Dois dias antes de ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal por corrupção ativa, o ex-presidente do PT, José Genoino, foi às urnas exercer seu direito sagrado de votar para prefeito e vereador em São Paulo. Ao deparar-se com alguns repórteres que exerciam o direito democrático de informar a sociedade e lhe fizeram perguntas sobre o escândalo do mensalão e seu impacto nas eleições, perdeu a paciência e disparou: “Vocês são urubus que torturam a alma humana.” Como alguns eleitores o hostilizaram e os jornalistas insistiram em fazer perguntas incômodas, Genoino preferiu atacar a imprensa a conversar: “Vocês são iguais aos torturadores da ditadura. A diferença é que, em vez de usar pau de arara, vocês usam a caneta.” 

 

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Perdeu uma grande chance de ficar calado. Genoino, célebre militante da esquerda brasileira contra a ditadura militar dos anos 1960 aos 1980, passou dos limites do bom-senso. É fácil atacar a imprensa quando se tem liberdade para ir e vir, liberdade para votar e ser votado, liberdade para expressar a opinião por mais que ela seja contrária aos interesses do poder. É fácil atacar jovens repórteres e compará-los a torturadores quando se pode entrar no carro e voltar tranquilamente para casa, sem medo de ser preso, surrado, eletrocutado, afogado e violentado numa cela escura por agentes de um regime sanguinário. 

 

É fácil atacar quem atua como olhos, ouvidos e bocas da população quando se pode fazer isso à luz do dia em uma universidade do bairro do Butantã, em vez de ir de olhos vendados a uma reunião clandestina num sítio qualquer da Grande São Paulo para poder soltar a voz. Difícil é ser jornalista, intelectual ou operário e questionar os poderosos em países de regimes fechados ou em democracias frágeis. Seja na Síria, no Irã, na Venezuela ou na Argentina, a liberdade de imprensa é um bem valioso demais para qualquer sociedade. E sem a imprensa, por mais defeitos que tenha (e os tem), não existe liberdade de expressão. Pode-se e deve-se criticar os erros da imprensa. Generalizar a crítica, porém, é um caminho perigoso.

 

Genoino, um ex-guerrilheiro que conheceu o lado mais sombrio da política brasileira na mesma época em que o jornalista Vladimir Herzog foi assassinado pelos torturadores do regime militar, sabe o valor da imprensa para a construção de um País mais justo. Toda a sua carreira política foi construída com base na defesa da ética e num relacionamento frequente com jornalistas de todos os meios e presença constante em programas de televisão. Depois do escândalo do mensalão, em que a cúpula do PT foi acusada – e agora condenada pelo STF – de compra de votos de parlamentares, Genoino retraiu-se completamente diante dos microfones. Agora, em vez de rebater e debater publicamente o que considera um julgamento injusto contra um homem inocente, prefere atacar a imprensa e ofender os trabalhadores da notícia chamando-os de torturadores. 

 

José Dirceu, outro cacique petista com um passado de luta contra a ditadura e recém-condenado pelo mensalão, acusa a mídia de ser peça fundamental naquilo que chamou de “juízo político e de exceção”. “A Suprema Corte do meu País, sob forte pressão da imprensa, me condena como corruptor, contrário ao que dizem os autos, que clamam por justiça e registram, para sempre, a ausência de provas e a minha inocência”, escreveu Dirceu. Na democracia, as instituições devem ser respeitadas. É dever da imprensa fiscalizar e questionar os políticos eleitos pelo povo. Cabe à Justiça determinar culpados e inocentes nos escândalos de corrupção. O resto é demagogia.