É inegável o avanço que, nas últimas décadas, observa-se no processo de autocompreensão do papel das empresas perante a sociedade. Entendidas originariamente como organizações destinadas a produzir bens ou prestar serviços como meio de gerar lucro e acumular capital, as complexas relações que emergiram do desenvolvimento das empresas ao longo da história obrigaram seus proprietários e gestores a ampliarem sua visão e a levarem em consideração uma série de aspectos que, a princípio, pareciam estar fora do seu escopo. O primeiro desses aspectos foi a tomada de consciência em relação ao impacto social do processo produtivo.

Desde os primórdios da Revolução Industrial ficou claro que o objetivo financeiro das empresas não podia desconsiderar as condições de trabalho e de vida das pessoas empregadas. Garantir o mínimo de dignidade aos indivíduos envolvidos na cadeia produtiva emergiu, portanto, como questão coadjuvante que, com o tempo, mostrou ser não tão subsidiária, mas até central para a obtenção de lucro e projeção social das empresas.

+ “Demissão silenciosa”: um “grito” a ser ouvido pelos gestores e empresários

Fenômeno semelhante se deu mais recentemente, quando o tema da sustentabilidade começou a ganhar relevância. Havendo incorporado o “valor” da responsabilidade social como elemento constitutivo de seus objetivos, as empresas, na virada do século 20 para o 21, viram-se obrigadas a assumir, num contexto de despertar da consciência ecológica, uma nova responsabilidade: aquela para com o meio ambiente. A partir de então, além de serem lucrativas e socialmente responsáveis, as empresas precisavam ser “sustentáveis”.

Ainda que todo esse processo tenha se dado de forma reativa – ou seja, primeiro a lógica empresarial cria o problema para depois enfrentá-lo –, não se pode negar o ganho relativo que tal tomada de consciência representou para a sociedade, para a natureza e para as próprias empresas. Não fosse isso, as coisas que já estão péssimas poderiam ser ainda piores.

Pois bem, no momento em que nos encontramos, longe de haver solucionado os graves problemas de âmbito social e ecológico, nos deparamos com um novo e grave desafio: o da saúde mental e/ou existencial de todos os envolvidos no processo produtivo. A dinâmica de vida e trabalho imposta pela revolução digital, que vem relativizando rápida e radicalmente as noções de tempo e espaço, impõe um estilo de vida cada vez mais próximo do artificial e mecânico. O resultado dessa dinâmica desumanizadora é bastante perceptível: estamos adoecendo, e gravemente. Dados de órgãos nacionais e internacionais, como a OMS, apontam que já hoje – e com tendência crescente no futuro próximo – é o ambiente de trabalho (presencial e remoto) o grande responsável pela eclosão das doenças psíquicas que assolam a humanidade. Percebe-se claramente, com isso, que a nova responsabilidade a ser despertada e incorporada por gestores(as) corporativos é aquela relacionada ao equilíbrio psíquico e existencial das pessoas. E, neste caso, o melhor seria que para além de uma abordagem medicamentosa houvesse uma de caráter preventivo. É preciso que se comece a pensar numa “sustentabilidade da alma” para além daquela relativa ao meio ambiente.

Quem me acompanha nesta coluna sabe que este tem sido o tema central de quase todos os meus artigos. Partindo de uma experiência de anos de pesquisa e aplicação de projetos envolvendo as Humanidades como meio de humanização e promoção da saúde individual e coletiva, meu objetivo tem sido o de chamar a atenção para a importância da tomada de consciência da “responsabilidade humanística” por parte das empresas. Agora, como culminação desse processo, estou lançando, em coautoria com o executivo do setor farmacêutico Alexandre Seraphim, um livro intitulado Responsabilidade Humanística: uma proposta para a agenda ESG (Ed. Poligrafia).

Convido você, leitor(a), a conhecer mais a fundo este tema que, com certeza, vai se tornar cada dia mais estratégico e vital para o mundo empresarial.