Cerca de 700 milhões de consoles e 4,2 bilhões de jogos vendidos e franquias de sucesso como Mario, Pokémon, Zelda, Donkey Kong. Não há como negar que a japonesa Nintendo, em seus 32 anos de história, se tornou um ícone do mercado de games.

Seus números expressam o valor da marca que, historicamente, atua de uma maneira peculiar. No início da era dos consoles, ela foi das primeiras a impor uma licença para produção de jogos para suas máquinas. Enquanto todos partiam para o CD, no final dos ano 1990, ela continuou com o cartucho.

Mais recentemente, aderiu aos gráficos que lembram desenhos animados ao invés de buscar os mais reais, como fazem seus concorrentes Sony e Microsoft. A tradição da empresa voltou à tona neste ano. Lutando para tornar sua operação mais enxuta e lucrativa, a Nintendo optou por eliminar algumas operações. Entre elas, a brasileira, enquanto seus competidores colocam foco em nosso mercado. Depois de 22 anos vendendo seus jogos e consoles no Brasil, a japonesa abandonou seus fãs.

A medida não é para menos. Os resultados do ano fiscal 2013, que terminou no primeiro trimestre de 2014, foram catastróficos para a Nintendo. A companhia apresentou um prejuízo de US$ 457 milhões. O maior de uma série de três anos consecutivos de números no vermelho.

O CEO da companhia, Satoru Iwata, teve que explicar ao mercado o motivo de seu console de oitava geração, o Wii U, ter vendido apenas 2,7 milhões de unidades, quando a previsão era de 9 milhões.

Além disso, a japonesa tinha que lidar com críticas de analistas, que questionavam a resistência da empresa em entrar em novas áreas, como a da mobilidade. “Não sei como Iwata ainda é tem um emprego”, afirmou Michael Pachter, um dos mais conhecidos analistas do mercado de jogos e que faz parte da consultoria americana Wedbush Securities. “Ele está afundando a Nintendo.”

Frente a enxurrada de críticas, a Nintendo optou por ser uma empresa mais focada no seu ano fiscal 2014, que vai se encerrar em março de 2015. Nos seis primeiros meses, suas vendas foram de US$ 1,46 bilhão, 12,8% menores do que no ano passado. Mas surpreendeu a apresentar sua primeira parcial positiva de lucro, de cerca de US$ 200 milhões.

A Nintendo, no entanto, ainda não saiu da situação crítica. O próprio CEO da companhia afirmou que, no segundo semestre, a situação deve se reverter e o ano fiscal se encerrar em prejuízo. Mas bem menor do que o apresentado um ano antes.

”A Nintendo tem várias maneiras de conseguir se manter saudável no mercado”, afirma Brian Blau, especialista em games da consultoria de tecnologia Gartner. “Ela precisa definir a melhor estratégia.”

Dentro desta lógica, a operação brasileira deixou de fazer sentido para a Nintendo. Diferente da compatriota Sony e da americana Microsoft, a Nintendo trabalha apenas com games. A japonesa fabricante do Playstation produz uma gama de aparelhos por aqui, como televisores, celulares e sistemas de som. Para produzir o Playstation localmente, ela fez apenas um investimento em uma fábrica que já existia.

A Microsoft produz o Xbox 360 e o Xbox One em uma fabrica que era da Nokia, em Manaus, e que veio para seus domínios após a compra da empresa de smartphones. “Operar no Brasil era um risco muito grande para a Nintendo, pelos custos”, diz Mauricio Alegretti, CEO e fundador da startup brasileira de games SmyOwl, e que também tem passagem pela área de entretenimento da Microsoft. “Apesar de o mercado brasileiro estar aquecido.”

Assim, importando seus produtos do exterior e sofrendo com os impostos brasileiros para bens produzidos fora da nossa fronteira, a Nintendo não conseguia competir por aqui. “Globalmente, a Nintendo tem uma estratégia de ser um ‘segundo console’. A pessoa tem um Playstation ou um Xbox, e mais um Wii, por exemplo”, afirmou Alegretti. “Mas, para isso, seu preço precisa ser menor. Aqui ela tinha preço semelhante aos principais videogames, que são mais potentes.”

Segundo os analistas, no entanto, falta criatividade para a Nintendo. Apenas enxugar sua operação não será suficiente para reverter o quadro negativo em que se encontra. A empresa precisa, de acordo com eles, começar a olhar novas áreas, como a mobilidade, e explorar mais suas marcas e franquias.

”Sair do negócio” não é uma novidade no mercado de games. A Sega, dona do também famoso personagem Sonic e que chegou a disputar com a Nintendo a liderança do mercado nos anos 1990, deixou de concorrer entre os consoles e se limitou a fabricar jogos para os concorrentes, em 2005. Para que o Mario não termine de mãos dadas com seu rival do passado no segundo plano do mercado de games, a Nintendo vai precisar mostrar sua habilidade – mas no jogo do mercado.