25/01/2023 - 10:01
Valentin Mozgovi não consegue respirar sozinho e, em meio à guerra na Ucrânia, manter seu respirador funcionando durante os apagões se tornou uma questão de vida ou morte.
Os apagões recorrentes provocados pelos ataques de mísseis russos aterrorizam dezenas de milhares de ucranianos que dependem da eletricidade para manter seus equipamentos médicos em funcionamento.
Mozgovi sofre de esclerose lateral amiotrófica (ALS), uma doença neurológica degenerativa que o deixou paralisado e incapaz de respirar sem ajuda.
“Como podem ver, ele está vivo. Isso significa que resolvi o problema”, disse à AFP sua esposa, Liudmila Mozgova, em um apartamento em Kiev, capital do país devastado pela guerra.
Ao lado dela, seu marido está coberto com um edredom em uma cama médica, e seu rosto, quase invisível sob o respirador.
Em outubro, começou a onda de ataques russos contra a infraestrutura de energia. Quando o primeiro grande apagão aconteceu, Valentin teve de respirar sozinho por dez insuportáveis minutos.
“A forma como ele respirava era assustadora. Não sabíamos o que fazer!”, diz sua esposa.
Quando os apagões se tornaram a norma, os Mozgovi se adaptaram.
“Seu corpo não se move, mas sua mente é muito brilhante, ele dá muitos conselhos. É nosso capitão”, diz ela.
Liudmila instalou um sistema de armazenamento de energia e baterias adicionais para o respirador e para o colchão médico, que regula a pressão dos pacientes na cama.
– Ansiedade –
Por mais preparados que tentem estar, sua situação ainda é, no entanto, precária.
“Gostaria que tivesse um pouco de estabilidade para saber quando vai ter luz, para tomar uma decisão de como cuidar disso”, desabafou a esposa.
Liudmila Mozgova se dá conta da sorte que têm de poderem se permitir comprar o equipamento necessário para manter seu marido com vida.
“Era muito caro, nossos filhos nos ajudaram. Não sei nem que conselho dar para quem não tem dinheiro”, afirmou.
Na Ucrânia, dezenas de milhares de pessoas precisam de eletricidade para sobreviver, diz Irina Koshkina, diretora-executiva da ONG SVOYI, que atende pacientes em cuidados paliativos.
“Se, de repente, todas aquelas pessoas não pudessem usar seus dispositivos vitais e fossem para o hospital ao mesmo tempo, nosso sistema médico simplesmente entraria em colapso”, acrescenta.
Após três meses de apagões, Tetiana Venglinska não teve outra saída a não ser internar a mãe, Eva, de 75 anos, com câncer de pulmão e que precisa estar conectada a um aparelho que lhe forneça oxigênio o tempo todo.
Sentada no canto da cama de sua mãe, em um hospital de Kiev, Tetiana explica que, para garantir que o dispositivo funcionasse, a família teve de reduzir a quantidade de oxigênio fornecido.
“Para minha mãe, foi uma tortura”, relata Venglinska. “Imagine reduzir em três vezes o fornecimento de oxigênio”.
“Toda vez, meu marido tinha medo de entrar no quarto dela, porque não sabia se minha mãe estava viva, ou se ela havia sufocado”, disse Venglinska.
Na noite de 17 de dezembro, o blecaute durou mais de 10 horas, mais do que o normal.
Quando todas as fontes de energia se esgotaram e restavam 40 minutos de bateria no ventilador, Tetiana chamou uma ambulância particular para internar sua mãe. A decisão salvou sua vida, porque a casa de Venglinska ficou sem eletricidade pelos próximos quatro dias.
“Sem dúvida, teria morrido”, acrescenta.
Desde então, Tetiana passa a maior parte do tempo na clínica, cuidando da mãe acamada. O marido dela ficou no apartamento deles, onde cuida de seu pai, de 85 anos.