O dia 23 de outubro tem um significado especial para os amantes do futebol. Há 74 anos, Pelé, o maior jogador de todos os tempos, nascia na cidade mineira de Três Corações. Neste ano, a data marcou a jogada mais importante da carreira de outro personagem do meio esportivo. Desconhecido pela grande massa de torcedores, ele atende pelo nome de Edgar Diniz e está por trás da transmissão de grandes jogos. Sócio-fundador e presidente do canal de TV paga Esporte Interativo, o carioca Diniz recebeu justamente naquela quinta-feira uma ligação da Suíça que mudou o destino de sua empresa.

Do outro lado, na cidade de Lucerna, que fica a pouco mais de 50 quilômetros de Zurique, um diretor da Team Marketing, agência responsável pelos negócios da União Europeia das Federações de Futebol (Uefa), afirmava que o Esporte Interativo havia conquistado o direito de transmissão da Liga dos Campeões da Europa, o principal torneio de futebol do planeta, por três anos, até a temporada 2017/2018. Naquele momento, Diniz não pôde socar o ar, como o Rei do Futebol fazia para comemorar um gol. Era preciso manter a discrição e o segredo até que a proposta fosse homologada pela entidade europeia – o anúncio oficial aconteceu na sexta feira 14.

Segurar a comemoração era um castigo para quem trabalhara com afinco nos bastidores para conseguir os direitos do torneio de futebol mais importante da atualidade. Se dentro de campo estão os craques mais valorizados, como Messi, Neymar, Cristiano Ronaldo, Ibrahimovic, entre outros, fora dele os negócios movimentam valores astronômicos. Apenas em premiação para os 32 clubes participantes da Liga dos Campeões, nesta temporada, a Uefa projeta distribuir € 1,34 bilhão, o equivalente a R$ 3,4 bilhões. Para conquistar os direitos de transmissão, Diniz e o time do Esporte Interativo tiveram de suar a camisa, enfrentando concorrentes de peso.

Ele participou de quatro reuniões com a Team para apresentar a estratégia do canal para o evento. Esse fator não é decisivo, mas rende pontos. O que conta, realmente, é a proposta financeira. Não há indicação de valor mínimo, nem como saber o quanto os concorrentes estão oferecendo. Para surpresa do próprio Diniz, a proposta do Esporte Interativo desbancou o consórcio favorito, formado por SporTV, da Globo, e ESPN, controlada pela Walt Disney Company. Os valores são mantidos em sigilo, mas o mercado estima que o Esporte Interativo teria topado pagar algo em torno de US$ 40 milhões por ano.

Na última rodada de negociações, em 2010, a ESPN, que até então detinha os diretos exclusivos de transmissão na TV a cabo, teria desembolsado US$ 16 milhões. “Colocamos em prática as lições das quatro rodadas anteriores de que participamos”, afirma Diniz. Escolado, ele tratou de reforçar a equipe do Esporte Interativo, que até junho do ano passado era pouco mais do que pequeno intruso no meio das gigantes da mídia eletrônica no País – leia-se SporTV, ESPN e FoxSports, do empresário Rupert Murdoch, que detêm os direitos de transmissão dos principais eventos esportivos mundiais.

Para enfrentar adversários desse porte, a empresa de Diniz contratou o banco de investimento Goldman Sachs para ajudá-lo a encontrar um sócio. O requisito é que o reforço não fosse apenas um investidor, mas um grupo com conhecimento de mercado. Em poucos encontros, a empatia com a americana Turner, dona do canal de notícias CNN, definiu o vencedor. A empresa fundada por Ted Turner, na década de 1970, que hoje faz parte da Time Warner, e faturou US$ 10 bilhões no ano passado, aceitou investir R$ 80 milhões para deter uma participação minoritária no canal brasileiro.

A conquista da Liga dos Campeões pode ter um efeito multiplicador. O Esporte Interativo está na programação de ClaroTV, OiTV, Vivo e outras menores, mas não faz parte do conteúdo de Net/Embratel e Sky. O contingente de assinantes de TV paga cresceu mais de 150% nos últimos cinco anos. As duas operadoras mais relevantes têm oito de cada dez assinantes. “Agora, vai existir uma forte pressão sobre a Net e a Sky para que o Esporte Interativo seja distribuído por elas”, diz o consultor especializado em esportes Amir Somoggi. Na realidade, já ocorreram conversas entre os executivos do Esporte Interativo e das duas operadoras, mas os valores que elas repassam ao canal esportivo sempre foram um entrave.

A Fox Sports, que desembarcou no Brasil em 2012, enfrentou a mesma resistência. No final daquele ano, um acordo com o SporTV facilitou a entrada nas operadoras. “Esse é um jogo que a escala tem papel importante”, diz Leonardo Lenz César, sócio-fundador e vice-presidente do Esporte Interativo. “O não acordo é um cenário terrível para os dois lados.” O Esporte Interativo tem se destacado pelas apostas ousadas. No fim de 2013, o canal transmitiu com exclusividade o mundial de handebol feminino. Foram nove jogos até a conquista, invicta e inédita, pela equipe brasileira.

O canal soube aproveitar o interesse crescente pela participação do Brasil no torneio e ganhou uma boa audiência pela internet. Os quase dez milhões de fãs no Facebook fizeram a diferença. Mas o maior risco foi recriar a Copa do Nordeste, um torneio regional de futebol que estava adormecido há uma década. Inspirada na Liga dos Campeões, a competição foi abraçada pelos torcedores dos nove Estados, que desde a primeira edição, em 2012, recebeu o apelido de “Lampions League”. O sucesso atraiu o interesse do Flamengo, que consultou a possibilidade de ser admitido no torneio. Mas os torcedores iniciaram uma campanha chamada “Aqui não, Mengão”.

“A Copa do Nordeste é o torneio mais bem aceito por clubes, torcedores e CBF, o que é algo raro de acontecer”, diz Somoggi. Com um desembolso de R$ 100 milhões no projeto Nordeste, o Esporte Interativo criou o primeiro canal de esportes regional do Brasil, exclusivamente com programação local. “As rivalidades regionais fazem diferença e hoje o torcedor pode acompanhar jogos importantes num canal criado para o futebol do Nordeste”, diz Alexi Portela, presidente da Liga do Nordeste. Internamente, a criação de um segundo canal nacional, como o de seus principais concorrentes, é tratado como algo natural para a transmissão de todos os jogos da Liga dos Campeões. Se isso ocorrer, terá sido um gol de placa de Diniz e suas feras.