A nomeação do executivo paulista Aldemir Bendine à presidência da Petrobras, em fevereiro, surpreendeu positivamente o mercado, traumatizado pelas vicissitudes da maior empresa brasileira nos últimos anos. Afinal, ele havia executado um trabalho elogiado no Banco do Brasil, que funcionou como uma das alavancas de financiamento do crescimento econômico do País, no período recente, sem comprometer sua performance. Na noite de segunda-feira 29, Bendine voltou a surpreender os analistas ao anunciar uma forte revisão do Plano de Investimentos da Petrobras.

Em linhas gerais, a estatal reduziu em 37% a verba do período 2015-2019 para US$ 130,3 bilhões, e anunciou o corte de despesas e venda de ativos, no valor total de US$ 57,7 bilhões. De acordo com o executivo, o plano espelha o novo momento vivido pela petroleira, que se encontra sob ataque em função das denúncias de prejuízos causados por atos de corrupção de seus ex-dirigentes, além da nova realidade do mercado de petróleo, cuja cotação caiu à metade, desde 2004, para a faixa de US$ 60. Com isso, resta à empresa apostar em seus principais negócios.

“Os investimentos estarão voltados para exploração e produção (de petróleo)”, afirmou Bendine ao anunciar os cortes. “E é assim que a gente espera buscar o nosso maior objetivo, que é a desalavancagem da dívida da companhia.” Na avaliação de Bendine, atacar o mega-passivo, estimado em US$ 165 bilhões, levando-se em conta os dados de 31 de março, é condição necessária para que a empresa retome sua capacidade de planejamento e de pensar em seu futuro. Essa espécie de obsessão com os números não é bem vista por setores da própria estatal. A começar pela Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET).

“A revisão das metas de investimentos são compreensíveis, mas deveriam vir acompanhadas da avaliação de um projeto de desenvolvimento nacional”, diz Felipe Coutinho, presidente da AEPET. Mesmo os defensores da medida, no mercado, não deixam de ressaltar os problemas que poderão surgir no caminho. “No que se refere à redução da dívida, o plano é positivo”, afirmam as analistas Nymia Almeida e Marianna Waltz, da agência americana de riscos Moody´s, em relatório divulgado na semana passada. Elas destacam, porém, que existem riscos que não podem ser ignorados.

Um deles é a magnitude dos ativos que serão ofertados ao mercado, como a BR Distribuidora, a mais reluzente jóia da Petrobras. O plano traçado por Bendine prevê a venda de uma fatia minoritária, por meio da associação com um grupo privado ou de um IPO, na BM&FBovespa. A subsidiária é líder na distribuição de combustíveis, no País, com uma rede 7,8 mil postos de serviços, que respondem por uma fatia de 37% do mercado nacional. No ano passado, sua receita líquida somou R$ 98,9 bilhões. Seu gigantismo e o baixo entusiasmo dos investidores para colocar seu dinheiro na bolsa jogam contra os planos de Bendine.

Mas enquanto estes negócios maiores não saem do papel, ele segue firme em sua estratégia. Na quarta-feira 1º, a direção da estatal acertou a venda de sua parcela nos campos de Bijupirá e Salema, na Bacia de Campos (RJ) para a PetroRio (ex-HRT), por módicos US$ 25 milhões. Em março, já havia arrecadado US$ 101 milhões com a comercialização de direitos exploratórios na Argentina, repassados à Companhia Geral de Combustíveis (CDC). De certa forma, os anúncios têm servido para aliviar um pouco a pressão do mercado sobre a estatal. As ações continuam num ritmo bastante volátil, mas já há quem diga que o viés não é mais de baixa.

No pregão de quinta-feira 2, tanto as ações ON, com direito a voto, quanto as PN, se valorizaram 0,89% e 0,99%, respectivamente. A abordagem de Bendine, no entanto, é vista com ressalvas nos meios acadêmicos. “Não sei se o downsing da empresa se justifica ou se estamos diante apenas de uma visão financista, focada nas questões de curto prazo”, afirma o professor Luiz Pingelli Rosa, diretor da Coordenadoria de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ). “É sempre complicado mexer com a Petrobras devido ao seu enorme peso na economia e à sua importância estratégica para o desenvolvimento do país.”