02/12/2011 - 7:00
DINHEIRO ? O sr. foi um dos fundadores do Greenpeace e hoje é um dos mais ácidos críticos da organização. Por que passou a combatê-los?
PATRICK MOORE ? Acredito que o Greenpeace perdeu o rumo desde meados da década de 1980, quando começou a sofrer uma forte influência de políticos de extrema esquerda, que hoje dominam a agremiação. A partir daí, a ONG abandonou o pensamento lógico e as bases científicas para se dedicar ao que chamo de ambientalismo pop. Para defender suas bandeiras eles agora usam como elemento motivador das pessoas o discurso baseado no pânico, fazendo crer que todos deveríamos ter cuidado com o que comemos, bebemos e até com o ar que respiramos.
DINHEIRO ? Alguns colegas seus dessa época o classificam como uma espécie de Eco Judas. Como o sr. lida com isso?
MOORE ? Esse apelido foi dado por um colega que, posteriormente, me pediu desculpas. Ele foi perdoado e continuamos amigos até a sua morte. Em geral, ataques pessoais de qualquer natureza não me afetam, já que mostram apenas quão pobre é o pensamento de muitos ativistas. Como eles não podem contrapor meus argumentos com bases científicas só lhes restam as ofensas pessoais.
DINHEIRO ? O parlamento brasileiro está votando uma lei que faz mudanças profundas no Código Florestal Brasileiro. O sr. tem acompanhado esse debate?
MOORE ? Não estou seguindo passo a passo. No entanto, sou particularmente favorável a leis que garantam a exploração econômica sustentável e que ajudem a evitar a derrubada ilegal de florestas, seja por queimadas, seja por outra forma de desmatamento. Mas isso não quer dizer que creio que essas áreas devam ficar intocáveis. Sou um defensor do uso econômico sustentável das áreas verdes não apenas na Amazônia, mas em todos os lugares do mundo. Até porque isso garante, em última análise, o processo de preservação dessas áreas, e não o contrário. Quando a floresta é bem explorada, ela se torna a indústria mais sustentável do planeta.
DINHEIRO ? Outra questão que vem provocando polêmica no Brasil, do ponto de vista ambiental, é a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Qual sua opinião a respeito da obra e seus impactos?
MOORE ? Nunca estive no local onde pretendem construir a usina. Por conta disso, não posso falar sobre seus possíveis impactos na região. Contudo, sou um defensor dos projetos de hidreletricidade porque eles garantem o suprimento de energia limpa e confiável. Para o Brasil continuar seguindo o caminho do desenvolvimento será preciso contar com energia abundante e barata para movimentar a economia.
DINHEIRO ? O sr. tem dedicado boa parte de seu tempo em defender o uso da energia nuclear. Os últimos acontecimentos, especialmente na Usina de Fukushima, no Japão, mostraram que essa opção apresenta riscos elevados, não acha?
MOORE ? A organização à qual estou vinculado, a Greenspirit Strategies, gasta boa parte de seu tempo debatendo sobre as poucas opções da humanidade para a geração de energia em larga escala. Nossa conclusão é de que a energia nuclear é uma das mais sustentáveis. Nos meus tempos de Greenpeace, eu combati essa modalidade. Contudo, mudei de ideia. As partículas nucleares não são vilãs. Tanto isso é verdade que elas são usadas na medicina e se constituem na forma mais eficiente de gerar energia, por serem limpas e seguras.
DINHEIRO ? A prática, no entanto, vem mostrando que não é bem assim…
MOORE ? Se você está se referindo ao acidente na Usina de Fukushima, no Japão, é preciso levar em conta que o terremoto e o tsunami mataram cerca de 20 mil pessoas. Por outro lado, nenhuma delas morreu em decorrência do vazamento radioativo em Fukushima e existe uma pequena possibilidade de que, no futuro, aconteçam óbitos relacionados a esse acidente. Mesmo se você incluir os outros dois grandes acidentes nucleares, o de Chernobyl, ocorrido na Ucrânia, e o de Tree Miles Island, nos Estados Unidos, o número total de mortes ligadas à radiação foi infinitamente menor que o ocorrido em acidentes ligados a instalações de petróleo e hidrelétricas. O número de óbitos, no caso de catástrofes nucleares, é sempre amplificado por ecologistas.
Manifestantes em Durban, na África do Sul, onde acontece a COP-17,
conferência sobre o clima, organizada pela ONU
DINHEIRO ? Apesar disso, as autoridades alemãs decidiram fechar as usinas nucleares do país. Como analisa essa medida?
