As paredes pintadas em tom exuberante de vermelho camuflam discretas câmeras de vídeo. Com um software de edição, as imagens vão se alternando na tela do computador do internauta que assiste ao ritual. Abre no plano geral, corta para o palco, fecha no caixão… Caixão?? Isso mesmo. Caixão. A filmagem retrata a cerimônia que precede uma cremação. Não chega ao clímax (o forno), pois seria constrangedor, de péssimo gosto. Atinge o ápice no momento em que a urna sobe e se esconde em um nicho no teto, com uma paisagem celestial de cenário. Sim, em vez de descer, o caixão sobe. ?É o caminho para o céu?, adverte o circunspecto mestre de cerimônias Carlos Eduardo. Inaugurado em março, o crematório é o negócio que faltava a essa verdadeira holding da morte, o Grupo Primaveras, que já tinha cemitérios, funerária e seguro. Mas há outras particularidades no novo empreendimento, como opção de fotos ou buffet, além da escolha de uma entre cinco mil músicas disponíveis em um iPod. Essa parafernália parece exagerada para contemplar alguém que morreu? O dono do único crematório privado da Grande São Paulo, em Guarulhos, discorda. ?Não empurramos nada ao cliente. Tudo é feito com respeito ao momento de fragilidade?, garante o fundador Jayme Adissi.

A empresa nasceu em 1973 com um cemitério. Aprendendo a lida no dia-a-dia, Adissi inaugurou outro, depois entrou no segmento de funerária. Desembaraça óbito, faz tanatopraxia (conhecido vulgarmente como maquiagem de defunto), cuida de flores, velas e traslado. O grupo ainda oferece o Plano Vida (seguro-morte), criado para restringir a inadimplência. ?Eu vivo dos mortos, mas recebo, quando recebo, dos vivos?, explica Adissi. Paga-se até R$ 60 por mês para cobrir cônjuge, filhos, pais e sogros. ?Em caso de fatalidade, o plano arca com as despesas?, descreve Dora, mulher de Jayme. ?Temos 40 mil clientes?, acrescenta Gisela, a filha mais velha do casal. ?O plano mais barato sai por R$ 20?, diz Letícia, a do meio. ?Não é por pessoa, o valor é familiar?, dispara o caçula Gustavo. Essa comunhão, que já foi motivo de preocupação, hoje é imprescindível para a empresa. ?E pensar como eu me preocupava com essa criançada brincando pra cá e pra lá em dia de Finados… Devo a eles a estrutura organizacional que tem feito a empresa crescer?, diz Jayme Adissi. Ele se refere ao faturamento de R$ 7 milhões em 2004 e à perspectiva de ampliar a R$ 9 milhões neste ano, através da nova fonte de negócios, as cremações. O custo é o mesmo de um enterro tradicional (cerca de R$ 2 mil). ?Mas você poupa a despesa do jazigo, que pode chegar a R$ 20 mil?, lembra o empreendedor da morte.

R$ 7 milhões foi o faturamento do Primaveras em 2004. R$ 3,5 milhões vieram dos funerais. O saldo, dos cemitérios e do seguro-morte.