A história do Acre é repleta de conflitos envolvendo suas riquezas. A começar pela formação do Estado, resultado de uma disputa entre Brasil e Bolívia por seu território em 1899. Quase um século depois, em 1988, o assassinato do líder ambientalista Chico Mendes trouxe à tona o embate entre seringueiros e fazendeiros, uma luta desigual e sangrenta que ganhou notoriedade internacional. O capítulo mais recente dessa história de conflitos envolve a maior fortuna do Estado. A briga se dá entre o empresário Roberto Moura, presidente do grupo Recol, e seu irmão por parte de pai, Clealdon Moura. 

 

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(à esq.) Roberto Moura, presidente da Recol: “Esse processo não passa

de uma aventura jurídica” / (à dir.) Clealdon Moura, ex-sócio: “Nunca assinei nem recebi

nada pela venda de minha participação”

 

O Recol é um conglomerado de 11 empresas que inclui concessionárias de veículos, redes de supermercados, farmácias, uma emissora de tevê e uma distribuidora. O grupo possui exclusividade de vendas no Acre, em Mato Grosso e em Rondônia dos produtos de companhias como Ambev, Johnson&Johnson, L’Oréal e Reckitt Benckiser. Trata-se da maior potência empresarial da região, com um valor de mercado estimado em R$ 1 bilhão e faturamento na casa dos R$ 2 bilhões. O embate está sendo travado na 3ª Vara Cível do Tribunal de Justiça de Rio Branco. Clealdon entrou com uma ação reivindicando 50% do capital do Recol. 


Ele alega que seu irmão falsificou sua assinatura em um contrato no qual vendia sua participação na empresa para Raimunda Alves de Souza, mãe de Roberto. Detalhe: o documento é de 1986, mas só teria sido apresentado em 2008, segundo Clealdon. Para entender como a situação chegou a esse ponto, é preciso voltar à época da fundação do Recol, que começou, em 1984, como uma distribuidora da Johnson&Johnson na região, pelas mãos do empresário Domingos Raposo. Para iniciar a empreitada, Raposo se associou aos irmãos Clealdon e Roberto, que, na época, trabalhavam em uma empresa de distribuição de medicamentos. Roberto comprou a participação de Raposo três anos depois, assumindo o controle da companhia. 

 

O que aconteceu após essa transação é nebuloso, envolto em nuvens de versões contraditórias. Isso porque cada irmão conta uma história diferente. Segundo Clealdon, ele e Roberto seguiram trabalhando juntos até 2008. Naquele ano, ele foi chamado para uma reunião com todos os sócios da empresa. Na pauta estaria a ratificação de diversas mudanças feitas no contrato social da Recol. Foi quando ele ficou sabendo que não fazia mais parte do quadro societário da companhia desde 1986. Ainda de acordo com Clealdon, sua entrada nos escritórios da companhia foi proibida e seu salário, de R$ 20 mil, suspenso. “Nunca assinei nem recebi nada pela venda da minha participação”, afirmou Clealdon à DINHEIRO. 

 

Roberto, por sua vez, nega toda essa história. Ele afirma que a negociação entre Clealdon e Raimunda foi legítima. Sua mãe teria desembolsado, na época, 50 mil cruzeiros pelas cotas do seu irmão, o equivalente a pouco mais de R$ 42 mil em dinheiro de hoje. Desde então, segundo Roberto, os dois irmãos não tiveram mais contato. “Esse processo não passa de uma aventura jurídica”, disse Roberto à DINHEIRO. O empresário confirma que houve uma reunião com Clealdon em 2008, mas diz que seu irmão foi convocado na condição de ex-sócio. Duas perícias foram encomendadas para determinar se as assinaturas de Clealdon, transferindo suas cotas, são verdadeiras. 

 

A primeira, feita a pedido da Justiça, atestou que não havia nenhum indício de falsificação. Insatisfeito, Clealdon encomendou uma análise independente, que mostrou que sua assinatura era falsa. Seus advogados agora preparam uma requisição para que seja realizado um novo exame grafotécnico por um perito independente. Essa não é a primeira vez que Roberto é acusado de falsificar assinaturas. Em 2007, o grupo foi alvo de uma investigação feita pela Polícia Federal sobre supostos crimes tributários. 

 

O inquérito apontou que, no período 1986-2007, em 14 das 24 mudanças no contrato social da empresa, as assinaturas de Raimunda, sua mãe, foram forjadas. Isso incluía a transação em que Clealdon vendeu a sua participação. A PF, no entanto, não analisou a assinatura do irmão. Roberto alegou que a mãe sofria de uma doença crônica que prejudicava os movimentos da mão, daí haver divergências nas assinaturas. Essa investigação, inclusive, foi o que motivou a convocação da reunião dos sócios em 2008, que acabou originando toda a confusão envolvendo os dois irmãos. Essa disputa, aparentemente, está longe do último capítulo. Isso porque Roberto estuda entrar com um processo de danos morais contra o irmão.

 

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