Para a saúde financeira do País e sobrevivência do sistema, poucos podem discordar sobre a urgência da aprovação de uma reforma previdenciária o quanto antes. O modelo em curso quebrou. Caminha para a total inviabilidade. E no curto prazo. O rombo é astronômico e seu crescimento, geométrico. As distorções, de toda ordem. Na semana passada, o Governo enviou ao Congresso um arcabouço de propostas de reformulação das regras. Passo decisivo para colocar em ordem o Orçamento Federal. Contempla medidas importantes.

Ataca algumas injustiças, como a falta de isonomia dos benefícios entre trabalhadores públicos e privados. Mas deixa de lado talvez o aspecto mais crucial da empreitada: o ataque firme e incondicional aos privilégios. Esses foram, ao menos temporariamente, preservados. Não é segredo para ninguém que algumas castas muito específicas de aposentados são contempladas com recursos generosos (na quase totalidade de seus rendimentos) enquanto a maioria dos brasileiros esbarra em um teto máximo de valor do benefício, hoje na casa de R$ 5 mil.

Entre os abonados com pensões que não segue a restrição de faixa estão, por exemplo, militares e suas famílias. Eles não estão contemplados no escopo de mudanças. Um erro de origem do projeto governamental. O déficit gerado pelo volume de aposentadorias e pensões militares neste ano será da ordem de R$ 32 bilhões ou o equivalente a 45% do total dos gastos sob essa rubrica que é destinado ao universo dos servidores públicos. O contingente atendido abrange 350 mil militares e o Planalto, para não se indispor com as forças armadas em um momento de tensão política, resolveu permitir ainda que benefícios e pensões poderão ser acumulados no caso dessas categorias.

PMs e bombeiros também acabaram ficando de fora da reforma. E mesmo os políticos terão regras de transição diferenciadas. Na prática, somente 5% dos servidores na ativa serão atingidos pelas mudanças, já que elas só valerão para quem entrou na carreira a partir de 2013. Levando em conta que a economia almejada com o projeto é da ordem de R$ 45,9 bilhões ao ano, faria saudável diferença uma parcela de contribuição do volume de recursos reservados para atender ao contingente da farda.

Outra distorção ainda pouco considerada na proposta previdenciária é a exigência que leva as pessoas a terem de trabalhar 49 anos seguidos para poder conseguir a aposentadoria pelo teto. Isso significa que o profissional, ingressando no mercado com idade na faixa dos 20 anos, terá de trabalhar até os 70 anos para chegar a esse objetivo. Em outros tempos, quando a escolaridade mínima exigida não passava do primário ou secundário, muitos ingressavam na ativa com até 14 ou 15 anos.

Mas à medida que o curso superior e a aposta na educação se tornaram prioridade na vida das pessoas essa faixa etária para começar uma carreira foi subindo. E é importante que siga assim. Seria um equívoco qualquer prejuízo na formação de uma boa mão de obra em troca da necessidade de ingresso mais cedo no mercado de trabalho para viabilizar, lá na frente, a aposentadoria plena em idade adequada para usufruir do benefício. São ajustes que, inevitavelmente, o Congresso ainda terá de debater.

(Nota publicada na Edição 997 da Revista Dinheiro)