03/03/2004 - 7:00
Houve, dentro e fora da Xerox, quem torcesse o nariz para a indicação da desconhecida Anne Mulcahy ao cargo de presidente da companhia em 2001. O que teria levado o Conselho da empresa a colocar no comando a moça que começou como vendedora autônoma das máquinas Xerox e fez carreira somente na área comercial? Por que não escolher um craque das finanças ou da administração para levantar uma companhia que, naquele ano, acumulava dívidas de US$ 17 bilhões e amargava prejuízo de US$ 200 milhões? A resposta veio rapidamente. Em dois anos, a ex-vendedora ressuscitou a marca, reduziu o endividamento e transformou o prejuízo num lucro de US$ 360 milhões. Os resultados foram anunciados há poucos dias, sob aplausos do mercado. É claro que tradicionais medidas de emergência, como fechamento de fábricas, demissões e terceirização de atividades, foram usadas na recuperação. Mas a reconstrução da companhia veio menos das cartilhas de gestão e mais dos centros de inteligência da Xerox. Com investimentos de US$ 1 bilhão, Anne Mulcahy botou os técnicos da empresa para pensar noite e dia em inovação. Deu certo: entre 2002 e 2003, surgiram 35 novos produtos para o mercado de impressão e gráfica ? e até uma TV de plasma Xerox foi criada. As vendas explodiram e os analistas entenderam por que Anne foi chamada: uma especialista em vendas saberia exatamente o que o mercado queria comprar. Simples assim.
Anne começou a virar o jogo nos laboratórios de Palo Alto. O consagrado centro de pesquisa, que assinou invenções como o mouse e o scanner, era uma referência tecnológica para o mundo, mas nos últimos tempos parecia trabalhar mais para o mercado do que para a própria Xerox. A presidente mundial passou a exigir prioridade para a companhia. Surgiram assim dezenas de produtos revolucionários, com destaques para as máquinas multifuncionais ? pequenas maravilhas que copiam, imprimem, funcionam como scanner, fax, enviam e-mails e podem compartilhar impressos via rede. Com as novidades, as vendas de equipamentos no mundo subiram 40% em relação ao ano anterior, contribuindo fortemente para a marca de US$ 15,7 bilhões de faturamento do grupo. No Brasil, a companhia não revela cifras. O que se sabe é que a venda de novos produtos aumentou 30% em relação a 2002.
De acordo com o instituto de pesquisas IDC, o mercado de multifuncionais deverá crescer 50% no Brasil em 2004. ?Estaremos prontos para suprir a demanda. A Xerox terá 30 novos produtos para esse segmento?, promete Pedro Fabrega, presidente da Xerox do Brasil, a terceira maior empresa da corporação. Além dos equipamentos, o presidente da filial brasileira pretende investir em distribuição, multiplicando os pontos de venda da marca. Serão 62 revendas exclusivas e seus produtos estarão nas prateleiras de outras 120 lojas multimarcas ? sem contar os 1,5 mil vendedores autônomos cadastrados no País. Outra estratégia que segue em linha com os mandamentos de Anne é reforçar as atividades de consultoria para os clientes. Os serviços incluem desde a gestão de documentos até a redução de custos nos sistemas de impressão. Entre os clientes estão empresas como Nestlé, Vivo, Banco Mercantil, CSN e Embratel. Talvez você não saiba mas hoje os panfletos que os bancos enviam à sua casa ou as contas de telefone que aparecem em sua caixa de correspondência são controladas e confeccionadas pelo Centro de Produção de Documentos Inteligentes da Xerox em Tamboré (SP).
No segmento de impressões de alta produção, para grandes clientes, Palo Alto caprichou. No ano passado, lançou o Igen3, o maior equipamento digital de produção gráfica em cores já fabricado no mundo. ?A digitalização é um caminho sem volta da Xerox?, afirma Fabrega. De acordo com o instituto CAPVentures, o mercado mundial para impressão digital cresce a taxas de 34% ao ano desde 2002. A aposta da Xerox é tão grande na nova tecnologia que do total de US$ 1 bilhão investido em pesquisas, metade foi destinado aos produtos digitais.
É realmente uma nova era na Xerox. Até a chegada de Anne, os equipamentos analógicos representavam mais de 60% de suas vendas. A empresa parecia ter parado no tempo, incapaz de modernizar seus equipamentos. Quando os números chegaram ao fundo do poço, em 2001, dizia-se no mercado que o pior nem era a vermelhidão do balanço financeiro, mas o amarelo desbotado do catálogo de produtos da Xerox. A vendedora Anne mudou a história, investindo em inovação. Tanto que já existem em países desenvolvidos uma linha de tevê de plasma da Xerox. ?Dependendo da aceitação lá fora, nós também podemos trazer a novidade para o Brasil?, diz Fabrega. Mais que um teste, a TV de plasma com o X da empresa surge como genial golpe de marketing de Anne. Um sinal para o mercado de que a marca está antenada com o futuro.