11/07/2014 - 20:00
O movimento logo na entrada da matriz da Livraria Cultura, no Conjunto Nacional – localizada na Paulista, a avenida mais importante de São Paulo –, não justifica o olhar sério, sem um vestígio de sorriso nos lábios, do empresário paulistano Sergio Herz, 43 anos. Herdeiro de uma das maiores redes de livrarias do Brasil, fundada por sua avó paterna, Eva Herz, no imediato pós-guerra na segunda metade dos anos 1940, ele está, na verdade, comemorando o final de um semestre em que a Livraria Cultura nunca faturou tanto em sua história.
“Até o fim do ano, 20 milhões de pessoas terão passado em nossas 19 lojas espalhadas pelo Brasil e 60 milhões de internautas terão visitado nosso site”, diz Herz. “Espero fechar o ano faturando R$ 520 milhões”, afirma o executivo. Se a estimativa estiver correta, as receitas de 2014 devem ser 15% maiores do que as do ano passado. Por trás desses números está uma estratégia de diversificação na qual Herz tem investido pesado, desde 2012, quando assumiu o comando, no lugar do pai, Pedro Herz, responsável pela cultura da rede, hoje no conselho de administração.
“Não vendemos somente livros”, afirma. “Proporcionamos experiências.” Quem visita a loja do Conjunto Nacional pode assistir a uma peça de teatro, ir ao cinema, comprar tablets, câmeras fotográficas estilo Polaroid, discos de vinil, capinhas para celular, tomar um café espresso, ver bonecos de super-heróis em miniatura e até dar de cara com o ator Dan Stulbach antes ou depois das gravações – no teatro dentro da loja – do seu programa de rádio semanal. A lista é extensa. “Nossas lojas físicas têm uma estratégia parecida com a do Starbucks”, diz Herz, referindo-se a uma tática de posicionamento que os americanos chamam de “third place” (terceiro lugar, em português).
“A ideia é de que o cliente considere a Livraria Cultura como um terceiro lugar para frequentar, além de sua casa e de seu trabalho.” Não é preciso estudar muito o modelo de negócio da Livraria Cultura para perceber que quem frequenta o local não está lá apenas para comprar livros. Tem gente passeando, comendo, escutando CDs, papeando, azarando e até sentada no chão. Em lojas como a do Shopping Iguatemi, em São Paulo, o cliente também pode fazer cursos de gastronomia, de design de jogos, de autopublicação em quadrinhos, de teatro e de canto.
“Queremos agrupar o máximo de atividades culturais em nossas lojas físicas”, diz Herz. “Houve um casal que se conheceu na unidade da Paulista e depois pediu para se casar lá. Eu deixei.” As inovações não param. Até o final do ano, a loja do Iguatemi receberá mais um reforço – o restaurante Maní, da gaúcha Helena Rizzo, considerada pela revista britânica Restaurant a melhor chef do mundo. “Gastronomia também é cultura”, diz Herz. Loja eletrônica, a livraria também tem. Mas a estratégia online é completamente diferente.
“Lá temos de competir com gigantes, como a Amazon e o Ebay”, diz Herz, que investiu R$ 8 milhões numa plataforma própria de e-commerce criada pela Oracle. “O caminho é a customização, ou seja, um site para cada cliente”, diz Herz. “Por isso, a plataforma vai trabalhar com big data para ofertar o produto certo.” À primeira vista, a empolgação de Herz poderia parecer exagerada diante da situação do mercado varejista de livros nos países desenvolvidos. Nos Estados Unidos, por exemplo, a maior rede de livros do país, a Barnes and Noble, fechou 63 unidades nos últimos seis anos.
Sua maior concorrente, a Borders, encerrou suas operações em 2011. “É sinal de que o digital veio para ficar”, diz Herz. “É provável que a Livraria Cultura não se sustente só vendendo livros.” A diversificação, que não foi seguida por muitas das redes debilitadas, revelou-se crucial para as lojas físicas. “São nove milhões de produtos que a rede oferece”, diz Herz. “Dá para ganhar dinheiro com essas mercadorias no físico e no virtual.” Por enquanto, as lojas físicas têm dado muito mais frutos. Elas representaram 75% dos R$ 450 milhões faturados pela Cultura no ano passado.
O desafio, segundo Herz, é dimensionar o número de livrarias que a rede pode manter sem operar com prejuízo, em razão da concorrência digital. “É uma conta que o mercado ainda não sabe fazer”, diz Herz. Essa é a principal razão que levou a Livraria Cultura a suspender a inauguração de novas lojas neste ano. “Para o futuro, a meta é aprimorar nossa plataforma digital e monetizar ao máximo a diversificação das nossas lojas, e mais nada.” Por enquanto, a rede fica na matemática do primeiro grau. Resolve sua equação com uma fórmula antiga do varejo: a diversificação. Para Herz, porém, há uma incógnita, nesse exercício: a sucessão na Livraria. “Não faço nem ideia de quem vou escolher para me substituir.”