Nova flotilha que conta com 50 barcos tenta levar ajuda humanitária ao enclave palestino. Desde 2010, Israel tem conseguido bloquear tentativas similares. Mas ativistas ainda apostam no impacto simbólico da iniciativa.A Flotilha Global Sumud, a maior e mais ambiciosa missão marítima a tentar chegar à Faixa de Gaza até o momento, partiu de diferentes portos no final de agosto.

A iniciativa reúne quase 1.000 participantes, incluindo a ativista sueca Greta Thunberg, a ex-prefeita de Barcelona Ada Colau e o ator irlandês Liam Cunningham. A flotilha, definida como uma frota de navios sob um único comando, foi recebida durante uma escala na Tunísia no último domingo (07/09).

A frota de 50 barcos, que transporta suprimentos humanitários, deve chegar à Faixa de Gaza nos próximos dias. Contudo, é improvável que eles tenham permissão para alcançar a costa e atracar no território palestino.

Todas as tentativas anteriores, desde 2010, foram frustradas pelas forças israelenses. Israel sustenta que o bloqueio naval à Gaza, imposto em 2007, após o Hamas assumir o poder do enclave, é necessário para impedir que o grupo – classificado como organização terrorista pelos Estados Unidos,União Europeia (UE) e muitos outros países – consiga importar armas.

Mas, na visão de muitas organizações de direitos humanos e ONGs, o bloqueio constitui uma punição coletiva, ilegal segundo o direito internacional.

A situação humanitária em Gaza, que já era grave, se deteriorou ainda mais nos quase dois anos da guerra desencadeada pelos ataques terroristas liderados pelo Hamas em 7 de outubro de 2023 contra Israel, que mataram em torno de 1.200 pessoas, além de outras 251 que foram levadas como reféns.

Autoridades da ONU e diversas outras afirmam que, como parte de sua atual ofensiva militar, Israel estaria cometendo crimes de guerra, incluindo limpeza étnica e fome deliberada. Há também denúncias sobre genocídio e fome. Mais de 63.000 palestinos, incluindo ao menos 20.000 crianças, teriam sido mortos, segundo os dados do Ministério da Saúde de Gaza, ligado ao governo do Hamas.

“Os ativistas estão tentando enviar a importante mensagem de que há uma emergência humanitária urgente e que a situação exige oposição à decisão política de Israel de permitir que esse cerco e essa fome aconteçam”, afirmou à DW Amjad Iraqi, observador das relações israelense-palestinas da organização sem fins lucrativos International Crisis Group.

“Isso independe de esta flotilha conseguir ou não chegar a Gaza”, acrescentou.

Para que servem as flotilhas?

Estima-se que a Flotilha Global Sumud esteja transportando cerca de 300 toneladas de suprimentos essenciais, como alimentos, água potável e medicamentos.

“Os produtos nessas flotilhas não atendem às necessidades [totais] dos palestinos em Gaza, mas chamam a atenção internacional para o que está acontecendo em Gaza”, explicou à DW Nathan Brown, professor de ciência política e relações internacionais da Universidade George Washington.

“Outro efeito, embora talvez um pouco menos significativo, é que isso transmite uma mensagem à população palestina de que ela não está sendo ignorada”, observou.

Brown lembrou que havia uma enorme frustração entre os palestinos, que temiam que a ordem internacional baseada em regras do pós-Segunda Guerra Mundial fossem válidas para os outros, mas não para eles.

Ao mesmo tempo, aumentam as críticas europeias à guerra de Israel em Gaza. Autoridades na Espanha, França, Eslovênia e outros países chamaram o bloqueio humanitário israelense de “insuportável”.

“O que Israel é percebido como fazendo não é simplesmente guerrear em Gaza, mas, na verdade, induzir deliberadamente a fome, o que seria um claro crime de guerra”, disse Brown à DW. “O abismo cada vez maior entre apoiadores e críticos [de Israel] é algo para o qual a flotilha atual busca chamar mais atenção”, concluiu.

Israel, porém, rejeita as críticas. “O governo israelense diz que está permitindo a entrada de comida suficiente, que o que é transportado estaria sendo roubado pelo Hamas, que as flotilhas são apenas um golpe publicitário de pessoas que odeiam Israel e que este é o único conflito atual em que se espera que uma parte alimente a outra”, disse Brown.

O cientista político acrescentou que esse ponto de vista também foi repetido por diplomatas americanos. O presidente dos EUA, Donald Trump, permanece sendo um firme apoiador da política do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em Gaza.

O que aconteceu com as outras flotilhas?

Em 2008, um ano após o Hamas assumir o controle da Faixa de Gaza, quando Israel ainda não havia implementado totalmente seu bloqueio naval, várias flotilhas chegaram ao enclave. Mas, em meados de 2009, os israelenses começaram a interceptar todos os barcos e fecharam o acesso a Gaza por mar. Desde 2010, nenhuma outra flotilha chegou a Gaza.

Em 31 de maio de 2010, forças israelenses interceptaram seis barcos civis da Flotilha da Liberdade de Gaza no que ficou conhecido como o ataque Mavi Marmara. Os militares abriram fogo contra o navio de passageiros de propriedade turca, matando 10 ativistas turcos pró-palestinos. A Marinha israelense alegou posteriormente ter agido em legítima defesa, mas sua ação foi amplamente criticada em todo o mundo. As relações diplomáticas entre Israel e Turquia se deterioraram até Israel emitir um pedido formal de desculpas em 2013 e concordar em pagar 20 milhões de dólares (R$ 108 milhões) em indenização às famílias das vítimas em 2016.

A iniciativa de 2011, chamada Flotilha da Liberdade II, jamais conseguir partiu da Grécia devido a uma combinação de pressão política, sabotagem técnica e obstáculos legais. Como consequência da pressão israelense, a Grécia proibiu a partida de navios da flotilha para Gaza, alegando preocupações de segurança e diplomáticas.

Em 29 de junho de 2015, a Flotilha da Liberdade III, de bandeira sueca, que transportava ativistas, parlamentares, jornalistas e figuras públicas de mais de 20 países, foi interceptada a cerca de 160 quilômetros de Gaza. As forças israelenses abordaram alguns dos navios, enquanto outros retornaram. A Marinha israelense teria utilizado armas de choque durante a operação.

Em outubro de 2016, o Barco das Mulheres para Gaza, uma flotilha que transportava mulheres ativistas, também foi interceptado antes de chegar a Gaza.

Em 2018, forças navais israelenses interceptaram e apreenderam dois navios pertencentes à Flotilha Futuro Justo para a Palestina, primeiro o Al Awda, em 29 de julho, e depois o Freedom, em 3 de agosto. Segundo relatos de pessoas a bordo, as forças israelenses agrediram alguns dos ativistas, que foram posteriormente deportados de Israel.

Duas flotilhas que partiram no início deste ano e a Global Sumud, que neste momento navega rumo a Gaza, são descritas como missões da Flotilha da Liberdade.

Greta Thunberg já estava entre os participantes da Missão Madleen, que partiu em junho de 2025. Eles ficaram detidos depois que as forças israelenses interceptaram o barco e, mais tarde, foram deportados.

Em julho, ativistas da missão Handala foram presos depois que seu navio foi interceptado e apreendido em águas internacionais ao largo da costa de Gaza.