“Para mim, a empresa que o momento exige é como um trem‑bala, trafegando numa sinuosa montanha‑russa”. Ouvi essa afirmação durante um agradável café da manhã com o presidente de uma tradicional empresa sediada no sul do País. Ele estava respondendo a uma provocação que fiz durante nossa conversa, sobre a necessidade de transformação significativa no modelo de negócio e no modelo de gestão do conglomerado que ele lidera.

Afirmei que a construção da empresa necessária para o futuro não deve ser vista como uma simples edição melhorada da velha empresa. Trata‑se de uma entidade diferente, baseada em crenças e pensamentos originais bem distintos daqueles que embasaram a formulação das empresas cambaleantes, ainda existentes em vários segmentos.

+ As sete questões essenciais

Essa constatação é decisiva. Afinal, muitas empresas têm sido condenadas ao fracasso pelas mesmas estratégias que as fizeram ter sucesso há uma ou duas décadas. Isso explica por que ícones não conseguiram ficar em pé na hora em que precisaram competir para valer, quando os ventos deixaram de ser favoráveis.

Já não são suficientes os princípios sob os quais essas empresas floresceram: especialização e organização do trabalho em áreas funcionais; padronização dos produtos; e economia de escala. Adicionalmente, viraram pó suas vantagens, antes consideradas inabaláveis, como domínio das fontes de matérias‑primas; controle de fornecedores; acesso privilegiado a informações; e reservas financeiras vultosas.

No passado, se alguma coisa não andasse bem, havia tempo hábil para se ajustar, corrigir erros e eventuais desvios. Quando aparecia um competidor, as empresas não precisavam se preocupar muito, pois já estavam estabelecidas no mercado e cabia ao novo entrante provar que podia bater de frente e sobreviver, se tivesse sorte. Porém, no cenário de mudanças intermitentes em que vivemos, quem perde um dos sinais da estrada pode ficar irremediavelmente fora da corrida.

Sabemos que negócios tradicionais estão sendo destruídos da noite para o dia por soluções disruptivas trazidas por startups e por empresas que inovam em seus modelos de negócio, de forma muito mais coerente com o momento que vivemos. Gostei bastante dessa metáfora proposta pelo meu cliente, pois o atual contexto do mundo empresarial, com dramáticos altos e baixos e elevada carga de adrenalina, realmente nos lembra a montanha‑russa dos parques de diversão.

Percebemos que não são apenas os mais fortes que engolem os mais fracos, nem somente os maiores que derrotam os menores. Agora, também os mais velozes ultrapassam os mais lentos. Na multicompetitividade, a postura vencedora se assemelha mais aos ciclos vistos em tática de guerrilhas: criar vantagens competitivas temporárias; destruí‑las; criar outra vantagem; e assim sucessivamente.

As circunstâncias mudam todos os dias, em todos os negócios e, cada vez mais, de maneira imprevisível e acelerada. A velocidade virou questão de vida ou morte. Os dirigentes são forçados a decidir frequentemente em tempo real, sem condições para analisar nem percorrer as tradicionais etapas e rituais do planejamento estratégico.

À medida que o mundo torna‑se mais incerto e volátil, fica difícil prever o futuro. Não é mais possível fazer planos rígidos para um horizonte de 10 ou 20 anos. Podemos, no máximo, definir rumos estratégicos. A prática tem demonstrado que, muitas vezes, quando os planos ficam prontos, as circunstâncias já mudaram.

A velocidade é apenas um dos diferenciais. Começamos a aprender duramente que, daqui em diante, teremos não “apenas” de cuidar dos nossos melhores clientes para evitar o avanço dos concorrentes, mas também de lutar muito a fim de blindar nossos melhores talentos do assédio daquelas empresas que precisam das mesmas competências críticas de que dispomos.

Há poucas manobras previsíveis dos adversários. Por outro lado, temos duas certezas: avançarão sobre nossos clientes em busca de market share e, depois, sobre nossos melhores talentos para seduzir nossa competence share. Ou vice‑versa!

Relacionei para o meu interlocutor as principais características da empresa que precisamos construir. Conheça abaixo esse passo a passo:

1- Construa Propósito e um “Mapa de Geração de Valor”
Seguir esse caminho ao invés de apenas buscar atingir resultados de curto prazo gera valor em decorrência do significado percebido por entidades, pela sociedade em geral e nas comunidades onde a empresa atua. Esse movimento conduz a resultados surpreendentes, muito além do mero valor econômico.

2- Atraia e desenvolva líderes inspiradores
Eles são verdadeiros “construtores de pontes” e investem na formação de outros líderes, indo muito além dos chefes, “construtores de paredes”, que são individualistas e sectários, formando apenas seguidores.

3- Coloque o cliente no centro de tudo
É preciso reconhecer que seu sucesso é consequência direta do sucesso dos seus clientes, distribuidores e parceiros. Eduque o cliente para o que de fato necessita, indo muito além de simplesmente atender a seus desejos e “superar suas expectativas”. Venda soluções e não apenas produtos.

4- Integre organicamente seus modelos
Ação que envolve o seu modelo de negócios, modelo de gestão e modelo organizacional (estrutura). Desta forma, é possível ir muito além da “colcha de retalhos” que caracteriza as fragmentadas empresas tradicionais.

5- Customize a gestão das pessoas
A customização da gestão das pessoas é diferente de apenas gerenciar cargos. Respeita a individualidade de cada um, oferecendo uma razão inspiradora para suas vidas.

6- Valorize o intangível
Diferencie‑se dos concorrentes ao cultivar confiança, capital humano, relacionamentos, cultura e clima de inovação. É uma forma de se alçar a um novo patamar em relação a empresas que continuam apostando somente na gestão de capital, equipamentos, estoques, tecnologia e instalações.

7- Reinvente‑se continuamente
Esse movimento constante passa pela criação de cultura de inovação permanente e incorporar clientes e parceiros na busca de soluções a quatro mãos.

Além de todos esses fatores, a empresa que o momento está a exigir:
• Incorpora a sustentabilidade ao seu modelo de negócios;
• Coloca a tecnologia a serviço do ser humano e não vice‑versa;
• Estrutura‑se de forma horizontal, direta e flexível, focada em centros de resultados e negócios, em vez de se organizar em estrutura funcional e por centros de custos.
Precisamos construir o futuro, enquanto garantimos o presente, buscando no curto prazo a excelência do longo prazo.

*César Souza é presidente da Empreenda, consultor e palestrante em Estratégia, Liderança, Clientividade e Inovação. Autor de diversos best sellers e do novo livro “O Jeito de Ser Magalu” (Rocco, 2021)