DINHEIRO ? O TSE conseguiu montar uma estrutura gigantesca para que mais de 135 milhões de pessoas pudessem votar em todo o País.Quais são os desafios de organizar uma eleição deste porte?

 

RICARDO LEWANDOWSKI ? Primeiro o desafio de uma eleição num país continental, com 135,8 milhões de eleitores, dos quais 111 milhões compareceram no primeiro turno para votar em 20 mil candidatos. Temos centros avançados e centros ainda em desenvolvimento no extremo norte do País. Temos 400 aldeias indígenas. Todas com voto eletrônico. Onde não há eletricidade, as urnas funcionam a bateria e os dados são transmitidos por satélite. Nas 400 mil seções eleitorais em 5.567 municípios tivemos 2,1 milhões de mesários e três mil juízes eleitorais. Recebemos 145 observadores estrangeiros, de 36 países. Muitos de países desenvolvidos, como Estados Unidos, França, Itália, que vieram conhecer o nosso sistema, interessados na nossa tecnologia.

 

 

DINHEIRO ? O Brasil já está exportando esse sistema?


LEWANDOWSKI ? Ainda não. Nós pretendemos, não exatamente exportar, mas cooperar com os países amigos no desenvolvimento de sistema análogo. Assinamos um convênio com os países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa. Vamos assinar com os BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) e o Ibas (Índia, Brasil e África do Sul). Argentina e Uruguai também estão interessados. Mais do que a exportação de equipamento, trata-se de uma política de governo. 

 

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Sensor que faz a identificação biométrica

 

 

DINHEIRO ? E isso também pode gerar negócios para empresas brasileiras?


LEWANDOWSKI ? Sem dúvida. Vamos abrir caminho para que depois os fornecedores de hardware e software possam trilhar este caminho. Vamos fazer contato e colocar à disposição a nossa tecnologia, o nosso modo de fazer eleição e depois a iniciativa privada seguirá esse caminho aberto. Temos mecanismos de segurança dos quais não abriremos mão, mas vamos ensinar o básico. Há interesses de outros países tanto na urna eletrônica quanto na identificação biométrica. Ela foi desenvolvida por nós e busca agilizar e tornar mais segura a identificação do eleitor. 

 

 

DINHEIRO ? A tecnologia foi desenvolvida pelo TSE?


LEWANDOWSKI ? Tudo aqui. Temos um departamento de tecnologia da informação bastante avançado, com 300 pessoas aqui no TSE e três mil em todo o Brasil. Embora as eleições ocorram a cada dois anos, trabalhamos o tempo todo, desenvolvendo e aprimorando novos sistemas.

 

 

DINHEIRO ? Qual é a sua avaliação da eleição do domingo 3?


LEWANDOWSKI ? Eu mesmo fui surpreendido pelos resultados. Nos últimos dois anos, dobramos a velocidade de transmissão de dados. Houve um avanço muito grande. Em 2002, três horas e meia após o encerramento, 15% dos votos haviam sido computados. Em 2006, foram 74%, e agora 90% já estavam apurados três horas e meia após a eleição. Na tarde do dia seguinte faltavam apenas quatro urnas, do Acre, que tiveram que ser transportadas de barco e de helicóptero. Mais de 400 mil urnas foram instaladas em todo o País e havia outras 40 mil prontas, para substituir urnas que dessem defeito. Apenas 0,5% teve que ser substituída. Do total de 1 milhão de eleitores identificados biometricamente, o índice de acerto foi de 93,5%. Outra novidade é que 80 mil pessoas votaram em trânsito. Outras 200 mil votaram no Exterior.

 

 

DINHEIRO ? Com a identificação biométrica existe a possibilidade de a pessoa votar em qualquer lugar? 


LEWANDOWSKI ? Acho que a tendência é caminharmos para isso no futuro. Já conseguimos fazer a impressão da segunda via do título em qualquer lugar do País, com um banco de dados unificado. A nossa meta é que em 2017, quando teremos 150 milhões de eleitores, tenhamos a identificação biométrica implantada em todo o País. Isso gera segurança absoluta. Não há possibilidade de fraude nem engano por parte do mesário.

 

 

DINHEIRO ? Quanto foi gasto?


LEWANDOWSKI ? O orçamento da União destinou R$ 549 milhões para as eleições deste ano, e nós estamos estimando gastos de R$ 480 milhões, já incluindo o custo do segundo turno. Veja o custo da nossa democracia: R$ 3,56 por eleitor. É o preço de um pãozinho de queijo e um cafezinho. Por esse custo, nós temos o resultado da eleição em dez horas.

 

 

DINHEIRO ? Quanto custou a campanha publicitária? Um dos temas era a obrigatoriedade de levar um documento com foto e o título, que acabou caindo na última hora no STF. Não foi um desperdício?


