A ação militar que resultou na morte do músico Evaldo dos Santos Rosa, de 46 anos, não tem respaldo legal, segundo entidades jurídicas e de direitos humanos. No domingo, 7, militares dispararam pelo menos 80 tiros contra o carro do músico, supostamente porque teriam confundido o veículo com um automóvel roubado, no Rio.

Segundo o Comando Militar do Leste (CML), os militares não estavam em uma ação de Garantia de Lei e Ordem (GLO), que permitiria o apoio a operações policiais, por exemplo. Eles estavam em uma ação de patrulhamento de perímetro militar e, nesse caso, não tinham autorização para abordar veículos e, tampouco, atirar.

Para especialistas ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo, no caso de patrulhamento, os militares poderiam apenas impedir a entrada não autorizada de veículos em instalações do Exército, mas não fazer qualquer tipo de blitz.

“Acho que é um perigo grande para a sociedade, para a população”, afirmou o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio, Luciano Bandeira. “Se não era uma GLO, então eles estavam agindo como força de segurança, o que não é a função deles, mas sim da polícia.”

O pesquisador da Human Rights Watch, Cesar Muñoz, lembrou que os militares, tanto em ações de GLO quanto de patrulhamento, não têm competência para combater a criminalidade, nem buscar um carro roubado – como foi alegado no dia do crime.

“O patrulhamento visa à proteção do perímetro militar, das instalações militares, o que isso tem a ver com o suposto roubo de um carro?”, questionou o pesquisador. “Se havia um carro roubado, eles deveriam ter ligado para a polícia. Acho muito preocupante esses indícios de que militares estejam atuando no combate à criminalidade.”

Especialista em segurança pública, a pesquisadora Melina Risso, do Instituto Igarapé, concorda com o colega. “Me parece uma atuação completamente fora da atribuição do Exército”, afirmou. “Essa é uma atuação de polícia, que foge da normalidade militar; sem falar da falha na cadeia de comando da ação.”

Com base nessa argumentação, o advogado João Tancredo, que representa a família de Evaldo dos Santos Rosa, pretende questionar a competência da Justiça Militar para cuidar do caso.

O ex-presidente Michel Temer (MDB) sancionou em outubro de 2017 a Lei 13.491, que amplia as possibilidades de militares acusados de crimes cometidos no exercício da função serem julgados pela Justiça Militar, e não pela comum, mesmo no caso de as vítimas serem civis. “A conduta esta fora da competência deles”, sustentou Tancredo. “A atuação não está ligada a nenhuma atividade militar e, por isso, o crime deve ser julgado pela Justiça comum.”

Em nota oficial divulgada na tarde desta quarta-feira, 10, o CML informou que é legítima a atuação da força terrestre em defesa do patrimônio militar. “O Exército Brasileiro, em área militar, possui a missão constitucional de manter a integridade do patrimônio público afetado às suas funções institucionais, exercendo a atividade fiscalizatória ou de polícia administrativa sobre eles assegurando, destarte, a proteção de seu pessoal e de transeuntes, bem como de toda a coletividade, uma vez que tais logradouros nunca perderam a natureza jurídica original de bens públicos pertencentes à União Federal, regularmente adquiridos, e sujeitos à administração militar.”