As campanhas publicitárias dos aplicativos financeiros em geral mostram clientes jovens à vontade com a tecnologia de seus smartphones. Essa imagem nem sempre corresponde à realidade do mercado brasileiro, que é caracterizado por clientes de baixa renda e cada vez menos jovens.

O ex-CEO e atual presidente do Conselho de Administração do Agi, Marciano Testa, sabe bem disso. “Nosso nicho de mercado prioritário está entre os clientes com mais de 50 anos e com renda ao redor de R$ 4 mil por mês”, disse Testa. Por isso, a atuação do Agi, fundado há cerca de 20 anos em Porto Alegre, vai na contramão das fintechs. Nos 12 meses findos em setembro de 2021, a instituição financeira fez algo impensável para os banqueiros brasileiros de hoje: abriu 208 agências.

A rede física do Agi cresceu 32,6% e, no fim do terceiro trimestre do ano passado, contava com 846 endereços. As unidades são chamadas de smart hubs pelo Agi. “Eles não têm portas giratórias, não usam papel e não movimentam dinheiro”, disse Testa. Mesmo assim, sua função é a mesma das agências bancárias tradicionais.

Segundo Glauber Correa, que sucedeu Testa como CEO do Agi, a explicação é simples. Os clientes maduros são menos familiarizados com a tecnologia. É comum precisarem de assistência na hora de baixar e configurar aplicativos, além de aprenderem a realizar as transações financeiras no universo digital.

ESTILO DE VIDA Clientes de terceira idade: renda mais alta e menos familiaridade com o universo virtual. (Crédito:Istock)

Aí entram as agências. São espaços enxutos, com um totem de autoatendimento e três funcionários em média. Eles ajudam na jornada digital e, de quebra, aproveitam o contato para vender produtos e serviços. “Em vez de fazer como muitas fintechs e deixar profissionais em centrais telefônicas, nossos colaboradores estão presentes para atender os clientes”, afirmou Correa.

CONSIGNADOS Ele garante que o investimento compensa. Em média, afirmou, o cliente que passa a se entender com a tecnologia na sexta interação com os profissionais do banco. “A partir daí, o ‘cross-selling’ aumenta de maneira exponencial”, disse Correa. E, de quebra, facilita as interações do cliente com familiares e amigos, algo essencial nessa faixa de renda. Não por acaso, a maior parte do crédito concedido pelo Agi são empréstimos consignados. No fim do terceiro trimestre, o banco tinha uma carteira de crédito de R$ 5,47 bilhões, crescimento de 187,9% em relação ao mesmo período de 2020. Desse total, R$ 3,62 bilhões, ou 66%, era de empréstimos consignados. Nesse período o total de clientes aumentou 29%, crescendo de 1,55 milhão para pouco mais de 2 milhões.

Com isso, o faturamento do terceiro trimestre do ano passado subiu 61% ante 2020, chegando a R$ 547 milhões. No entanto, o banco amargou um prejuízo líquido não ajustado de R$ 42,4 milhões no terceiro trimestre, após ter lucrado R$ 32 milhões no mesmo período do ano passado. Nos nove primeiros meses de 2021 a perda foi de R$ 14,8 milhões, ante um lucro de R$ 70,7 milhões entre janeiro e setembro de 2020.

A estratégia de crescimento vem passando por algumas correções de rota. No fim de 2020 o Agi transformou seu departamento de tecnologia em uma empresa, a Hypeflame, e a colocou sob a responsabilidade de Fernando Castro, funcionário de carreira do Sicredi e que estava a cargo da tecnologia do Agi. O spin off nasceu grande, com 100 funcionários, e chegou a 400 no fim do ano passado, quando várias pessoas foram dispensadas e as atividades foram reduzidas. “Sempre fomos um negócio autossustentável, nunca pensamos em queimar caixa durante vários anos para podermos ser lucrativos”, disse Testa.

Apesar de parecer estar na contramão do mercado, com a proximidade física o Agi obtem mais fidelidade dos clientes, em especial os com mais de 50 anos de idade, que ainda fazem questão do contato presencial. E isso pode fazer diferença em um momento em que a retração da liquidez internacional torna mais difícil a vida das fintechs 100% baseadas em transações virtuais.