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TRANSIÇÃO HISTÓRICA: Trabuco será o quarto comandante na história sexagenária do Bradesco

ACOSTUME-SE COM ESTE NOME: LUIZ CARLOS TRABUCO CAPPI. De hoje até março de 2016, ele será um personagem central da vida econômica brasileira. Neste período, que cobre duas eleições presidenciais, Trabuco estará à frente dos maiores projetos financeiros do País, de grandes operações de crédito e suas opiniões serão seguidas de perto pelos principais líderes empresariais. Aos 57 anos, ele acaba de ser escolhido por Lázaro Brandão, presidente do conselho do Bradesco, como o quarto presidente de toda a história do banco. Por força do estatuto, ele poderá permanecer nessa função até completar 65 anos. E a julgar pelos últimos resultados da Bradesco Seguros, que Trabuco presidiu de 2003 a 2008, com lucros sempre crescentes, o roteiro já parece traçado. “É uma escolha sólida, em linha com a cultura e a tradição do Bradesco”, avalia Jason Mollin, analista de bancos da Goldman Sachs. “Ele dará continuidade à saga do Bradesco e contribuirá para a modernização do sistema financeiro nacional”, reforçou Fábio Barbosa, presidente da Febraban.

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COLOSSO FINANCEIRO: o Bradesco liderou por 47 anos o ranking dos bancos privados e está determinado a recuperar o primeiro lugar

 

 

A sucessão na Cidade de Deus, em Osasco, onde fica a sede do Bradesco, veio sendo amadurecida ao longo dos últimos meses, mas a decisão foi finalmente tomada por Lázaro Brandão no fim do ano passado. E foi já nos primeiros dias de janeiro que “Seu Brandão”, como ele é chamado no Bradesco, decidiu convidar alguns dos principais acionistas do banco para uma conversa informal. Entre um gole e outro de café, ele revelou o que já era esperado por muitos de seus interlocutores. A escolha de Trabuco, que foi comunicada na segunda- feira 12 à BM&FBovespa, à Comissão de Valores Mobiliários e à Securities Exchange Commission, nos Estados Unidos, também encerra os rumores que circularam nos últimos meses. Especulava-se que o estatuto do Bradesco poderia ser alterado para permitir que Márcio Cypriano, aos 65 anos, continuasse no comando do banco. Embora considere Cypriano um executivo “brilhante”, que multiplicou o valor de mercado do Bradesco de US$ 5 bilhões para US$ 30 bilhões nos últimos dez anos, Lázaro Brandão avaliou que uma mudança estatutária representaria “quebra de contrato”. Assim, Cypriano, que referendou a escolha do presidente do conselho, assumirá uma cadeira ao lado dele.

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PASSO INTERNACIONAL: Trabuco liderou os executivos que estiveram em Wall Street na passagem das ações do Bradesco para Nível 2

 

 

Na era Trabuco, que se iniciará em março deste ano, logo após a aprovação do seu nome pelo conselho, a expressão de ordem no Bradesco será “crescimento orgânico”. É com este mantra que ele pretende motivar seus 79 mil funcionários a reconquistar a liderança recentemente perdida para o Itaú-Unibanco. Com pouco mais de R$ 422 bilhões em ativos, o Bradesco está cerca de R$ 150 bilhões atrás de seu principal concorrente e há um consenso no mercado sobre a escassez de boas oportunidades de aquisição. Uma alternativa, ainda que remota, seria a compra das operações do Citibank no Brasil, que decidiu vender vários ativos no mundo (leia mais à página 87). “O Citi não era uma compra provável, mas pela conjuntura do mercado internacional hoje é possível dizer que sim”, diz Ricardo Martins, gerente de análise da Planner Corretora. Isso, porém, não seria o bastante para retomar a ponta. É por isso que a expansão orgânica será colocada como prioridade por Trabuco. Em 2009, além de reduzir tarifas para atrair novos clientes, ele pretende abrir 211 novas agências.

 

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PARCERIA BRILHANTE: Cypriano (à esq.) e Brandão fizeram uma dupla vencedora nos últimos dez anos

Com isso, ainda que seja menor em ativos, o Bradesco terá uma capilaridade maior do que o Itaú-Unibanco. A rede de agências e postos de atendimento também será superior à do Banco do Brasil, que recentemente adquiriu a Nossa Caixa e parte do Votorantim. Com ela, Trabuco poderá exercitar um de seus grandes talentos: o de vendedor. “Ele complementou sua carreira de banqueiro com uma vocação comercial descoberta na seguradora”, diz Luiz de Campos Salles, ex-presidente da concorrente Itaú Seguros. Na gestão Trabuco, a participação de mercado da Bradesco Seguros também cresceu e passou de 23% a 25% do total de prêmios. “Ele integrou a rede bancária às atividades de seguro e desenvolveu produtos massificados nos quais a maioria dos clientes do banco foi fidelizada pela qualidade dos serviços e do atendimento”, afirma o economista Luiz Roberto Castiglione. Além disso, a participação da seguradora no resultado total do banco aumentou de 26% para 35%, o que certamente contribuiu para sua escolha como futuro presidente do Bradesco.

