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O escritório da companhia anglo-americana Vodafone Airtouch na cidade de São Francisco, na Califórnia, esteve movimentado no último dia 18 de setembro. Ali, executivos das principais companhias fabricantes de equipamentos para telecomunicações davam o primeiro passo em, busca de um contrato bilionário. Em suas pastas, levavam propostas para fornecimento de infra-estrutura tecnológica para a mais nova investida da maior empresa de telefonia celular do mundo, com cerca de 30 milhões de aparelhos conectados em 25 países e valor de mercado de cerca de US$ 280 bilhões: discretamente, a milhares de quilômetros de distância, a Vodafone começa a preparar sua chegada ao Brasil. O estardalhaço que costuma cercar suas ousadas tacadas só deve ser ouvido a partir de janeiro, quando o Ministério das Telecomunicações vai leiloar as concessões para as novas bandas de celulares no País. Aviso aos concorrentes: Chris Gent, o presidente mundial da Vodafone tido como um dos mais brilhantes estrategistas do planeta, já traçou suas metas e elas incluem simplesmente todo o território nacional. ?O Brasil, é claro, merecerá uma abordagem compatível com o tamanho de sua economia?, confirmou à DINHEIRO, da sede da companhia em Londres, a vice-diretora de Relações com o Mercado da empresa, Melissa Stimpson. ?Não posso, no entanto, dar mais detalhes sobre a estratégia que adotaremos no País.?

Os executivos que estiveram em São Francisco, porém, já puderam ter uma amostra dos planos da Vodafone. E estão excitadíssimos. A expectativa menos otimista do quanto a empresa britânica estaria disposta a investir num primeiro momento ultrapassa a casa de US$ 1 bilhão apenas em equipamentos, sem contar os valores a serem gastos para arrematar concessões junto ao governo brasileiro. E nisso os ingleses não costumam economizar. Em junho passado, desembolsaram US$ 8,7 bilhões para adquirir os direitos de exploração da próxima geração de telefonia móvel no Reino Unido e têm outros US$ 26 bilhões reservados para sair à caça de licenças em outros países do mundo. ?Nosso plano estratégico elegeu como prioridade consolidar nossas operações na Europa e nos Estados Unidos. Em uma segunda etapa, iniciada no ano passado, voltamos nossos olhos para o sudeste asiático e a América Latina?, afirma Melissa. ?O mercado brasileiro de telefonia é considerado por nós um segmento muito excitante, com potencial de crescimento muito grande.? Essa avaliação já havia sido passada à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que também confirmou à DINHEIRO o interesse dos ingleses no leilão das bandas C, D e E da telefonia celular.

O páreo será disputadíssimo e deverá atrair todos os grandes participantes desse mercado, com ou sem investimentos anteriores no País. Nas últimas semanas, a movimentação no setor tem sido frenética, com as empresas afinando suas estratégias para estar na crista da terceira grande onda de investimentos estrangeiros nas telecomunicações brasileiras. A alemã Siemens, por exemplo, acaba de desembarcar no Brasil sua divisão de Informação e Comunicação Móvel e, apenas no primeiro ano, espera faturar R$ 1 bilhão vendendo equipamentos às operadoras e telefones celulares para os usuários. A canadense Bell Canada, por sua vez, definiu na semana passada uma radical mudança de planos de olho na banda C. Vendeu sua participação na Vésper, empresa espelho das operadoras Telemar e Telefonica, por US$ 875 milhões para fazer caixa e entrar na disputa pelas concessões.

