26/04/2003 - 7:00
O que o regime de Saddam Hussein tinha de mais valioso virou pó em poucos minutos. A opulência dos seus 48 palácios, com pisos em mármore italiano, torneiras em ouro 24 quilates, afrescos finos e móveis em estilo barroco francês, não resistiu ao peso das bombas americanas. Um iate transatlântico foi alvejado. Todo o fausto dos monumentos de outrora, que custaram US$ 2,2 bilhões, já faz parte do passado. E, assim como essa riqueza, também ruiu o mito sobre os bunkers antes tidos como inexpugnáveis de Saddam. Muito se falou das suas paredes de dois metros de concreto, dos corredores secretos, dos labirintos subterrâneos, dos túneis e das portas em aço e ferro fundido, capazes de resistir ao ataque simultâneo de vários mísseis e até a explosões de bombas nucleares, como a de Hiroshima. Porém, em instantes, as fortalezas construídas pelo regime de Bagdá caíram como simples castelos de cartas. Nunca antes, em toda a história, as tropas americanas haviam penetrado de forma tão avassaladora e tão humilhante nos recintos luxuosos e reservados de um regime inimigo. Seus soldados sentaram-se nas salas em que Saddam reunia-se com seus ministros até há poucas semanas. De pernas abertas, o sargento Chad Touchett, rodeado por seus companheiros, fumou cigarros Marlboro, jogou as cinzas no chão e depois descansou. Os soldados entraram nos quartos, nos banheiros, e circularam em volta das piscinas vazias e até da churrasqueira de Saddam. Antes de saírem, deixaram uma marca. Com tinta spray, escreveram no chão: ?Os Estados Unidos estiveram aqui?.
Ninguém imaginava que as tropas americanas conseguiriam tomar os palácios de Saddam com tanta facilidade. O maior deles, às margens do rio Tigre, custou US$ 70 milhões. Foi concebido para suportar bombas, mísseis e tiros de canhão, num projeto supervisionado pelo engenheiro alemão Wolfgang Wendler. Antes do ataque, o próprio Wendler, que entregou as plantas dos palácios para a CIA antes da primeira Guerra do Golfo, duvidava que sua criação, com 14 quartos e 40 mil metros quadrados de espaço em construções subterrâneas, pudesse ser destruída. Por isso, as tropas anglo-americanas já tinham até desenhado um plano secreto para, caso fosse necessário, descer aos subterrâneos dos palácios e tentar caçar Saddam Hussein e seus aliados. Era a alternativa mais temida e mais perigosa, mas nada disso foi preciso. Desarticulados e sem comando, os soldados da guarda republicana não opuseram resistência. Houve apenas pequenos combates com milícias sírias, armadas com fuzis obsoletos, contra os mais de 70 tanques americanos que fecharam o cerco aos palácios.
Ao vasculharem os monumentos de Saddam Hussein, os soldados americanos se depararam com uma riqueza à qual não estavam habituados Um deles aproveitou para tomar seu primeiro banho da semana em uma das banheiras presidenciais ? o presidente iraquiano tinha uma toda banhada em ouro. Os templos de Saddam eram chamados de Palácios do Povo, mas ficavam protegidos por muros de 10 metros de altura. Os bilhões usados na construção vieram da venda contrabandeada de petróleo, por fora do esquema permitido pelas Nações Unidos, segundo o qual troca-se óleo por comida. E poucos tinham acesso ao luxo de Saddam. Só mesmo membros da elite do Partido Baas. A forma humilhante e debochada como os soldados americanos trataram o que restou do império de Saddam pode até ter chocado alguns iraquianos. Mas, para muitos deles, talvez tenha sido a primeira oportunidade de conhecer a opulência e o luxo que havia dentro daqueles palácios, antes vigiados dia e noite. Um luxo que, rapidamente, virou lixo.