MOORE ? Na minha avaliação, eles estão cometendo um erro. Os alemães estão pagando entre ? 0,50 e ? 0,70 centavos por KW/hora e essa conta deverá crescer muito com o abandono dessa opção. Oito instalações já foram desligadas e as demais terão o mesmo destino até 2022. As opções solar e eólica são caras e não dão conta da demanda do país. Uma prova disso é que a Alemanha passou de pequeno exportador de energia para um grande importador. A conta está em ? 3 bilhões por ano. Boa parte é comprada da França, que, ironicamente, tem sua matriz fortemente baseada em energia atômica. Trata-se de um contrassenso. Pior: para compensar a baixa geração de energia está em discussão o investimento de usinas termelétricas alimentadas a carvão mineral.
DINHEIRO ? Em uma rápida pesquisa na internet se descobrem diversos artigos colocando o sr. como um lobista do setor de energia nuclear. Afinal, o sr. recebe dinheiro para promover essa causa?
MOORE ? Como já falei, minha empresa, a Greenspirit Strategies, atua como consultora de governos e empresas do setor industrial em diversos aspectos da sustentabilidade. Tenho orgulho de ser um defensor da energia nuclear. Trata-se de uma forma limpa, segura e competitiva para a produção de eletricidade. Muitos ecologistas falam em iniciativa privada como se fosse algo ruim. Discordo. Só trabalho com clientes que partilham de meu ponto de vista em relação à sustentabilidade, que leva em conta um equilíbrio entre aspectos ambiental, social e econômico.
DINHEIRO ? A elite política e ambiental do mundo está reunida em Durban, na África do Sul, buscando formas de prorrogar o Protocolo de Kyoto, que prevê metas para a redução das emissões de gases que causam o efeito estufa. O sr. apoia essa ideia?
MOORE ? Esse instrumento já produziu seus resultados e não faz sentido renová-lo. Não se pode impor metas globais. A tese que defendo, e que foi debatida exaustivamente na conferência da Organização das Nações Unidas, realizada em Cancún em 2010, é que as metas de redução devam ser definidas por cada país. Cada um deles possui uma peculiaridade, quer seja no aspecto econômico ou no estágio de seu desenvolvimento, o que torna impossível a tarefa de impor o mesmo limite de emissões para todos.
Moore, em foto da década de 1980 quando integrava as fileiras da ONG
DINHEIRO ? Algumas pessoas dizem que apenas os espertos ganharam com o mercado de créditos de carbono. O sr. concorda?
MOORE ? Não sou um entusiasta desse dispositivo. E, apesar de não ser um especialista nessa matéria, os casos de fraude detectados na Europa mostram que esse mercado se constitui em uma porta aberta para a manipulação. Acredito que a redução das emissões só será possível por meio de um trabalho realmente de conservação ambiental, aliado a instrumentos tecnológicos baseados em pesquisa e desenvolvimento.
DINHEIRO ? O sr. acredita que o aquecimento global é um dos maiores desafios enfrentados pela raça humana?
MOORE ? Sou um cético em relação a esse debate. Sei que o clima do planeta está mudando, mas trata-se de um fenômeno que faz parte da história. Tenho me debruçado sobre esta questão por muitos anos. O que temos visto é o crescimento de uma histeria em torno do tema e que parte da premissa de que o planeta vai ser destruído por conta da ação do homem. Simplesmente me recuso a comprar essa tese. Não nego que a ação do homem possa ter algum impacto. No entanto, é preciso lembrar que muitas coisas acontecem devido aos fenômenos naturais. E tem sido assim desde muito antes do início da Revolução Industrial. Não concordo com essas campanhas alarmistas que vemos por aí.
DINHEIRO ? As sementes geneticamente modificadas se tornaram uma espécie de ?Geni? para os ambientalistas. No entanto, até agora nada foi provado em relação aos possíveis problemas relacionados aos alimentos transgênicos. Qual a sua posição nesse debate?
MOORE ? Sou um defensor ferrenho das pesquisas com organismos geneticamente modificados, quer seja na alimentação, quer seja na produção agrícola ou na medicina. Não existem cientistas loucos ou diabólicos envolvidos nesse tipo de pesquisa, apesar de muitos ambientalistas quererem nos fazer acreditar no contrário. Uma boa mostra disso é que as grandes academias de ciência aprovam essas pesquisas sem restrição. A campanha contra os alimentos transgênicos se transformou em um fiasco do ponto de vista moral e intelectual.
DINHEIRO ? Como o sr. avalia a postura do presidente Barack Obama no campo da sustentabilidade?
MOORE ? Ele tem feito um bom trabalho, especialmente no apoio ao setor nuclear. Contudo, como resultado de um ambiente político polarizado no Congresso americano, o debate de assuntos importantes ficou paralisado e precisamos ficar atentos para saber com que o presidente conseguirá levar sua agenda adiante.