04/06/2008 - 7:00
QUANDO HÁ DINHEIRO SObrando, a tendência é gastar mais. Isso vale para a sua casa ? e também para as empresas. Em tempos de economia aquecida e fábricas funcionando a todo o vapor, é relativamente comum que os gestores afrouxem o cinto. O perigo está na perda do controle. Os custos de produção não podem crescer a ponto de engolir a linha mais importante do balanço, o lucro. Pois o que se vê nas empresas brasileiras é que os gastos crescem numa velocidade maior do que as receitas e os lucros. Nos últimos cinco anos, os custos de 187 companhias abertas subiram 42% e a receita, 38%, de acordo com um estudo realizado pela Economática a pedido da DINHEIRO. Em 2007, o dinheiro gasto para fabricar mercadorias, o chamado CPV (Custo de Produto Vendido), somou R$ 413,7 bilhões nesse universo. O volume é 8% acima do apurado no ano anterior. Mas o estudo mostra que, no mesmo período, a receita líquida subiu exatamente os mesmos 8%, alcançando R$ 666,2 bilhões. Então, a situação se equilibrou, certo? Não necessariamente. ?O ideal é que a receita com vendas cresça de forma mais acelerada que os custos?, diz Erivelto Rodrigues, presidente da Austin Asis Consultoria.
Claro que, quanto maior a produção, maiores serão os gastos nas fábricas. A conta de energia elétrica, luz, água e, principalmente, de insumos chega ao final do mês mais salgada. Mas os ganhos de escala e eficiência deveriam fazer com que a coluna de despesas crescesse menos do que a de receitas. Nem sempre a conta fecha dessa forma. E não há o menor sinal de mudanças no horizonte. ?Insumos mais caros e o contínuo enfraquecimento do dólar devem continuar assombrando os mercados?, afirma Armando Santi, diretor da Trevisan Escolas de Negócios. ?E há outro fator de pressão nesse cálculo. Há 50 anos, os investimentos produtivos eram feitos a cada 20 anos. Hoje, exige-se que ocorram a cada cinco anos. Resultado: essa conta vai estar sempre pressionada.?
O levantamento da Economática mostra que em sete setores da economia, com 64 companhias listadas, o custo de produção cresce a taxas mais elevadas que a da receita ? em alguns casos, numa velocidade duas vezes maior. Nesse grupo, estão empresas dos segmentos de siderurgia e metalurgia, papel e celulose e transportes, que vivem um período nada propício para um equilíbrio nas contas. A receita de exportação mais magra (reflexo do dólar fraco) e os preços das matérias- primas em alta turbinaram os gastos. Do outro lado do ringue, estão 56 companhias de cinco setores econômicos, como telefonia, construção civil e eletroeletrônico. Em sua maioria, estão numa situação oposta à do outro grupo, ou seja, o desempenho das vendas supera a pressão dos custos. Elas atendem basicamente o mercado interno, em plena fase de bonança. Um dos casos mais dramáticos é o da área de transportes. Enquanto o CPV subiu 24,5% em 2007, a receita aumentou apenas 11%. A Gol é um exemplo da situação crítica. O custo total da empresa continuou subindo em 2008 ? só com combustível, foram gastos R$ 664 milhões, 84% acima do apurado em 2007. A taxa de expansão na receita foi maior (alta de 54,3% até março), mas as despesas dispararam 77%. ?Se a empresa tem custo excedente, vai buscar viabilidade econômica. Ela tem que gerar receitas suficientes para cobrir aquele custo?, disse Constantino Junior a interlocutores, durante reunião em maio com a TAM para tratar do apagão aéreo.
O cenário também não é risonho para quem depende do mercado internacional. Maior fabricante de alimentos do País, a Sadia vende para fora 52% de tudo que produz, mas a disparada no consumo dos grãos tem pressionado o preço de seus produtos. Além disso, com o enfraquecimento do dólar, ela recebe menos moeda estrangeira por mercadoria exportada. A seu favor contam o aumento na demanda, o que lhe permite ajustar os preços. ?A expectativa de aumento nos custos de grãos é crescente em 2008. A companhia tem concentrado esforços em repassar esse acréscimo para os preços tanto no mercado interno quanto no mercado externo?, informou Gilberto Tomazoni, presidente da Sadia, em relatório de resultados. Na companhia, o custo subiu 23,5% neste ano e as vendas líquidas, 20,9%. Principal concorrente da Sadia, a Perdigão sofreu impacto semelhante. Os custos de produção apresentaram elevação de 73,1% e totalizaram R$ 1,9 bilhão. ?A melhoria de preço não foi suficiente para amenizar o efeito dos custos que cresceram 15,5%?, disse Nildemar Secches, presidente da empresa, em relatório da administração.
Tanto Sadia como Perdigão puderam contar com os ganhos de renda dos brasileiros para compensar parte das perdas com e x p o r t a ç õ e s . Além disso, reforçaram as vendas para regiões com moedas mais fortes. Já a Aracruz não teve a mesma opção. Cerca de 98% de suas receitas são auferidas em dólar. Mas 75% dos custos de produção são influenciados pelo real, o que representa “um fator de risco para a empresa?, costuma admitir Isac Zagury, diretor de relações com investidores. De janeiro a março, o lucro líquido da Aracruz caiu 40%. As receitas subiram módicos 1% e o custo do produto vendido aumentou 14%. Mesmo assim, Carlos Aguiar, presidente da empresa, mantém o otimismo. ?Nosso objetivo é manter a empresa entre aquelas com mais baixo custo de produção do mundo?, afirmou a analistas. Trata-se, na verdade, de uma luta para manter a competitividade numa economia cada vez mais globalizada e concorrida.