No processo sucessório, Lázaro Brandão também teve à disposição outros dois bons nomes. Um deles, o do vice-presidente José Luiz Acar Pedro, que veio do BCN e implantou a área de banco de investimentos do Bradesco, o BBI. O outro, o de Milton Vargas, atual vice-presidente financeiro e de relações com investidores. Trabuco prevaleceu por ser um legítimo representante da cultura do Bradesco. “Além de extremamente trabalhador e competente, ele representa a vitória da máquina”, avalia o banqueiro Luiz Cezar Fernandes, criador do Pactual e ex-Bradesco. Além da coincidência de ter nascido em Marília (SP), a mesma cidade do fundador Amador Aguiar, Trabuco dedicou toda sua vida ao Bradesco. Entrou no banco como escriturário, aos 18 anos, e tem a cara da empresa. Usa ternos discretos, é comedido nas palavras e evita todo e qualquer sinal exterior de riqueza. Estimativas de mercado indicam que sua remuneração, incluindo salários e bônus por participação nos lucros, será de R$ 1 milhão por mês, uma das maiores do País.
 

Com 40 anos de casa, Trabuco fez de tudo um pouco no Bradesco. Desenvolveu a área de previdência privada, cuidou da área de marketing, foi o diretor financeiro responsável pela listagem dos ADRs do Bradesco como Nível 2 na Bolsa de Nova York e, nos últimos anos, cuidou da seguradora. Uma de suas características mais marcantes é a capacidade de motivar e conquistar suas equipes. Trabuco chegou ao Rio de Janeiro, onde fica a Bradesco Seguros, com a missão de trazer a sede para São Paulo. Em pouco tempo, convenceu os superiores, na Cidade de Deus, de que a permanência no Rio seria mais econômica para o banco – e isso ao custo de seu próprio conforto. Com a família em São Paulo, ele manteve sua residência na capital paulista e passou a viver na ponte aérea. No Rio, Trabuco também liderou a campanha para que o Cristo Redentor entrasse na disputa global para ser uma das Sete Novas Maravilhas do Mundo. Ele cativou a tal ponto seu time que passou a ser definido como um “paulista de alma carioca”.

Formado em filosofia pela Universidade de São Paulo, o novo presidente do Bradesco também poderá arejar um pouco a cultura do banco. “Ele é bom tanto em números como na relação com as pessoas”, afirma Lia da Graça, analista da Banif Securities. Outro aspecto destacado pelos analistas é sua experiência com sócios internacionais, desenvolvida na seguradora. “Um caminho possível para o Bradesco, se quiser retomar a liderança, é tentar comprar bancos lá fora”, reforça Luiz Cezar Fernandes. “E o Trabuco talvez seja a pessoa indicada para isso, nesse momento em que os ativos estão desvalorizados.”

 
PARCERIA BRILHANTE: Cypriano (à esq.) e Brandão fizeram uma dupla vencedora nos últimos dez anos
 

Corredor amador, com algumas participações na São Silvestre, Trabuco chega ao topo do Bradesco cercado de grandes expectativas. Ele herda de Cypriano uma instituição mais enxuta e moderna, que venceu o desafio de deixar para trás a imagem de um banco voltado apenas para as massas. Cypriano implantou a segmentação, criou as unidades para clientes de alta renda, como o Prime, e conquistou a liderança em segmentos de vanguarda, como os serviços de home broker na BM&FBovespa, além de uma boa posição nos serviços de private bank. Cypriano conduziu ainda, com sucesso, a integração de 13 aquisições realizadas durante sua gestão, o que ajudou a criar o conceito do Bradesco como “banco completo”. Com toda essa musculatura, Trabuco tentará agora implantar uma política comercial mais agressiva, ampliando a competição no mercado brasileiro. No Itaú Unibanco, tem-se por Trabuco um respeito total. Roberto Setubal, em vários reuniões com seus diretores, definiu o futuro presidente do Bradesco como uma pessoa capaz, determinada e focada em resultados. Trabuco também deu uma pequena amostra da sua visão de mundo no discurso de posse como benemérito da Associação Comercial do Rio de Janeiro. “Um dos segredos que aprendi na organização em que trabalho e sirvo há 40 anos é que só o trabalho produz riqueza. E o trabalho produz riqueza quando significa amor”, disse ele. Pode-se esperar dele uma dedicação incansável nos próximos oito anos.

OS COMANDANTES DA CIDADE DE DEUS
O novo presidente será o quarto nome na história de 65 anos do Bradesco
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Amador Aguiar
O fundador modificou a relação entre bancos e clientes ao abrir as portas para a grande massa. Com oito anos de vida, o Bradesco se transformou no maior banco privado nacional.


 
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Lázaro Brandão
Exerceu a função de presidente por 18 anos. Criou a cultura de gestão do banco e foi o responsável por solidificar o Bradesco na liderança do setor bancário nacional.
 
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Márcio Cypriano
Com estilo agressivo e direto, realizou importantes aquisições e é responsável pela modernização da instituição financeira. Entrega o cargo ao atingir o limite de 65 anos de idade.
 
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Luiz Carlos Trabuco

Profundo conhecedor do mercado financeiro, venceu o desafio na seguradora ao fazer dela a maior da América Latina. Aos 57 anos, chega à presidência do banco.