06/05/2016 - 0:00
É dura a vida da bailarina, seja ela empresária ou simples consumidora. No primeiro caso, pela escassez de clientes para garantir suas vendas. No segundo, pela falta de dinheiro para honrar seus compromissos de compra de produtos e serviços. Esse quadro, que vem se agravando desde os primeiros meses do ano passado, foi retratado pelo mais recente levantamento da Boa Vista SCPC, da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), que registrou um aumento de 19,9% no número de títulos protestados no País, no primeiro quadrimestre de 2016, em relação ao mesmo período do ano anterior.
O estudo mostra um agravamento da situação em abril, atingindo sobretudo as pessoas físicas, com uma variação de 63,9% sobre o mesmo mês do ano passado. Já as pessoas jurídicas tivera um acréscimo de 7,5%. O valor médio dos títulos protestados foi de R$ 3.529 ( R$ 1 763 para as pessoas físicas e R$ 5.380 para as jurídicas).
Segundo o economista-chefe da Boa Vista, Flavio Calife, responsável pelo levantamento, as empresas responderam por cerca da metade (48,8%) do total dos protestos em todo o País, em abril. A região Sudeste contribuiu com a maior parcela dos títulos protestados (47,5%), seguida do Sul (22,0%), Nordeste (17,7%), Centro-Oeste (7,6%) e Norte (5,2%). No acumulado do ano, todas as regiões registraram alta, com o Centro-Oeste aparecendo como a mais afetada, com crescimento de 21,2% no volume de títulos protestados.
Calife observa que a deterioração dos indicadores já vinha ganhando corpo em 2015, cujos resultados foram bem inferiores aos de 2014. Para ele, embora em alta, a inadimplência dos consumidores, ainda está aquém do que se poderia esperar numa crise como a atual. “Diante da falta de dinheiro, o consumidor acaba postergando sua decisão de compra, foge do endividamento e prioriza os compromissos do dia”, diz.
A situação mais dramática seria vivida pelas empresas. “Além da retratação das vendas, os empresários têm de enfrentar o aumento de custos, os juros altos, o pagamento de impostos, compromissos dos quais não pode se livrar de uma hora para outra”, afirma Calife.
Injeção de pessimismo
Inevitavelmente, a deterioração o aumento da inadimplência e dos títulos protestados acabou se refletindo no humor dos consumidores, mostra outro indicador da ACSP, o Índice Nacional de Confiança (INC), que registrou 64 pontos em abril. Foi o pior resultado desde que a pesquisa foi implantada, em 2005. No mesmo mês de 2015, o INC cravara 103 pontos (resultados acima de 100 indicam otimismo e abaixo, pessimismo). “No intervalo de apenas um ano o brasileiro deixou o campo otimista e se tornou profundamente pessimista”, afirma Alencar Burti, presidente da ACSP.
Segundo o INC de abril, elaborado pelo Instituto Ipsos, a partir de 1,2 mil entrevistas domiciliares em 72 municípios, 51% dos brasileiros definem sua atual situação financeira como ruim e 37% acreditam que deverá piorar nos próximos seis meses – há um ano, os níveis de pessimismo eram de 38% e 22%, respectivamente. “Com a chegada de um novo governo, as incertezas do consumidor podem diminuir”, afirma Burti. “Aliás, o grande desafio da nova equipe econômica será justamente recuperar o otimismo da população e aproveitar a queda da inflação para, no momento adequado, iniciar a redução da taxa de juros.”
Curiosamente, a queda na confiança em relação ao futuro foi mais profunda nas camadas mais abonadas da população. O INC das chamadas classes A/B despencou de 60 pontos em março para 49 em abril, enquanto o da classe C saiu de 74 para 63, e o das classes D/E reduziu-se de 85 para 81 pontos. “Isso aconteceu por serem os consumidores A/B o grupo econômico mais bem informado, que começa a ser bastante afetado pelo desemprego, com gerentes, diretores e executivos de empresas sendo demitidos por contenção de gastos”, afirma Burti.
Por região, a Sudeste, justamente a mais rica do Brasil, foi a campeã do pessimismo, com um INC de 53 pontos em abril. A seguir vem o Sul (59), Norte/Centro-Oeste (70). Com um INC de 82 pontos, o Nordeste é a região menos desconfiada em relação ao futuro.