O senhor é conhecido como um apreciador da noite, das grandes festas, das boas bebidas…

? E das mulheres, assunto que trato com dedicação e motivação…

Com vocês, Olavo Monteiro de Carvalho, o Marquês de Salamanca, o Chevalier da Legião Estrangeira, o Rei do Rio, um dos barões do mundo dos negócios brasileiros. Poucos conseguiram freqüentar, ao mesmo tempo, com tanto carisma e desenvoltura as páginas econômicas e as colunas sociais dos jornais nas últimas décadas. Algumas vezes, como anfitrião das mais badaladas festas do Rio de Janeiro. Outras, no papel de acionista e presidente da Monteiro Aranha, um dos mais tradicionais grupos empresariais do País, responsável, entre outras conquistas, pela chegada ao Brasil de companhias como a Volkswagen e a Peugeot. Hoje, o Monteiro Aranha exibe patrimônio de R$ 400 milhões e detém participações em empresas do porte de Klabin, Cisper e Oxiteno. O sorriso que se segue à declaração de amor às mulheres não deixa dúvidas: aos 60 anos, Monteiro de Carvalho está em plena forma. Nos últimos dois anos, recolheu-se para digerir o rombo de US$ 120 milhões provocado por um dos piores negócios já realizados pelo grupo, a compra do Banco Boavista. Agora, livre da encrenca, prepara uma nova ofensiva, tanto no Monteiro Aranha, como em seus negócios particulares, aqueles em que a fonte de recursos é seu próprio cofre ? aliás, um dos mais bem-abastados do País. Suas próximas investidas são nos setores de energia e saneamento.

Olavo gosta de dizer que é um sujeito diferente de anos atrás. ?Já não tenho uma atividade tão intensa como antigamente?, diz. No final do ano, por exemplo, retirou-se para sua mansão em Arraial da Ajuda, no litoral baiano, e deixou-se estar. Desembarcou lá no dia 26 de dezembro e só voltou ao Rio de Janeiro depois do carnaval. ?Foi o período mais produtivo de minha vida?, afirma ele. ?O celular estava ligado, mas a distância fez com que só me procurassem para assuntos absolutamente fundamentais.? Trata-se menos de relaxamento diante dos assuntos profissionais e mais de uma forma peculiar de encarar o trabalho. O portfólio de negócios particulares de Carvalho confunde-se mais e mais com seus interesses pessoais. Uma de suas paixões, os cavalos manga-larga marchador, tornou-se um item em fonte de lucro. Dono de 100 animais e 30 matrizes, é hoje um dos maiores criadores do Rio. Em duas fazendas, que juntas somam mil alqueires mineiros de terra, também vivem 4 mil cabeças de gado. É nas Fazendas Santarém que Carvalho recolhe-se a partir das tardes de sexta-feira para passar os finais de semana, sempre na companhia de 15 a 20 amigos. Durante a semana, divide seu tempo entre os escritórios paulistanos da Klabin e da Oxiteno, nas quais é o representante do Monteiro Aranha, e o quartel-general de seus próprios investimentos.

Neste último papel, mais uma vez a vida particular mistura-se com a trajetória profissional. Os dez funcionários de sua holding pessoal ocupam um pedaço do palacete cinematográfico onde mora no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro. Localizada em um dos pontos mais altos da cidade, a casa permite uma vista deslumbrante, ?a mais bela do mundo?, na opinião suspeita mas compreensível de seu proprietário. Foi ali, mirando o Cristo Redentor e a Baía de Guanabara, que Olavo e um amigo, o engenheiro Vlamir Paes, forjaram a Aquaplus, uma empresa que deu seus primeiros passos em janeiro deste ano. Com um pequeno aporte de capital (?coisa de R$ 1 milhão?, diz Carvalho), a companhia se dedica a projetos de tratamento de água em indústrias. A ofensiva é oportuna e vislumbra um mercado ainda a desbravar: em junho, passa a vigorar uma lei federal que prevê cobrança de multas para empresas que despejarem água suja nos rios. É neste mercado, estimado em R$ 900 milhões, que a Aquaplus vai atuar. O pessoal comandado por Carvalho e Paes chega ao cliente, identifica suas necessidades, desenha o projeto, compra os equipamentos, constrói as estações de tratamento e passa a gerenciá-las. O cliente não desembolsa nada. Depois de concluída, a estação é gerenciada pela própria Aquaplus, que recebe do cliente um pagamento mensal. Paes garante que seu preço é imbatível. Em São Paulo, por exemplo, uma grande empresa paga cerca de R$ 11 por metro cúbico de água e saneamento para a Sabesp. A Aquaplus, diz Paes, assume todo o investimento necessário e presta o serviço com um desconto de 20% em relação a esse valor. Um contrato já foi assinado e, até o final do ano, outros cinco deverão ser firmados.