LEWANDOWSKI ? A campanha foi muito barata. Custou R$ 4 milhões, bem menos do que em anos anteriores. Fizemos campanha incentivando o jovem a votar, pelo voto consciente, de esclarecimento sobre o que fazem os políticos. Logo depois dessa campanha verificamos que 95% dos eleitores sabiam que precisavam dos dois documentos. E três dias antes o STF decidiu mudar. 

 

 

DINHEIRO ? Não dá a impressão de que o TSE se torna irrelevante, já que as decisões dele podem ser modificadas pelo STF, como é o caso da Ficha Limpa? 


LEWANDOWSKI ? O TSE tem que aplicar a lei no nível infraconstitucional, não lhe cabe questionar, mas apenas cumprir a lei formulada pelo Congresso. Sobre a Ficha Limpa, o STF decidiu, por 6 a 4, que a lei é constitucional. O Supremo concordou com o TSE. Sobre o momento da aplicação da lei houve um empate. Não foi considerada inconstitucional. 

 

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Paulo Maluf foi o mais votado entre os barrados pela Lei da Ficha Limpa

 

 

DINHEIRO ? Mas o que fica para o eleitor é que o TSE decidiu que a lei vale e ainda assim os candidatos não se sentem obrigados a cumprir a decisão porque acham que podem recorrer ao TSE e ele vai mudar a decisão. Como fica, por exemplo a situação de Paulo Maluf, que pode entrar e levar mais um deputado na legenda? Ou o Tiririca, que pode sair e tirar mais três?


LEWANDOWSKI ? A própria legislação eleitoral permite que quem teve o registro indeferido continue no processo eleitoral. Só não podem ser diplomados, no dia 17 de dezembro, e não podem tomar posse. Os votos de quem teve a candidatura indeferida foram contados, mas não proclamados. Se no futuro o Supremo liberar os que foram barrados pela lei da Ficha Limpa, eles poderão entrar. Não foi um problema criado pela Justiça Eleitoral. Foi criado pelo Congresso Nacional, mas nós é que vamos ter que resolver. Essa alteração abrupta da legislação caiu nas nossas costas. Nós temos duas situações interessantes. Uma é a dos candidatos que tiveram o registro deferido pelo TRE e contestado pela Lei da Ficha Limpa e passaram a campanha com o registro deferido (caso de Anthony Garotinho). Outra situação é quando o TRE impugnou a candidatura e o candidato recorreu (caso de Paulo Maluf) e passou a campanha com a candidatura indeferida, mas ainda cabe recurso ao TSE e até ao STF. Nesse caso, os votos foram contados, mas não estão computados. Vamos ter que decidir essas duas situações. Será que o voto atribuído a eles tem o mesmo valor? Vamos ter que decidir.

 

 

DINHEIRO ? O TSE vai esperar a decisão do STF sobre a validade da Ficha Limpa?


LEWANDOWSKI ? Nós não esperamos. Nós entendemos que a lei é válida. Tanto que esta semana já julgamos e mantivemos a impugnação de candidaturas.

 

 

DINHEIRO ? Como está o caso Maluf?


LEWANDOWSKI ? Ele recorreu ao TSE, o processo já foi distribuído e estamos aguardando o voto do relator. Ele está prestes a ser julgado. Como o Supremo não derrubou a Lei da Ficha Limpa, a nosso ver a lei está em vigor. Para nós ela está valendo e nós estamos tocando o nosso barco segundo o que entendemos ser o correto. Mas não estamos fazendo uma impugnação linear. Estamos olhando caso a caso. Estamos analisando alínea por alínea.

 

 

DINHEIRO ? Há muita crítica de que o presidente Lula está extrapolando a legislação eleitoral ao fazer campanha para a candidata do governo. Qual é a sua opinião?


LEWANDOWSKI ? Não tenho opinião pessoal. Nós nos manifestamos por intermédio do plenário. Sempre que uma entidade ou uma coligação se sente prejudicada entra com um processo. Isso é frequente. Em todas as nossas sessões sempre julgamos quatro ou cinco ações. 

 

 

DINHEIRO ? A candidata Dilma Rousseff defende como prioridade a reforma política, com financiamento público e voto em lista fechada. O sr. acha que isso seria bom?


LEWANDOWSKI ? Eu penso que esses pontos têm que ser discutidos em conjunto. Junto com o voto em lista, temos que discutir a democratização dos partidos políticos. O voto distrital, puro ou misto, financiamento da campanha, público ou privado, tudo tem que ser discutido, agora, à luz da novidade que foi o financiamento da campanha do presidente Barack Obama. O eleitor tem direito não apenas de votar no candidato de sua escolha, mas de contribuir para a sua campanha. Eu pessoalmente estou convencido de que o financiamento feito por empresas tem se mostrado negativo. 

 

 

DINHEIRO ? Como estão as prestações de contas dos candidatos?


LEWANDOWSKI ? Temos muitos avanços. Temos convênios com o Tribunal de Contas, com a Receita Federal, a prestação de contas hoje é mensal. Temos instrumentos para coibir qualquer tipo de abuso, sobretudo lavagem de dinheiro.