Há um ano, no dia 4 de maio, sob o olhar cético do mercado financeiro, passou a valer a maior mudança na vida dos poupadores brasileiros. A até então intocável caderneta de poupança foi reestruturada. A partir daquela data, seu rendimento passou a ser atrelado à taxa básica de juro, a Selic, em vez de garantir uma rentabilidade mínima de 6,2% ao ano mais a oscilação da Taxa Referencial (TR). Ao contrário do esperado por dez entre dez especialistas, as novas regras não provocaram uma fuga em massa dos investidores em direção a outras aplicações. Muito ao contrário. Logo no primeiro mês após a mudança, a captação líquida da caderneta ficou positiva em R$ 6,2 bilhões, o maior montante para um mês de maio, desde 1995. 

 

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No fim de 2012, os depósitos ultrapassaram os saques em R$ 49,7 bilhões e, em 2013, de janeiro a março, já somam R$ 10,5 bilhões. Segundo Fabio Nogueira, diretor da Brazilian Mortgages, uma empresa do grupo PanAmericano, a forma clara e transparente com que foi conduzida a mudança tornou a transição tranquila. “A principal característica da poupança, que é a simplicidade, foi mantida”, afirma. “Com a Selic atingindo mínimas históricas, o investidor continuou vendo na caderneta uma forma de manter o patrimônio, sem a complicação de analisar taxas e impostos.” O argumento da simplicidade é poderoso. 

 

“As pessoas tendem a gostar de tudo fácil e sem complicações”, afirma Vera Rita de Mello Ferreira, professora de psicologia econômica da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi). “Nesse sentido, apesar do retorno menor, a caderneta de poupança ainda atende a todos os requisitos.” Além disso, segundo a psicóloga, a poupança é um investimento tradicional, que faz parte da história do brasileiro há quase cinco décadas e já se fixou na memória do investidor. “A não ser que o rendimento das demais aplicações seja 15% ou 20% maior, as pessoas não vão deixar a caderneta de lado”, afirma Vera. “Elas preferem ganhar pouco, sabendo onde estão pisando, a arriscar perder dinheiro com o desconhecido.” 

 

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Para Miguel José Ribeiro de Oliveira, diretor da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), os fundos de renda fixa, que poderiam ser um refúgio dos poupadores, perderam rentabilidade com a queda dos juros e, além disso, cobram taxa de administração e Imposto de Renda, o que compromete o retorno. De acordo com um estudo da Anefac, considerando o rendimento líquido, fundos de renda fixa com taxa de administração acima de 1,5% perdem da rentabilidade da poupança, seja da antiga, seja da nova. “Investir em fundos só vale a pena, no caso das novas regras, quando a taxa de administração for inferior a 1%, dependendo do prazo da aplicação”, afirma Oliveira. “Para quem tem poupança antiga, o retorno é superior ao dos fundos para qualquer taxa de administração.”

 

O mercado de renda variável, considerado por muita gente um destino natural para o dinheiro dos poupadores em busca de um rendimento maior, não chegou a entusiasmar. Com grande volatilidade por conta da crise internacional, o Índice Bovespa, por exemplo, principal indicador da Bolsa de Valores de São Paulo, acumula, desde as alterações na caderneta até março deste ano, uma queda de 12,65%. “O investidor ficou sem opção”, diz Oliveira. Para ele, 2012 foi o ano da preservação de capital. Mudanças no cenário econômico brasileiro e as incertezas globais deixaram o investidor na defensiva. “Os investidores ficam mais preocupados em preservar seu dinheiro do que se arriscar para ganhar mais”, afirma. Ponto para a poupança, portanto.

 

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