O retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos vem levantando vários questionamentos (e, até certo ponto, “sofrimentos antecipados”) sobre os impactos que essa volta pode trazer ao comércio mundial, e em especial à economia brasileira.

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Durante seu primeiro mandato, Trump adotou uma postura protecionista, com foco em priorizar os interesses dos Estados Unidos por meio de tarifas comerciais e renegociação de acordos multilaterais. Agora, é relevante avaliar se essas estratégias se repetiriam, em qual grau poderiam acontecer e como elas poderiam afetar o Brasil.

Mais ameaças do que ações concretas

No primeiro mandato, as medidas protecionistas de Trump representaram uma ameaça ao comércio global, mas nem sempre resultaram em impactos imediatos e profundos em economias emergentes como a brasileira. O discurso agressivo contra a China, por exemplo, gerou tensões comerciais que acabaram abrindo espaço para o Brasil aumentar suas exportações de produtos como soja e carne.

No entanto, esse mesmo protecionismo também levou a incertezas nos mercados, o que poderia prejudicar o país no longo prazo, dada a sua dependência de investimentos externos e do comércio global.

No acumulado deste ano, segundo dados do Ministério da Economia, os Estado Unidos ocupam a 20ª posição nos países com maiores valores (em US$) de exportação brasileira. Os principais produtos de exportação do Brasil para os EUA são petróleo bruto, aeronaves, ferro e aço, café e celulose.

É provável que um eventual segundo mandato de Trump mantenha a ênfase em discursos de autossuficiência econômica e ameaças a parceiros comerciais. Contudo, a execução dessas medidas depende de negociações e de limitações impostas pelo Congresso americano. Isso significa que, embora o tom político possa gerar volatilidade, a concretização de ações com impacto direto no Brasil pode ser limitada.

A era da “des-globalização”

Um ponto importante a considerar é o contexto global de “des-globalização”, termo usado para descrever o enfraquecimento do multilateralismo e a fragmentação das cadeias produtivas globais. Embora esse movimento esteja em curso, ele não implica um retorno à teoria das vantagens comparativas tal como descrita na economia clássica.

A interdependência econômica entre países ainda é uma realidade, especialmente em setores de alta complexidade, como tecnologia e energia renovável, e até mesmo no agronegócio.

Para o Brasil, essa “des-globalização” apresenta desafios e oportunidades. Por um lado, a fragmentação pode dificultar o acesso a mercados globais e reduzir a competitividade de produtos brasileiros. Por outro, abre espaço para o país fortalecer laços comerciais bilaterais e regionais, além de explorar nichos, como o agronegócio sustentável e a exportação de commodities essenciais.

A necessidade do multilateralismo comercial

Apesar do cenário de “des-globalização”, o multilateralismo comercial ainda se mostra necessário. O Brasil, como uma economia emergente e exportadora, depende de regras claras e de previsibilidade no comércio internacional.

Nesse sentido, a continuidade de organizações como a OMC (Organização Mundial do Comércio) e a busca por acordos regionais (vide recentemente o acordo Mercosul-União Europeia) são estratégicas para minimizar os impactos de uma postura protecionista nos Estados Unidos.

Ademais, há um apelo crescente por parte de investidores e parceiros comerciais para que o Brasil assuma um papel mais ativo em questões ambientais e sociais (destaque para a COP-30), o que poderia fortalecer sua posição no cenário global, mesmo diante de um possível segundo mandato de Trump.

Em resumo, o retorno de Trump à presidência traria mais ameaças do que ações concretas para a economia brasileira, principalmente devido ao impacto indireto de suas políticas protecionistas e ao aumento das incertezas globais.

Entretanto, o Brasil possui instrumentos e oportunidades para se adaptar a esse cenário, como o fortalecimento de relações bilaterais, a busca por um papel mais relevante no multilateralismo comercial e o aproveitamento de nichos estratégicos.

No final, a chave está em como o Brasil irá responder a esses desafios e se posicionar como um parceiro confiável e competitivo em um mundo em transformação.

*Eduardo Menicucci é professor associado da Fundação Dom Cabral (FDC), nas áreas de Economia e Finanças. Possui MBA em Finanças, Mestrado em Engenharia de Produção e graduação em Direito