileira. Só estou querendo mostrar a distância entre uma coisa e outra, não quero fazer juízo de valor, porque quem atua nessa área são os advogados e não temos competência para fazer isso.

DINHEIRO ? A antiga dona da Daslu era a NSCA e hoje é a Lommel. Qual foi a mudança?
AGUILLERA
? Eu conheço a Lommel, não a NSCA.

DINHEIRO ? A Daslu sempre pertenceu à família que controla a Lommel. A NSCA, então, é da Eliana Tranchesi?
AGUILLERA
? Não tenho essa informação. Na Lommel, ela tem 40% das ações e os outros três irmãos têm 20% cada um.