Praticamente todos os dias, o executivo Humberto Visconte, diretor da SMC Brasil, empresa que produz grandes máquinas industriais, ?viaja? de São Paulo a São Bernardo do Campo, a principal cidade do ABC paulista. É lá, num terreno de 30 mil metros quadrados, que ele vistoria a construção da futura fábrica do grupo. Na fase inicial, de obras civis, já estão sendo investidos US$ 20 milhões. Depois disso, serão. US$ 40 milhões e, com o início da operação, previsto para 2007, deverão ser criados 100 empregos. Como todo empresário, Visconte visitou várias regiões do País antes de decidir onde faria o investimento. E foi também assediado por alguns governos estaduais, com generosas promessas de vantagens tributárias. A guerra fiscal, porém, não foi suficiente para mudar sua decisão. ?Escolhemos o ABC por três razões: a qualidade da mão-de-obra, a facilidade logística e a boa infra-estrutura?, disse ele. ?Isso conta mais do que o incentivo tributário.? Assim como ele, diversos empresários estão voltando a ver com bons olhos uma região que perdeu espaço nos anos 90 e foi até estigmatizada com uma marca inglória: a do ?custo ABC?. O que essa expressão traduzia? Numa época em que a indústria enxugava custos e buscava mais produtividade, o ?custo ABC? era sinônimo de mão-de-obra cara, sindicatos fortes e infra-estrutura estrangulada. Agora, tudo isso começa a mudar.

 

Nos primeiros seis meses deste ano, exatos 1.637 empreendimentos foram instalados na região, com a abertura com as estatísticas mais recentes, pois, dias atrás, o IBGE apontou que a participação de São Paulo no PIB nacional caiu de 36,1% para 30,9%, desde 1985. E isso se deve, em grande parte, ao êxodo de grandes indústrias automobilísticas do ABC para regiões com salários menores, como Minas Gerais, Bahia e Rio Grande do Sul. A questão, porém, é que as estatísticas servem apenas para jogar luzes sobre o passado. Não iluminam o futuro. E a tendência atual é de reindustrialização do ABC. Isso vale para empresas de todos os portes. Gigantes, como Ford e Volks, têm novos projetos na região. É também o caso da Toledo Brasil, que produz balanças industriais. Elias Dzigan, gerente industrial, está transferindo a produção de São Paulo para São Bernardo do Campo. ?Fomos atraídos pela facilidade de acesso, sobretudo com a perspectiva de construção do novo trecho do Rodoanel e também de novas reformas viárias na própria cidade, afirmou o empresário. Em São Bernardo, já está em andamento um projeto de 800 intervenções urbanas, orçado em US$ 254 milhões, com apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (veja quadro abaixo). ?Aqui, nós teremos mais produtividade e um rápido escoamento da produção, além do nosso quadro de funcionários altamente qualificado?, diz Dzigan.

Além da base produtiva já montada e da mão-de-obra já treinada, o Grande ABC, com sete municípios e 2,5 milhões de habitantes, atrai empresas pela força econômica da sua própria região. O PIB aproximado de R$ 50 bilhões equivale ao de países como Uruguai e Paraguai juntos. Além disso, com alto Índice de Desenvolvimento Humano, o ABC é o terceiro maior mercado consumidor do País. E mesmo os sindicatos não assustam tanto quanto no passado. ?Depois de tanta fuga de empresas, eles amadureceram?, disse um grande empresário da região à DINHEIRO. Graças a esse novo ambiente favorável, os investimentos industriais na região cresceram 132% desde 2001 e chegaram a US$ 1,1 bilhão.

 

Até mesmo o setor automobilístico, cujas empresas pagam salários no ABC 42% superiores aos de outros Estados, tem projetos engatilhados na região. Na Ford, serão injetados R$ 300 milhões no novo carro de entrada da montadora. O veículo, prometido para início de 2008, nascerá com a missão de elevar a participação da empresa aos 15% dos tempos áureos ? hoje, são 11%. Na Volkswagen, parte dos R$ 2,5 bilhões a serem investidos no País será usada na produção de dois modelos na unidade Anchieta ? uma fábrica que alguns diziam que seria fechada quando a Volks transferiu parte da produção para o Paraná. E em São Caetano do Sul, a General Motors também prepara novidades. Ray Young, à frente da GM desde 2004, batalha por uma verba adicional de R$ 1 bilhão para a fabricação de dois modelos no Brasil, enquanto uma picape já está garantida no ABC. Ela será o primeiro produto desenvolvido em São Caetano depois que a engenharia brasileira passou a ser centro de desenvolvimento mundial de picapes médias para o grupo.

Para William Dib, prefeito de São Bernardo e presidente do Conselho Intermunicipal, composto por todos os prefeitos do Grande ABC, a engenharia ganhará cada vez mais espaço na região. ?Nossa vocação é sermos um centro de alta tecnologia, com mão-de-obra qualificada abundante e infra-estrutura consolidada?, afirma. Com o cenário otimista, até o Pólo Petroquímico está soltando rojões. Petrobras, Petroquímica União e Polietlenos União devem investir juntos mais de meio bilhão de reais em expansão de produção. O resultado esperado é faturamento adicional de R$ 2 bilhões, mais de 11 mil novos empregos na indústria de transformação e R$ 60 milhões de ICMS/ano.

OBRAS COM APOIO DO BID

Um dos fatores que afugentaram várias empresas do ABC no passado foi o gargalo logístico. Isso deverá mudar com a construção do trecho oeste do Rodoanel e com o ?São Bernardo Moderna?. Projeto de melhoria viária com mais de 800 intervenções urbanas, ele é orçado em US$ 254 milhões e parte dos recursos virá do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Na primeira fase, o BID emprestará US$ 72 milhões dos US$ 120 milhões previstos para a realização de 24 melhorias. A segunda fase absorverá os US$ 134 milhões restantes e deve estar pronta até 2009. ?Essas obras viárias fazem parte de uma política para atrair empresas?, diz o prefeito William Dib. Ele prevê que o tempo de trajeto das fábricas ao porto de Santos ou a São Paulo será encurtado em mais de 20%. E diz que, hoje, pelo menos quatro empresas consultam diariamente a prefeitura com a intenção de iniciar negócios na cidade.