 

Megatransações. Até janeiro, quando o leilão acontecer, a Vodafone quer estar com tudo pronto para um início imediato de suas operações no Brasil. O processo de seleção de fornecedores continua em outubro, quando as empresas concorrentes devem voltar a enviar emissários a São Francisco. Uma a uma, as sete candidatas ao contrato ? a francesa Alcatel, a sueca Ericsson, as americanas Motorola e Lucent, a alemã Siemens, a finlandesa Nokia e a canadense Nortel ? defenderão suas propostas financeiras e técnicas. ?A empresa solicitou projetos para instalação de rede com capacidade para atender, de imediato, 500 mil assinantes em todo o território nacional?, revelou à DINHEIRO o diretor de uma grande empresa do setor, que foi à Califórnia entregar o seu envelope. Os planos ambiciosos são uma marca da companhia inglesa. Criada há 15 anos, ela tornou-se a maior do Reino Unido graças a uma política de criação de lojas de vizinhança, que a aproximou dos usuários. Depois, partiu para ganhar o mundo, primeiro com pequenas aquisições dentro da Europa e, mais tarde, com megatransações intercontinentais. Hábil negociador, o presidente Chris Gent costurou operações históricas, que surpreenderam o setor. Em janeiro de 1999, derrotou a americana Bell Atlantic na disputa pela Airtouch, uma das maiores operadoras de celulares dos Estados Unidos. Meses depois, cooptava a antiga rival Bell Atlantic a juntar-se a ele na Verizon, um colosso de US$ 70 bilhões que estendeu ainda mais seus negócios americanos. No início deste ano, quem foi pego de surpresa foram os acionistas da Mannesmann, maior empresa de telefonia móvel da Alemanha. Eles bem que tentaram resistir a uma oferta de aquisição hostil feita por Gent, mas acabaram sucumbindo a uma soma recorde de US$ 183 bilhões pelo controle da companhia.

Com potências como a Vodafone no páreo, crescem as apostas de que o governo brasileiro poderá arrecadar até R$ 10 bilhões nos leilões da Banda C. Novos competidores trarão ao mercado novos investimentos e muitas oportunidades de negócio. É em função delas que a alemã Siemens decidiu alterar radicalmente o perfil de sua subsidiária brasileira. A empresa chegou ao País em 1867 para instalar uma linha de telégrafo encomendada pelo imperador Dom Pedro II e, desde então, marca posição como uma das maiores nos setores de bens de capital e infra-estrutura. Uma face da companhia, porém, continuava desconhecida por aqui: a de grande fornecedora de equipamentos para telefonia móvel. Com tecnologia incompatível com os sistemas adotados no Brasil, a Siemens havia ficado de fora da disputa pelos mercados da banda A e B. Mas a definição do padrão GSM para a banda C levou os alemães a sonhar em recuperar o tempo perdido. Na semana passada, Rudi Lamprecht, presidente da divisão de Informação e Comunicação Móvel da empresa, desembarcou em São Paulo para anunciar investimentos de US$ 700 milhões no País e um ousado plano de conquista de 25% do mercado de instalação de redes e 15% do varejo de aparelhos celulares. Com isso, espera sair do zero para um faturamento de R$ 1 bilhão ao final do primeiro ano de atividade por aqui. ?Sabemos que haverá concorrência, mas temos excelente tecnologia e temos ótimos produtos para o usuário?, afirma Lamprecht, que, em cinco anos, transformou a Siemens na quinta maior empresa do mundo no setor.

O maior desafio dos alemães estará justamente no balcão das lojas de celulares. Sua marca é pouco conhecida do consumidor brasileiro e aqueles que a conhecem tem mais facilidade para associá-la a turbinas de hidrelétricas do que a aparelhos eletrônicos. Por isso, a nova divisão ganhará a maior fatia da verba de marketing da companhia no Brasil. Cerca de US$ 50 milhões serão gastos, no primeiro ano, para divulgar os celulares de terceira geração da empresa e bater marcas como Nokia, Motorola e Ericsson na preferência dos brasileiros. ?É o maior volume já gasto em marketing pela empresa no País?, afirma Hernam Wever, presidente da Siemens do Brasil. As fábricas da empresa vão ser adaptadas para a produção dos novos equipamentos. A de Curitiba fará equipamentos para o mercado corporativo (rede de telefonia, por exemplo). Em Manaus vão ser produzidos os aparelhos celulares.

Colaborou Mariza Cavalcanti