Por Beto Silva

Com 45 anos de história, a Tok&Stok passa por um estágio de refundação. A empresa que se tornou referência em móveis com design, acessórios e decoração acessíveis resgata o modelo de negócio que está em seu DNA com a volta de sua fundadora Ghislaine Dubrule ao cargo de CEO.

A executiva francesa assumiu o comando da operação, após deixar o cargo em 2017, para tirar a empresa da crise. Nesses seis anos, foram cinco CEOs. O resultado deixado é uma dívida assumida na casa de R$ 350 milhões e problemas de imagem da marca a partir de notícias de atrasos em aluguéis de lojas.

Mas nada disso assusta Dubrule. Aos 73 anos, formada em Letras e em Ciências Políticas em instituições da França nos anos 1970, ela observa o negócio com sensibilidade, além das planilhas financeiras. Porém, sem que as rédeas da gestão se afrouxem. “No varejo você tem que controlar muito todos os fluxos”, disse à DINHEIRO.

51
lojas fazem parte da operação e são o foco da atual gestão

17
unidades deficitárias foram fechadas no novo plano da empresa

PASSADO

Com a delicadeza que lhe é peculiar, sem deixar de lado a firmeza e a sinceridade, Ghislaine Dubrule discorreu sobre os percalços que fizeram a Tok&Stok entrar em um ciclo negativo.

O fundo de private equity americano Carlyle assumiu participação majoritária da empresa em 2012. Mesmo com a venda, a fundadora permaneceu como CEO. Era para ser uma transição de um ano. Foram cinco.

Ela saiu em 2017 – com as contas no azul –, em uma avaliação do investidor de que era preciso profissionalizar a gestão, com uma visão mais aberta de mercado e com tráfego em instituições financeiras. Um novo CEO foi anunciado.

Desta vez a transição que era pra ser mais densa, foi rasa. Apenas cinco dias. Naquele momento o Brasil já estava em crise. Era final do governo Dilma, início de Temer. Soma-se a isso os planos dos executivos que assumiram que não deram certo. E as trocas foram ocorrendo sucessivamente.

A média é de pouco mais de um ano de atuação para cada executivo entre 2017 e 2023. “Evidentemente, quando se tem uma sucessão rápida de diversos profissionais, por melhor que eles sejam, é muito difícil consolidar resultado”, disse Dubrule.

“O negócio da Tok&Stock é um pouco distinto. Não é supermercadista, não é luxo, mas navega no meio disso. Com o tempo perdemos nossa cultura.”
Ghislaine Dubrule, CEO.

Entre os principais equívocos citados pela francesa está o investimento exacerbado no digital. O time de tecnologia passou de 70 para 350 profissionais. A participação das vendas on-line chegaram a 27%. Mas com um pequeno problema: fechava no prejuízo.

Outro investimento que gerou percalços foi a transferência do centro de distribuição de São Paulo para Extrema (MG).

Paralelamente, veio uma tal de pandemia a partir de 2020. Lojas fechadas, queda nas vendas, insumos mais caros, logística inflacionada. O digital não foi tão eficiente.

“Uma construção de fatores extremamente explosiva”, nas palavras de Dubrule.

Houve ainda outro fator determinante para o negócio degringolar, segundo a fundadora: lojas menores, apenas com exposição de acessórios. E novamente a sinceridade da executiva vem à tona. “Isso banalizou a marca. Nosso cliente quer a Tok&Stok com a sua coleção mista, de móveis e acessórios.”

Ghislaine Dubrule, CEO da Tok&Stok

“Nosso cliente é inspiracional, life style, antenado em moda, ligado em design e quer passear por tudo isso na loja.”
Ghislaine Dubrule CEO da Tok&Stok

PRESENTE

E o que Ghislaine Dubrule tem feito para resgatar a Tok&Stok? Ela explica.

• Primeiro, renegociou a dívida com os bancos — os próximos dois anos estão livres de pagamento.
• Além disso, fechou 17 lojas compactas que eram deficitárias. Ficaram 51 unidades grandes, como modelou a fundadora no início do negócio.
• E o fundo Carlyle aportou R$ 100 milhões para dar fôlego à companhia.

O gerenciamento está no laço da executiva. “São cinco dezenas de lojas, um CD e 35 entrepostos para dar vazão às mercadorias. Temos de ter regras e controle rígido dos fluxos e processos para não perder a lucratividade”, afirmou Dubrule.

FUTURO

E o que vem pela frente? Foco nas lojas físicas, sem inauguração de lojas prevista até o fim de 2024. Manutenção do patamar de 17% nas vendas on-line“Nosso cliente é inspiracional, life style, antenado em moda, ligado em design e quer passear por tudo isso na loja.”

Oito coleções serão lançadas em 2024. “Novos produtos, novas cores, estampas e tendências. Todos os setores renovados. É nosso DNA.”

A perspectiva é de que essas ações farão a receita voltar a crescer após queda de 2022 (cerca de R$ 1,7 bilhão) para este ano (R$ 1,2 bilhão). “Devemos nos aproximar do breakeven em 2023”, disse a CEO.

Nesse caso, empate é vitória. “Nosso objetivo para 2024 é retornar com uma geração de caixa positiva e o lucro também.” E uma possível fusão com a Mobly? Existe a possibilidade. A fase é de conversas, com due diligence para entender o que cada lado tem a oferecer. A Tok&Stok entra com a refundação.