06/07/2004 - 7:00
O lendário empresário japonês Akio Morita, o fundador da Sony, dizia que ?se dois executivos de minha empresa pensam da mesma forma, um deles está sobrando?. A máxima, uma defesa da pluralidade de opiniões no ambiente de trabalho, sempre funcionou como uma espécie de mandamento na Método, uma das mais importantes construtoras do Brasil. Donos de estilos e personalidades diferentes, seus acionistas, os engenheiros civis Hugo Marques da Rosa e Victor Foroni, formaram uma das mais profícuas sociedades da história empresarial brasileira. De uma pequena empresa de projetos criada pelos então estudantes da Escola Politécnica da USP, os dois ergueram os pilares de uma das mais inovadoras corporações do País. Agora, a parceria que parecia indissolúvel está sendo desfeita. Na última quinta-feira 1, a dupla assinou os documentos que transferem para Rosa a participação que Foroni tinha na companhia. Ambos dividiam em partes iguais a totalidade do capital votante da Método. As ações ordinárias estão nas mãos de fundos de investimento. O valor do negócio não foi revelado, mas o mercado estima algo entre R$ 30 milhões e R$ 50 milhões.
Trata-se de uma informação que vale menos pelo volume de dinheiro envolvido e mais pelo marco que representa. A Método tornou-se, sobretudo ao longo da década de 80, um símbolo da modernidade e inovação empresarial num cenário marcado pela estagnação e envelhecimento da indústria. Num setor com alta rotatividade de pessoal, baixa qualificação de mão-de-obra e condições de trabalho semelhantes às da revolução industrial inglesa, a Método trouxe inovações surpreendentes para o Brasil dos anos 80. Os canteiros de suas obras eram organizados e limpos. As marmitas foram abolidas e substituídas por refeições preparadas por nutricionista. Salas de aula foram montadas para alfabetizar os operários. Assim que a restauração do Teatro Municipal de São Paulo foi concluída pela empresa, a platéia presente ao espetáculo de reinauguração não era formada por autoridades e colunáveis. As cadeiras estofadas acomodavam os operários que haviam trabalhado na obra. A empresa também foi pioneira na implantação da gestão participativa. Todos os funcionários, do presidente ao servente do canteiro, recebem uma parcela do lucro anual. Foi também a primeira a utilizar os pré-moldados nas obras.
A gestão inovadora trouxe bons resultados. No ano passado, a empresa atingiu um faturamento de R$ 400 milhões e um lucro, modesto, de R$ 4,7 milhões. Em
sua carteira, há encomendas de R$ 800 milhões. Os números já foram mais vistosos, mas a Método sofre os efeitos de um setor em crise. Em 2003, a construção civil caiu quase 9% em relação a 2002. As diferenças entre Rosa e Foroni foram os pilares sobre os quais se ergueu a Método. Mas se transformaram nos elementos que minaram a base da sociedade. As decisões se tornaram mais lentas, pois era necessário o consenso entre os dois sócios. ?Antes a economia era previsível. Hoje, não. As mudanças são repentinas e não podemos esperar para tomar decisões?, afirma Rosa.
As diferenças também provocavam reflexos no ambiente de trabalho. Os executivos ficavam perdidos entre as opiniões opostas dos dois donos. ?A rotatividade de pessoal era mais alta do que o desejável em função da angústia provocada por essa situação?, afirma Rosa. Nenhum deles admite, mas existia dentro da empresa uma divisão cada vez mais acentuada.. ?Havia o pessoal do Hugo e o pessoal do Victor?, afirma um ex-executivo da empresa.
Os dois sempre admitiram as desavenças. ?Às vezes, discutíamos aos gritos. Era engraçado. Os funcionários ficavam do lado de fora da sala achando que sairíamos no tapa. O juiz era o interesse da empresa?, contou certa vez Rosa. Os dois eram diferentes mas se completavam. Rosa sempre gostou da exposição pública e de atividades externas, como a participação em entidades empresariais. Durante quatro anos, foi secretário de Estado no governo paulista de Mário Covas. O relacionamento com a imprensa e o público externo nunca o incomodou. Muito da imagem de modernidade da empresa se deve a ele. Se a Método tinha uma cara, essa cara era a de Rosa. O sangue, no entanto, era o de Foroni. Típico engenheiro tocador de obras, era a cabeça na produção, sempre presente na empresa. Agora, livre do dia-a-dia, ele pretende dedicar-se a atividades do terceiro setor e voltar às salas de aula da Politécnica ? agora na condição de professor. Também continuará se dedicando a seu haras, onde cria cavalos para hipismo e equitação. Seus animais estiveram presentes nas Olimpíadas de Atlanta em 2000 e repetiram o feito em Atenas neste ano. O contato com Rosa não será inteiramente cortado. Foroni continuará no conselho de administração da Método pelo menos até 2005, revelando que a sociedade acabou da mesma forma que sempre viveu: com muitas diferenças mas um respeito mútuo inquestionável.