Na excelente biografia A Segunda vinda de Steve Jobs, o jornalista Alan Deutschman narra com envolvente riqueza de detalhes a volta triunfante do fundador da Apple, em julho de 1997, depois de ser defenestrado da empresa que criara. Novamente em suas mãos, a Apple voltou à tona não apenas por seus computadores revolucionários, mas também com a Pixar, produtora de desenhos animados que tem em seu catálogo sucessos como Toy Story. Lançado há menos de cinco anos, o livro já tem de ser reescrito. Jobs fez sua terceira vinda com um aparelhinho que, em sua menor versão, tem 2,5 centímetros de largura por 10 centímetros de altura e tornou-se neste ano o objeto de desejo do planeta. Do metrô de Tóquio à orla do Rio de Janeiro, os consumidores se espalham e crescem em número. Foram vendidos mais de 30 milhões de iPods no mundo, em quatro anos. É um sucesso tão estrondoso que levou o faturamento anual da Apple de US$ 5,3 bilhões, em 2001, para nada menos que US$ 13 bilhões, em 2005.

Mas, afinal de contas, o que é que o iPod tem? Ele não foi o primeiro tocador de MP3 a ser lançado, nem o primeiro a chegar ao consumidor com tecnologias de baixo preço. Na verdade, em seu primeiro ano, 2001, foram vendidas apenas 125 mil unidades do produto, o que fez com que os analistas classificassem-no como retumbante fracasso. A explicação para a virada é que, uma vez tornado compatível com PCs, os iPod conquistaram 75% do mercado. Por que? Eles simplesmente têm a aura, o design e o glamour descolado que envolve todos os produtos Apple e dão a cara do moderno mercado de consumo. Tecnicamente, ele faz a transferência dos arquivos de maneira muito rápida e sua navegação é facílima, como os outros itens da marca. Com a vantagem que, a partir de US$ 99, é possível ter um legítimo Apple, usado por celebridades de bom gosto como os integrantes da banda U2, o escritor Nick Hornby e o compositor Andrew Lloyd-Webber ? assim como outras celebridades de popularidade duvidosa, como o presidente americano George W. Bush. Seu ?iPod One?, que como o de todas as celebridades teve suas músicas divulgadas pela Apple, foi analisado por psicoterapeutas e a conclusão é que ele tem uma personalidade confusa e precisa de terapia extensiva.

A revolução trazida pelos iPods foi tamanha que Bill Gates, da concorrente Microsoft, previu que representariam o fim da era dos CDs. Aliás, essa mesma concorrência tenta, somada a fornecedores, clientes e amigos, lucrar como pode com a mudança de comportamento trazida pelo produto da Apple. A própria Microsoft anunciou, no final de dezembro, uma parceria com a MTV em que, através do serviço Urge, venderão um acervo com dois milhões de músicas por meio da nova versão do Windows Media Player. Com relação aos parceiros, a Samsung, por exemplo, tornou-se a segunda maior fabricante de semicondutores do mundo, atrás apenas da Intel, por ser a fornecedora das memórias dos iPods. Já o iTunes, o endereço virtual da Apple em que é possível comprar qualquer música por R$ 1,99, é hoje a sétima maior loja de música dos Estados Unidos e a única virtual entre as dez primeiras. Atrás apenas de gigantes como Wal-Mart, Best Buy e Amazon.com. Não é exagero dizer que todos os dias há dezenas de lançamentos ligados de alguma maneira ao iPod. A fabricante de brinquedos eletrônicos Hasbro, por exemplo, lançou no final de dezembro o iDog, um cachorrinho que cabe na palma da mão e funciona como falante quando conectado a um MP3 player, mexendo as orelhas e piscando os olhos conforme o ritmo da música. A Motorola e a fabricante de roupas de inverno Burton Snowboards lançaram uma jaqueta bluetooth que se comunica com iPods, tem um painel de controle na manga esquerda e auto-falantes na gola, para que os esquiadores ouçam suas músicas favoritas enquanto descem pelas pistas. Com mais de 100 vending machines operando nos Estados Unidos e outras 600 para entrar em operação este ano, a Zoom Systems colocou iPods para serem vendidos ao lado de sacos de batatinhas e chocolates. E a Script Software criou um produto que permite ao usuário de iPods ler a letra da canção que está ouvindo. Quando se fala de uma revolução desse tamanho ? e envolvendo tamanhas quantias ? a criatividade humana parece ser infinita.

US$ 13 bilhões foi o faturamento da empresa em 2005, valor duas vezes e meia superior ao de 2001