Câmbio favorável, aumento da demanda e queda nos preços das telas de cristal líquido. A conjunção desses três fatores produziu, nos últimos tempos, um fenômeno inédito no mercado brasileiro de informática: a queda dramática de preços e o começo da massificação dos notebooks, os objetos mais desejados do mundo da tecnologia. Nos últimos quatro anos os valores desses computadores de colo caíram pela metade no Brasil. Na semana passada, sublinhando esta tendência, a americana Dell, dona de uma fábrica no Rio Grande do Sul, lançou um laptop por R$ 2.999, rompendo uma marca no preço de equipamentos que já foram vendidos no Brasil por US$ 10 mil a unidade. Com essa performance, o mercado brasileiro de computadores, que comercializa 5 milhões de unidades por ano e cresce ao ritmo de 9%, segue na direção de economias mais desenvolvidas, nas quais os notebooks preparam-se para superar os computadores de mesa em volume de vendas. Isso já é realidade no Japão e caminha para sê-lo também nos Estados Unidos. No primeiro semestre de 2005, segundo os dados da consultoria International Data Corporation foram vendidos no Brasil cerca de 75 mil notebooks. A expectativa dos fabricantes é fechar o ano com a venda de 150 mil unidades portáteis. A base instalada de laptops em território brasileiro já está próxima de 1 milhão de unidades.

O impulso de consumo por trás desse nova tendência pode ser resumido a uma única palavra: mobilidade. No Brasil já existem mais de 800 locais onde é possível abrir-se o notebook e ligar-se instantaneamente à internet, sem fio. Por mês surgem 30 novos pontos só na cidade de São Paulo. São hotéis, cafés, livrarias e restaurantes que oferecem esse serviço aos seus clientes. Ninguém quer ficar de fora desse novo mundo, muito menos os fabricantes de computadores. Estima-se que 80% dos 50 milhões de laptops vendidos no mundo este ano terão recursos de conexão sem fio. ?Os laptops são o futuro?, resume Daniel Rostirola, gerente de produtos da Dell Brasil. Um bom exemplo dessa febre está na rede francesa Fnac. Dona de três unidades no país, a loja vende 500 laptops por mês. Cerca de 40% do faturamento do setor de informática ocorre em função desses produtos. No ano passado, a Fnac registrou um crescimento nessa área de 71% em relação a 2003 e para este ano deve fechar com uma variação de 45%. ?Temos 18 modelos à disposição dos clientes. Há quatro anos eram apenas três?, afirma Pierre Courty, diretor-geral da Fnac. E a demanda cresce até nas faixas de preço que têm como alvo os consumidores mais sofisticados. A HP, cujo equipamento mais barato custa em R$ 3 999, lança nesta semana um notebook capaz de ser operado por controle remoto, com um disco rígido que armazena dados equivalentes a 70 mil disquetes e uma nova tecnologia que reduz o contraste da tela. O valor: R$ 7.399. Pode parecer caro, mas apenas um ano atrás uma máquina dessa categoria era vendida por R$ 10 mil.Entre as empresas que disputam esse mercado florescente, a mais agressiva é a HP. ?Vivemos um bom momento para toda a indústria?, diz Cristina Palmaka, vice-presidente da companhia americana no Brasil. A estratégia da companhia, diz ela, é repassar a diferença cambial para os preços dos seus produtos. Trata-se de aproveitar o cenário favorável, porque os fabricantes sabem que se o dólar desvalorizar os preços dos notebooks serão afetados. Mais de 85% dos componentes desses equipamentos são importados, sujeitos aos humores do câmbio. Para não comprometer o plano de vendas de longo prazo as companhias tentam encontrar caminhos alternativos. Um deles é aproveitar o momento favorável de mercado para criar uma demanda mais forte e o hábito de uso dos laptops. Assim, eles continuariam sendo vendidos mesmo que o dólar voltasse a cair. ?O que pode nos ajudar numa situação de risco cambial é a contínua queda nos preços mundiais das telas de cristal líquido e dos processadores?, diz Flávio Philbert, gerente-executivo da Itautec. Nas telas, a boa notícia é que a Samsung coreana está investindo US$ 1,7 bilhão na ampliação mundial de suas unidades de LCD na Ásia.

Nos mundo dos processadores, a novidade é que a Intel já se comprometeu a reduzir para 30% a diferença entre as maquinas portáteis e os computadores tradicionais. Lá fora, isso é quase uma realidade. No Brasil deve demorar um pouco para acontecer. Como em outras áreas da tecnologia, o mercado brasileiro de notebooks tem características bem particulares. A principal delas é a hegemonia da Toshiba em relação a outras marcas. A empresa japonesa é líder do mercado brasileiro mesmo sem uma política local de preços agressivos. Predomina graças ao contrabando. Mais de 70% dos notebooks vendidos no País são importados ilegalmente. A empresa não gosta disso, o governo detesta esse fenômeno e os consumidores, que não têm assistência adequada, também preferiam que fosse diferente. Com as bases do mercado em mutação, espera-se que a mesma conjunção de fatores que produziu a queda de venda dos portáteis também ajude a empurrar o mercado para a legalidade. Os consumidores brasileiros merecem um bom laptop, por um bom preço, com uma nota fiscal de verdade.