Uma série de pessoas, tanto homens quanto mulheres, é mostrada comprando presentes e se preparando para a celebração do dia dos namorados, enquanto a trilha sonora traz a melodia de Toda Forma de Amor, sucesso do cantor Lulu Santos. Quando os encontros, enfim, acontecem, percebe-se que se trata de quatro casais: dois heterossexuais e dois homossexuais. A propaganda da empresa de cosméticos paranaense O Boticário, para a coleção de fragrâncias Egeo, representa uma importante virada da publicidade e na estratégia das marcas brasileiras, que começam a incluir mais diversidade sexual em suas campanhas.

Tão importante quanto a temática, no caso da O Boticário, é que não se trata de uma ação voltada apenas à internet, de circulação mais restrita e se constitui num terreno fértil para a polêmica. Inicialmente, a empresa optou por veicular, desde o domingo 24 de maio, a campanha em TV aberta. A empresa defendeu a sua opção. “A proposta da campanha é abordar, com respeito e sensibilidade, a ressonância atual sobre as mais diferentes formas de amor – independentemente de idade, raça, gênero ou orientação sexual – representadas pelo prazer em presentear a pessoa amada no dia dos namorados”, diz um comunicado.

“O Boticário reitera, ainda, que valoriza a tolerância e respeita a diversidade de escolhas e pontos de vista.” O movimento da empresa de cosméticos, uma grandalhona de mais de R$ 9 bilhões de faturamento, não é isolado. Também em maio, a companhia aérea Gol apresentou vídeo online que apresentava casais reais que optaram por adotar crianças, numa forma de incentivar a prática. Mesmo sendo criado para o Dia das Mães, o vídeo, desenvolvido pela produtora TV1, trazia um casal composto por dois homens. “A campanha superou as expectativas”, afirma Florence Scappini, diretora de marketing da Gol.

“O resultado foi extremamente positivo e foi alavancado, principalmente, pela presença do casal Gilberto e Rodrigo e seu filho Paulo Henrique.” O filme, mesmo restrito à internet, ficou entre as ações para o dia das mães que geraram maior repercussão, com 95% de aprovação dos internautas, segundo estudo realizado pela webSensus, empresa de pesquisas do grupo Omnicom. Um terceiro caso de pluralidade na propaganda brasileira, neste ano, foi o do bombom Sonho de Valsa, da Mondelez. Em um vídeo, divulgado em abril, que mostrava o amor entre casais incluía um beijo gay feminino.

Além de buscarem o benefício de ganhar uma imagem de modernidade com iniciativas como essas, as marcas despertaram para um público cada vez mais importante de consumidores. Segundo o fundo de investimentos LGBT Capital, especializado em administrar recursos de gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros, a comunidade movimenta mundialmente US$ 3 trilhões por ano. O público homossexual também costuma gastar 30% a mais em consumo pessoal do que os heterossexuais. Não é de se estranhar, então, o começo da movimentação das empresas brasileiras. Em alguns outros países, a publicidade com temática gay, apesar de ainda pioneira, já é mais comum.

Nos últimos anos, a joalheria Tiffany’s, a montadora Toyota e a empresa de comércio eletrônico Amazon divulgaram peças publicitárias que apoiavam a diversidade sexual. É um cenário muito diferente do enfrentado pela fabricante de móveis sueca Ikea, duas décadas atrás. Um comercial da empresa, que mostrava um casal gay comprando móveis foi veiculado uma vez em Nova York e Washington e precisou ser retirado do ar, após ameaças de bomba às suas lojas. Em 2011, foi a vez de a Benetton usar a montagem de beijo entre Barack Obama e Hugo Chávez como instrumento de crítica política. Hoje, é possível ser até um tanto mais audacioso, como foi o caso de uma campanha lançada no festival de Cannes deste ano, no dia 15 de maio, pela marca de sorvetes Magnum.

Chamada “Seja fiel ao seu prazer”, as peças apresentam transexuais tomando sorvete. Muitas empresas, inclusive, assumiram a frente na luta por direitos para a comunidade gay. Em março, a Suprema Corte dos EUA recebeu um documento com a assinatura de 379 companhias que pedem a legalização do casamento gay em Estados mais conservadores. Entre as gigantes que assinam o documento estavam a Coca-Cola, o Google, a Apple, a Microsoft, o Facebook e a J&J. A iniciativa tinha também um caráter prático. Sem direitos iguais, é mais difícil recrutar pessoas para trabalhar em certas regiões.