09/11/2001 - 8:00
Por mais que goste de um produto, você tatuaria o logo da empresa no próprio corpo? Existe apenas uma marca capaz de incitar tal atitude: Harley-Davidson. Mais do que um meio de transporte, Harley-Davidson é a síntese em duas rodas do espírito de liberdade americano. No entanto, esse ícone da cultura dos Estados Unidos estava fadado a desaparecer não fosse um time de executivos, liderado pelo então presidente Richard Teerlink, descobrir a força desta cultuada marca. Pois se o ronco característico do motor de uma Harley nova ainda soa nos dias de hoje é, sobretudo, graças a esse culto à marca ? induzido e estimulado pela própria companhia. A trajetória da queda e ascensão da companhia está descrita em Mais que uma motocicleta ? A trajetória da liderança na Harley-Davidson, de Teerlink e Lee Ozley, que acaba de ser lançado no Brasil, pela editora Qualitymark. ?A primeira lição que se tira da trajetória de recuperação é que para que as empresas sejam mais eficientes, seus líderes precisam ter acesso à sabedoria e à experiência de seu próprio pessoal?, ensina Teerlink, que ingressou na empresa em 1981 e foi seu presidente e CEO entre os anos de 1988-97. ?Os líderes devem deixar de levar soluções ao seu pessoal para levar-lhes questões a serem solucionadas.?
Lucro crescente. Sob a liderança de Teerlink, a Harley se transformou em um dos grupos automotivos mais lucrativos do mundo. O lucro líquido no ano passado foi de US$ 348 milhões, para um faturamento de US$ 2,9 bilhões. Ela é dona de 50% do mercado de motos nos EUA e, no ano passado, registrou um volume de vendas da ordem de 204 mil unidades. Além de reverter a sorte da empresa, esse culto à marca, que se traduz na transformação da montadora em uma ?máquina de marketing?, é o que tem garantido a lucratividade crescente da companhia. Pelas contas da própria Harley, para cada dólar gasto na compra de uma motocicleta, o motoqueiro (ou motoqueira) gasta, ao longo da vida, outros cinco dólares. Ou seja, quem compra uma moto de US$ 15 mil vai desembolsar outros US$ 75 mil em acessórios, manutenção e outros serviços enquanto durar a paixão pela motocicleta. Inexistentes a algumas décadas atrás, a vasta linha de acessórios, que inclui desde jaquetas e calças de couro a bandanas, roupas de baixo, broches e presentes, tem uma importância bastante significativa: representa 25% do faturamento da empresa. Para estimular esse consumo, a Harley promove encontros e viagens regulares com motoqueiros em todo o mundo. A mais badalada delas deverá acontecer em agosto de 2003, quando mais de 200 mil fãs irão se reunir em Milwaukee para celebrar os cem anos da empresa. Em busca de preservar a fidelidade dos usuários, a Harley criou também os HOGs (sigla para Grupos de Proprietários de Harley), espécie de fã-clube. Com uma anuidade de 40 dólares, os membros se mantêm informados sobre tudo o que diz respeito ao universo Harley. Exóticos quando uniformizados em couro e de lenço na cabeça, muitos motoqueiros são executivos comportados, que se transformam de fim de semana.
Internacionalização. Diante do gigantismo do mercado americano, a Harley possui uma presença
internacional ainda bastante tímida. Cerca de 80% das vendas são realizadas no mercado americano. Com uma revenda autorizada no Brasil desde 1991, a empresa vem aos poucos conquistando os corações e mentes do brasileiro. ?Estamos criando um mercado, desenvolvendo uma paixão?, afirma Paulo Izzo, representante da marca desde 1993 e dono de uma rede de oito concessionárias exclusivas. O setor de motos nacional sofreu bastante com a falta de concorrência internacional antes da abertura de mercado no início dos anos 90. Modelos mais sofisticados e de passeio, que exigem uma tecnologia mais desenvolvida, foram preteridos pelas motos de baixa cilindrada, normalmente usadas como meio de transporte nas cidades. ?Há uma década, havia 60 mil motos novas circulando no País. Hoje o mercado absorve de 600 a 700 mil?, diz Izzo, empenhado em estimular seu crescimento. Quando o executivo assumiu a Harley do Brasil, o volume de vendas da marca não ultrapassava duas dezenas. No ano passado, foram 600 unidades. Pode parecer pouco diante do mercado americano, mas a Harley está bastante confiante no potencial de crescimento. Exemplo disso foi a construção de uma fábrica em Manaus, há dois anos, onde são produzidos sete modelos. A retração econômica, contudo, fez a empresa adiar até o próximo ano os planos de fabricar o cobiçado modelo de 883 cilindradas. O crescente interesse do brasileiro também pode ser medido pelo aumento das vendas de acessórios e roupas. ?Os acessórios ainda não representam 25% do nosso faturamento, como nos EUA, mas estamos chegando lá?, afirma.