15/05/2002 - 7:00
São três horas da tarde. Uma mulher de meia idade, usando roupas de grifes famosas, entra
no consultório de um cirurgião plástico. Sai de lá, trinta minutos mais tarde, radiante e com uma aparência cinco ou até dez anos mais jovem. Valor pago pelo trabalho: cerca de US$ 1 mil. Desde o começo da década de 90, a cena descrita acima vem-se tornando cada vez mais comum na rotina de homens e mulheres que vivem nas grandes cidades da Europa, dos Estados Unidos e do Brasil. O resultado ?milagroso? é obtido graças à aplicação de injeções de um produto derivado da toxina butolínica, descoberto pelo laboratório americano Allergan Inc.. Batizada de Botox, a substância é responsável por uma febre revolucionária que se alastra na indústria da beleza. No ano passado, suas vendas somaram US$ 310 milhões. Mas isso foi antes de a Federal Drugs Administration (órgão que regula os setores farmacêutico e alimentício nos EUA) liberar o seu uso no combate às rugas de expressão, o que aconteceu no mês passado. Agora, com o mercado americano escancarado, prevê-se uma explosão. Em Wall Street, analistas apostam que, em pouco tempo, as receitas com o Botox deverão ultrapassar a casa de
US$ 1 bilhão por ano, transformando-o em uma espécie de Viagra da medicina estética.
Os executivos da companhia concordam. Prova disso é que na semana passada começou a veicular nos EUA uma gigantesca campanha publicitária, orçada em US$ 50 milhões, para explorar a decisão do FDA e atrair novos usuários. O ?sinal verde? do órgão, cujas decisões têm repercussão internacional, levou os executivos da empresa a rever para cima as projeções de venda também por aqui. ?As receitas vão crescer 40% neste ano?, aposta Carlos Alberto José, gerente de marketing para América Latina da Allergan ? ele não revela qual a participação do Brasil nessa bolada. E não é apenas a companhia que espera faturar alto. Um de seus concorrentes, o laboratório Biosintética, espera dobrar, este ano, as vendas de um produto semelhante ao Botox. Marcel Visconde, vice-presidente de marketing do laboratório Biosintética, calcula que o mercado dessa substância já soma, por aqui, R$ 58 milhões por ano. Deste montante, o Botox fica com a maior fatia (R$ 43 milhões). O restante vai para o caixa da Biosintética, que desde outubro de 2000 importa e distribui o Dysport, fabricado pelo laboratório francês Beaufour Ipsen. ?O produto já responde por 5% do nosso faturamento global de R$ 300 milhões?, conta Visconde, que vai investir R$ 5 milhões em ações de divulgação da substância junto à classe médica.
Na disputa entre os fabricantes pela hegemonia deste segmento cada um usa as armas que tem à mão. A Allergan vale-se do pioneirismo que ajudou a transformar seu produto em sinônimo de categoria. O fabricante do Dysport, por sua vez, alardeia as vantagens em relação ao líder: rendimento 30% maior por ampola, além de seu composto poder ser armazenado à temperatura ambiente. O executivo da Allergan, no entanto, não se intimida: ?Não há consenso na classe médica sobre os benefícios citados pela concorrência. Até porque os produtos não são iguais?, desdenha José. As rusgas não acontecem por mero acaso. É que o Brasil é tido como um mercado estratégico quando o assunto é estética. Pelas contas da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, em 2000 foram feitas 350 mil intervenções deste tipo ? montante inferior apenas ao registrado nos EUA. De acordo com Luiz Carlos Garcia, presidente da entidade, não há informações precisas sobre o número de tratamentos feitos à base de Botox. ?É difícil fazer um levantamento estatístico porque a substância é ministrada também por dermatologistas?, justifica Garcia. Lembra daquela senhora citada no início desta reportagem? Pois é, em pouco tempo ela terá de repetir o ritual. É que o
?milagre? proporcionado pelas injeções da toxina butolínica
dura, no máximo, quatro meses. As idas constantes ao médico, pelo visto, não intimidam aqueles que estão em busca da ?eterna juventude? e, claro, podem pagar por isso. Os laboratórios Alergan e Biosintética agradecem.