No fim de novembro, o empresário Jorge Paulo Lemann, homem mais rico do Brasil e um dos controladores da cervejaria Ambev, participava de uma conversa com o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, durante intervalo de reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão, em Brasília.

Segundo o relato de interlocutores que ouviram o bate-papo, Lemann reclamou da situação econômica brasileira com Trabuco. “A vida está dura até para vender cerveja”, disse Lemann.

A frase é surpreendente porque há uma máxima que, diante de uma grave crise econômica, as empresas de cigarros e de bebidas conseguem atravessar sem grandes sobressaltos esse período de dificuldade. Essa crença é baseada no fato que diante das mazelas da vida, as pessoas se refugiam em vícios para enfrentar a dura realidade.

Mas a julgar pelos resultados da Ambev nos nove primeiros meses de 2016, Lemann tem razão. A cervejaria brasileira, que sempre mostrou habilidade para enfrentar as mais diversas crises brasileiras, está passando por um de seus mais “desafiadores” momentos, para usar um eufemismo presente em sua apresentação de resultados.

No terceiro trimestre de 2016, a geração de caixa da companhia (medida pela Ebitda) caiu 19,9%, passando de R$ 4,9 bilhões, no mesmo período do ano passado, para R$ 3,9 bilhões. A margem Ebitda reduziu-se 8,3 pontos percentuais, de 46,5% para 38,2%.

Para uma companhia acostumada a cortar custos – uma dos mantras internos é que custo é igual a unha, se não cortar sempre cresce -, as despesas gerais administrativas (excluindo depreciação e amortização) cresceram 11,3%, por conta dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro.

“O terceiro trimestre provou ser o mais difícil trimestre de um ano já muito desafiador”, escreveu Bernardo Paiva, CEO da Ambev, no relatório para o mercado, explicando os resultados. “Estamos profundamente desapontados com a queda do Ebtida no Brasil. Somos uma companhia de donos e donos assumem o resultado pessoalmente.”

Ao longo dos anos, a Ambev também se tornou uma das estrela na bolsa de valores. Avaliada em R$ 255,9 bilhões, as ações da cervejaria estão em queda de 6,6% neste ano. O índice Ibovespa, que reúne os principais papéis da bolsa brasileira, sobe 31,1%.

Com a queda de suas ações, a Ambev corre o risco de perder o posto de companhia mais valiosa do Brasil. A Petrobras, cujos papéis preferenciais sobem 120%, está avaliada em R$ 204,5 bilhões, aproximando-se de recuperar a liderança, perdida por conta dos problemas decorrentes da Lava Jato.

Um relatório do Merrill Lynch, divulgado pelo Brazil Journal, traz mais más notícias para a Ambev. Os analistas do banco de investimento usaram uma tática antiga na própria Ambev, que é o gerenciamento por sola de sapato. Eles visitaram supermercados e bares de São Paulo. Confira o que descobriram.

“Nossa principal conclusão é que a Ambev aumentou os preços da cerveja no canal on-premise (bares e restaurantes) em 8%-12% desde setembro, enquanto no canal off-premise (os supermercados), os preços subiram apenas 7%, em média, abaixo da inflação recorrente de 8,5%. Além disso, os concorrentes não seguiram a Ambev, uma vez que os preços de Kirin caíram 9% e ficaram estáveis na Petropolis.”

Escreveram mais: “Embora acreditemos que as margens de cerveja da Ambev no 3T16 bateram no piso e que a concorrência agressiva não é sustentável a longo prazo, acreditamos que a capacidade dos consumidores de aguentar novos aumentos de preços reais [acima da inflação] é reduzida depois que os preços da cerveja subiram por muito tempo acima da inflação.”

Conclusão: a vida da Ambev, que já não estava fácil, vai ficar ainda mais difícil. 2016 é um ano que definitivamente não está descendo redondo.