Em seus 101 anos de vida, o pernambucano João Pereira dos Santos construiu um dos maiores conglomerados industriais do Brasil. Em 2009, o Grupo João Santos obteve receita de R$ 2,8 bilhões, proveniente de empresas dos setores de cimento, comunicações, agroindústria e celulose. Trata-se de um patrimônio avaliado pelo mercado em cerca de R$ 5 bilhões. 

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O poder em jogo: após à morte do patriarca João Santos (à dir.), o caçula, Fernando,
assumiu o controle da empresa.Parte da família, porém, contesta sua liderança

E é exatamente o controle dessa fortuna que está colocando em lados opostos os herdeiros do clã Santos, que tem sua base de operação no Recife (PE). A morte do patriarca, vítima de infarto em 15 de abril de 2009, trouxe à tona divergências históricas entre os integrantes da segunda e da terceira gerações. 

 

Na disputa interna no clã, quem está levando a melhor até agora é o caçula Fernando Santos, 65 anos, graduado em economia. Na prática, ele já era o principal executivo do grupo e aproveitou o vácuo deixado pelo falecimento do pai para se consolidar no poder.  Para isso, entretanto, teve de abrir espaço para o irmão José Bernardino Santos, 75 anos, responsável pelas usinas de açúcar e álcool e pelas fábricas de papel e celulose. O triunvirato é composto ainda por Maria Clara, 67 anos, que mora no Rio de Janeiro. 

 

No outro lado estão as irmãs Ana Maria, 69 anos, e Rosália Santos, 76 anos, além de Alexandra, Rodrigo e Maria Helena – filhos do primogênito João Santos Filho, morto em 1980 em um desastre de avião no Paraguai. Pessoas próximas à família creditam o racha à dificuldade de relacionamento entre os irmãos e, principalmente, ao fato de o patriarca não ter estruturado um plano de sucessão. 

 

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Linha de frente: a Cimento Nassau garante R$ 2,3 bilhões, ou 80% das receitas do conglomerado  

 

Fernando é uma pessoa extremamente discreta. Pouco sai de casa e quando o faz é para comparecer a eventos corporativos nos quais representa a empresa. É avesso a entrevistas e nunca se deixa fotografar. 

 

Mais que uma queda de braço entre familiares, o que está em jogo, em última análise, é o futuro do Grupo João Santos, cuja principal força é a Cimento Nassau. Essa divisão colabora com 80% das receitas do conglomerado e domina 13% do mercado nacional. 

 

Montante suficiente para lhe garantir a vice-liderança do setor, atrás da arquir-rival Votorantim, que possui cerca de 40%. A morte do patriarca e as disputas internas fizeram com que os concorrentes passassem a olhar a Nassau como um alvo para futuras aquisições. A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) é apontada como sendo um deles. 

 

A direção da CSN alega que não se pronuncia sobre boatos. Deixa claro, porém, que faz parte de sua estratégia expandir a atuação nesse segmento. Hoje, a CSN possui uma fábrica de cimento em Volta Redonda (RJ) e tem em caixa US$ 1 bilhão para construir mais três unidades produtivas e ampliar a capacidade de 1,2 milhão de toneladas de cimento para  5,4 milhões de toneladas. 

 

A Cementos de México (Cemex) é outra que estaria rondando a Nassau. O grupo pernambucano seria a porta de entrada dos mexicanos em um País no qual eles ainda não atuam. Em 1996, a Cemex já havia feito uma oferta e voltou à carga em 2009, após a morte do patriarca Santos. “Não comentamos especulações de mercado”, limitou-se a dizer à DINHEIRO Jorge Perez, porta-voz da Cemex. 

 

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Apesar da situação relativamente confortável do Grupo João Santos, graças às boas perspectivas do mercado de cimento, a empresa enfrenta muitos desafios. A disputa envolvendo o poder já provocou até mesmo a saída de alguns membros da família, como Rodrigo João Pereira dos Santos, 39 anos. 

 

Herdeiro de João Santos Filho, Rodrigo  atuava como gerente de modernização e de gestão da Cimento Nassau. Em geral, empresas envolvidas em brigas fratricidas tendem a sofrer de paralisia administrativa. Isso porque até mesmo decisões corriqueiras acabam sendo adiadas. Ainda é cedo para dizer se esse é o caso da Nassau. 

 

Contudo, surgem no horizonte indícios de que ela poderá ter problemas. Em um segmento em franca expansão, por conta da realização de megaobras de infra-estrutura, a Nassau não conseguiu concluir a ampliação de seu parque produtivo. As dez plantas estão operando a plena carga e as obras de construção de duas usinas em Ituaçu (BA) e em Ribeirão Grande (SP)  estão com o cronograma atrasado. 

 

Orçadas em US$ 300 milhões, cada, essas unidades ajudariam a reforçar a presença do grupo em regiões importantes. E isso pode acabar se transformando em um calcanhar de aquiles para a companhia, que vê a arquirrival Votorantim avançar sobre seus domínios. 

 

Para piorar, neófitas no ramo, como a brasileira Dias Branco Participações e a espanhola PG&A,  também ameaçam o reinado da Nassau, que obtém cerca de metade de suas vendas no Nordeste. A Dias Branco Participações vai desembolsar R$ 650 milhões na construção de duas fábricas e a PG&A pretende aplicar R$ 80 milhões em uma planta na região.

 

As desavenças entre os irmãos e sobrinhos começaram em meados de 2009, durante o  inventário dos bens deixados por João Santos. Além do mal-estar no terreno familiar, disputas desse tipo podem causar um efeito deletério também sobre o patrimônio. 

 

“O pior cenário possível em casos como esse é ver a companhia quebrar”, alerta Ronaldo Da Matta, especialista em gestão de empresas familiares e dono da RM Consultoria. “Manter um ambiente cordial e apostar no diálogo é sempre aconselhável, mesmo que seja para decidir pela venda do negócio”, completa Wagner Teixeira, sócio-diretor da Höft Consultoria.