03/12/2008 - 8:00
A CRISE FINANCEIRA MUNDIAL NÃO provocou estragos apenas nas empresas. Alguns personagens que estiveram no centro do furacão também tiveram suas vidas transformadas de maneira brutal – e sofreram conseqüências até mais devastadoras do que aquelas que arrasaram grandes companhias mundo afora. No Brasil, dois diretores financeiros que participaram diretamente de operações cambiais que causaram perdas bilionárias à Aracruz e à Sadia foram demitidos depois do anúncio dos prejuízos. O recado das empresas: a culpa recaía sobre seus executivos. O caso da Aracruz é o mais grave. O ex-CFO (sigla para chief financial officers) Isac Zagury foi acusado formalmente pela companhia de ter desrespeitado controles internos que resultaram numa sangria de US$ 2 bilhões de dólares em operações com derivativos cambiais. Na Sadia, as perdas, embora menores que as da Aracruz, também revelaram-se estratosféricas: R$ 706 milhões. Na caça aos culpados, a Sadia supostamente encontrou um, o ex-diretor financeiro Adriano Lima Ferreira.
As últimas semanas têm sido infernais, asseguram os dois executivos. Para Zagury, a tragédia começou no dia 26 de setembro, quando as perdas da Aracruz se tornaram públicas. No mesmo dia, ele foi afastado. “Foi tudo muito rápido”, diz Zagury. “Sofri pelo fato de a empresa ter tido uma perda tão grande.” Sem trabalho, o executivo passou os dias seguintes trancado em seu apartamento, em São Conrado, no Rio de Janeiro. Acompanhar o noticiário, que muitas vezes trazia informações que imputavam a culpa a ele, era uma tormenta. Passou noites sem dormir e a angústia chegou a tal ponto que se transformou em crise hipertensiva, que o obrigou a permanecer dez dias internado em um hospital. “Nenhum acionista sofreu mais do que eu.” Por recomendação dos médicos, decidiu ficar distante do caso. Segundo ele, o afastamento permitiu que recuperasse a serenidade. Zagury estava disposto a ficar longe dos holofotes até que, na segunda-feira 24, a Aracruz entrou com um processo judicial contra ele. Com a aprovação de seus advogados, resolveu se defender via imprensa. “Não sou super-homem. A empresa tem uma estrutura de governança que era informada das operações.”
Desde que o episódio Sadia emergiu como um dos maiores tombos administrativos da história, a vida do ex-diretor financeiro Adriano Lima Ferreira, antes considerado um gênio dentro da empresa, também virou do avesso. Na semana em que foi demitido pela companhia e seu nome estampava os noticiários econômicos, o executivo passou noites no hospital ao lado das filhas gêmeas recém-nascidas. Naquele momento, a maior turbulência de sua vida profissional ficou em segundo plano. Uma de suas bebês passou quase duas semanas em observação médica, mas recebeu alta e voltou aos braços da família num apartamento em Moema, região nobre de São Paulo. Nesse tempo todo, o nome de Ferreira continuou a aparecer nos jornais. Obviamente, sempre associado a fatos negativos. Há duas semanas, procurado pela reportagem da DINHEIRO, Ferreira disse apenas que o episódio seria discutido judicialmente. “Esse assunto não é minha prioridade. Prefiro não comentar nada sobre minha vida profissional nesse momento, até que tudo fique mais claro”, disse. Dias depois, novamente consultado, Ferreira manteve a política do silêncio. Afirmou apenas que se sentia agredido pela repercussão do caso na imprensa. Na quinta-feira 26, outra tentativa de contato resultou numa nova informação. Segundo uma pessoa muito próxima, Ferreira viajou para “esfriar a cabeça”. Só retorna em janeiro.
Na semana passada, surgiu a notícia de que a Sadia está sendo investigada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por suposto uso de informação privilegiada em negociação no mercado acionário. Relatórios mensais encaminhados pela companhia à CVM com a movimentação de ações por executivos e acionistas mostram que a diretoria negociou papéis em setembro, quando jornais publicaram boatos sobre a possível venda de 20% do negócio para investidores estrangeiros. Os rumores sobre a venda puxaram uma acentuada valorização das ações da Sadia, que subiram mais de 15%.