Olavo também dedica-se ao trabalho no Instituto Marquês de Salamanca, título herdado de seu tataravô, um espanhol responsável pela construção da primeira estrada de ferro que ligou Madri a Salamanca. O instituto apóia cerca de 800 pessoas em um amplo trabalho comunitário na cidade de Três Rios, no Estado do Rio de Janeiro. Outro braço da entidade estende-se ao bairro de Santa Teresa. ?É o único assunto em que não é preciso agendar reuniões comigo?, diz.

As atividades pessoais engoliram parte do tempo antes dedicado ao Monteiro Aranha. Ali, Olavo concentrou sua atenção para a busca de novas oportunidades de investimentos. A energia elétrica foi o setor eleito, com preferência sobre as pequenas centrais hidrelétricas. Uma delas já está em funcionamento, a Santa Rosa. ?Foi para aprender sobre o setor?, diz Monteiro de Carvalho. Outro projeto já em andamento é na Bolívia, onde mantém uma usina com o objetivo de vender energia para o Brasil. Atualmente os técnicos do Monteiro Aranha estudam 25 projetos no setor. Ao final da peneira, deverão restar três ou quatro PCH ? o equivalente a uma capacidade de 100 quilowatts. Dinheiro para isso já existe. O grupo tem em caixa de R$ 70 milhões a R$ 80 milhões. Outros R$ 20 milhões a R$ 30 milhões em ativos podem ser convertidos em moeda sonante rapidamente. Além disso, não está descartada uma participação do grupo francês Siif no negócio. ?Não nos afastamos de nossa vocação?, diz Olavo. ?Sempre atuamos em setores de risco baixo, maturação longa e retorno estável.? Para que esse investimento saia do papel, porém, o conselho de administração do grupo terá de acender o sinal verde em uma reunião marcada para abril.

No mesmo mês, o escritório do grupo, localizado em um tradicional edifício no bairro da Glória, no Rio de Janeiro, será reinaugurado. O vento terá um caráter simbólico. ?É como se iniciássemos um novo momento em nossa vida?, diz Olavo. Os últimos anos não foram os mais brilhantes na trajetória de quase 90 anos do Monteiro Aranha. Uma jogada infeliz, a aquisição do Banco Boavista, mergulhou o grupo no que parecia ser ?um poço sem fundo?, nas palavras de Olavo. O rombo provocado pelo lance malsucedido consumiu a maior parte dos US$ 160 milhões arrecadados com a venda de uma participação da Ericsson para os controladores suecos da empresa. A saída foi vender a instituição financeira para o Bradesco. Quando só faltava assinar o contrato, o empresário
Nelson Tanure quase impediu a concretização do negócio. Dono de 1% do banco, Tanure entrou com uma ação judicial na qual pedia revisão do valor pago. Para sair do meio do caminho, acabou embolsando US$ 156 milhões. Olavo prefere não comentar o assunto. ?É página virada?, diz.

Os problemas gerados pelo Boavista provocaram uma ampla revisão no Monteiro Aranha. A estrutura foi enxugada e atividades, abandonadas. Uma delas foi a parceria com o grupo lusitano Águas de Portugal na empresa Pró Lagos, com atuação direcionada para concessões na área de saneamento básico. ?Os investidores brasileiros têm grande dificuldade de obter recursos suficientes para atividades como essa?, diz Olavo. Ao longo desse período, também desistiu de qualquer participação na telefonia, sonho acalentado durante a privatização do setor e que gerou parcerias com gigantes como a Southwestern. ?Graças a Deus, não ganhamos nenhum leilão de que participamos?, brinca.

O redesenho do grupo Monteiro Aranha não foi inteiramente tocado por ele. ?Quem capitaneou essa reviravolta foi a Lilibeth?, diz, referindo-se à irmã, primeira mulher do ex-presidente Fernando Collor. ?Eu só aparecia por lá para as reuniões de diretoria. O dia-a-dia é responsabilidade dela e dos diretores.? Assim que o conselho der o sinal verde ao plano de investimento em energia, isso deve mudar. Afinal, Olavo Monteiro de Carvalho não deixaria de ser o principal protagonista na volta por cima do grupo que se confunde com sua própria vida.