A bela casa do engenheiro Renato Barcellos, construída sobre uma montanha (a 1.400 metros de altitude) num condomínio fechado de Belo Horizonte, está em faxina. Todo e qualquer objeto que tenha o logotipo da Coca-Cola ? de ímãs de geladeira a avental de cozinha ? vai direto para o lixo. Não, não é mais um boicote aos produtos americanos. É que o dono da casa deixou recentemente a presidência da Coca-Cola no Nordeste para comandar justamente a mais nova concorrente no milionário mercado de colas do Brasil: a americana RC Cola.

Pouca gente ouviu falar dela por aqui, mas a bebida é encontrada em 70 países e é a terceira cola mais vendida nos Estados Unidos ? com enorme distância das líderes Pepsi e Coca. Criada por um farmacêutico americano em 1905, a marca hoje tem dois donos. Nos Estados Unidos, ela é da Cadbury Schweppes. Fora do mercado americano, pertence à Cott, empresa canadense de concentrados. E foi essa última que agora franqueou a marca à brasileira Real Bebidas, nascida da associação entre o grupo VDL, o Banco Rural e o empresário mineiro Antônio Costa, que já atuou no ramo de distribuição de bebidas. O contrato é de 20 anos, prorrogável por mais 10. Se depender da ambição dos sócios brasileiros, a Cott deve renovar a licença sem maiores problemas. A franquia estima faturar R$ 100 milhões já em 2004 e quer morder 5% do mercado de refrigerantes nos três primeiros anos de Brasil. ?Hoje em dia não existe tanta lealdade à marca?, diz Barcellos, presidente da Real Bebidas. ?A nossa arma será a degustação nos pontos-de-venda. Quem experimentar, vai levar o produto.? Segundo ele, a bebida tem 4% a mais de preferência sobre a Coca-Cola e 6% sobre a Pepsi nos mais de 5 milhões de testes cegos feitos nos Estados Unidos.

Embora Barcellos conheça bem o mercado ? o executivo trabalhou dez anos na Coca-Cola ? é preciso coragem para enfrentar o marketing milionário das principais rivais e o avanço das tubaínas, as bebidas populares regionais que controlam cerca de 30% do mercado de refrigerantes. Se até as grandes marcas, que têm imagem consolidada e esquema poderoso de distribuição, penam com o novo inimigo, o que dizer, então, da RC Cola? ?Eles estão sendo corajosos. A aprovação do produto não significa necessariamente fidelização de marca?, afirma Adalberto Viviani, consultor especializado em bebidas. Barcellos está consciente do perigo, mas diz ter um motivo forte para não se intimidar. ?O mercado de refrigerantes é de R$ 10 bilhões. Se a gente conseguir 1% dele, já tem R$ 100 milhões?, explica Barcellos.

Até agora, a companhia investiu R$ 40 milhões na construção de uma fábrica no Rio Grande do Norte e reservou pelo menos R$ 10 milhões para gastar este ano. O dinheiro vai cobrir custos de divulgação e o início da produção. No começo, a bebida será vendida apenas no Nordeste e no Sudeste, a um preço até 15% menor do que o da concorrência. Mas Barcellos avisa: a RC Cola não é tubaína. ?Temos um produto de qualidade e um nome forte no exterior?, explica.

A estratégia dos brasileiros não é fazer campanhas de marketing milionárias. O objetivo é conjugar mídia local com boa distribuição, esse último considerado fator determinante para o sucesso. Basta lembrar o caso da Pepsi. O refrigerante começou a resolver seus problemas depois que a distribuição foi entregue à Brahma (hoje AmBev), em 1997. A RC Cola, aliás, vai se beneficiar dessa rede da concorrente para chegar aos grotões do Nordeste. Como a AmBev desistiu de terceirizar a distribuição da sua cola naquela região, sobrou muita gente com infra-estrutura montada para fazer o trabalho. O porte pequeno, pelo visto, não é problema para a empresa. Essa característica, em princípio desvantajosa, será usada a seu favor. ?As marcas líderes são antipatizadas no mercado. São arrogantes, tratam mal os seus clientes diretos?, alfineta o deputado Jayro Lessa, o dono do Grupo VDL, dona de metade das ações da nova empresa. ?Desse jeito elas dão chance para marcas novas, mais ágeis, mais flexíveis.? Está declarada a nova guerra das colas.