No jogo de truco, os melhores competidores são aqueles que sabem a hora de atacar, blefar e até sair do jogo. Ter uma carta à mão é sempre de grande valia para quem quer se dar bem e ajudar a sorte. No mundo dos negócios, as estratégias não são muito diferentes. Que o diga o empresário Benjamin Steinbruch, presidente da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Em abril deste ano, o Cade, órgão antitruste brasileiro, determinou que a CSN deveria vender sua participação de 14% no capital da Usiminas, em virtude da concentração de mercado.

A sentença criou um problemaço para Steinbruch, uma vez que as ações da siderúrgica mineira estão em baixa, cotadas a menos de R$ 7. Pelos cálculos do mercado, o prejuízo passaria de R$ 1,3 bilhão. No último dia 17, porém, o empresário tirou uma carta da manga. Ele entrou com uma representação na Comissão de Valores Imobiliários (CVM) contra a argentina Ternium, que divide com a Nippon Steel o controle da empresa. Seu objetivo é obrigar a parceira a comprar suas ações pelo preço que elas valiam em 2011. Seu argumento é de que, naquele ano, ao adquirir uma participação na Usiminas, a Ternium assumiu o comando de fato e, portanto, deveria ter feito uma oferta pública (OPA) aos minoritários, o que não aconteceu.

O empresário aguarda um parecer nas próximas semanas, embora não exista um prazo legal para o julgamento do pedido. Para entrar na Usiminas, a Ternium, subsidiária da italiana Techint, adquiriu as ações que pertenciam aos grupos Votorantim e Camargo Corrêa, que detinham uma participação de 43,31% no capital. Na época, os papéis foram avaliados em R$ 36, o que representava um ágio de 83% sobre a cotação das ações na bolsa. Com o negócio, os argentinos passaram a dividir o controle acionário da siderúrgica com a Nippon Steel, dona de 46,12% dos papéis.

No entanto, segundo os advogados da CSN, esse compartilhamento do comando não acontecia de fato, pois todas as decisões na empresa eram tomadas pelo CEO indicado pelo grupo argentino. “A Ternium praticou fraude, com a finalidade de poupar os custos de realização de OPA por alienação de controle”, afirma a CSN, na representação entregue à CVM. “Ela se valeu de uma técnica de ocultamento de alienação de controle societário, cujo êxito ameaça inutilizar a tutela das minorias e a fiabilidade do mercado de capitais.” Segundo a Lei das Sociedades Anônimas, quando há troca de comando, os cotistas minoritários podem vender suas ações para a nova controladora pelo mesmo valor pago aos sócios majoritários.

Como prova, a CSN cita um episódio ocorrido em setembro deste ano, quando a Nippon demitiu o CEO da Usiminas, Julián Eguren, e mais dois diretores, praticamente rasgando o acordo de acionistas. O caso abriu uma “caixa de pandora” na companhia mineira, com acusações de roubos, fraudes e irregularidades em contratos. A Nippon acusa o CEO e alguns diretores da Usiminas, todos indicados pela Ternium, de receberem bônus maiores do que os aprovados em reuniões do conselho administrativo. Trata-se de prova cabal, segundo os advogados de Steinbruch, de que eram os argentinos quem, de fato, mandavam.

Na época do ingresso da Ternium, a CVM questionou a empresa sobre uma possível troca de controle. Após explicações, o caso foi encerrado. Steinbruch, no entanto, agora afirma que os argentinos omitiram informações. A mais importante seria a de que o CEO Eguren fora indicado pela Ternium. A tomada do comando pela Ternium, naquela época, foi possível graças a uma pequena alteração no acordo de acionistas, que sujeita qualquer decisão a uma regra de consenso entre os sócios. Na prática, diz a CSN, isso permite a total paralisação das ações do conselho, presidido pela Nippon, dando ao corpo executivo liberdade para administrar a empresa.

“O diretor-presidente (indicado pela Ternium) seria, sob esse estratagema, alçado à condição de tiranete”, afirma a CSN, no processo. Steinbruch também acusa os japoneses de agirem em conluio com os argentinos, por meio de um acordo tácito, para alienar o controle da Usiminas em troca de contratos de compra de minério, cujos valores chegam a R$ 20 bilhões somente neste ano. Procurada, a Ternium não se pronunciou. A Nippon, por intermédio de seu advogado, também se recusou a comentar o caso. Segundo fontes familiarizadas com o assunto, os japoneses, que praticamente romperam as relações com os argentinos, devem entrar também na CVM com uma reclamação idêntica à da CSN. Se isso acontecer, Steinbruch poderá, seguramente, dizer truco.