10/04/2002 - 7:00
Na segunda-feira 22, uma mudança substancial irá acontecer na forma como as empresas fazem as contas. Em vez de fechar o caixa no final do expediente, o controle de tudo o que saiu e entrou na conta da companhia passará a ser feito ao longo do dia, em intervalos de poucas horas ou, até, de minutos. Será a estréia do novo Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB), do Banco Central, que já colocou R$ 17 milhões no projeto. No dia-a-dia das corporações, essa revolução tecnológica irá transformar uma tarefa burocrática e rotineira em uma ação instantânea. Os pagamentos e as cobranças serão feitos automaticamente e o risco de entrar no vermelho será uma preocupação constante no departamento financeiro. ?Agora sim o sistema entra na era on-line, com as transferências acontecendo quase que no mesmo instante?, diz Maurício Ghetler, diretor de tecnologia do Banco Santos. Um simples cheque, por exemplo, que leva até um dia para ser compensado, terá que ser pago em questão de minutos. Tanto os bancos quanto as empresas terão que adaptar suas tecnologias a esse novo sistema, bem mais ágil. Até agora, foram gastos R$ 1,5 bilhão, principalmente na aquisição de softwares. Só os bancos, que foram os primeiros a se mover, responderam por 60% desse valor.
Empresas de menor e maior porte já foram assediadas pelos bancos com folhetos informativos e palestras gratuitas sobre o assunto. Contudo, a maior parte delas ainda não está suficientemente familiarizada com as alterações. Uma pesquisa feita no final de fevereiro pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, a Fiesp, mostrou que seis em cada dez indústrias pesquisadas sequer sabiam como funcionaria o SPB. Na prática, o sistema está sendo implementado pelo Banco Central para evitar o descasamento nas contas dos bancos e possíveis quebradeiras. Com os números acertados a toda hora, não haverá motivo para que os bancos apareçam com uma dívida impagável ao final do dia.
Nas empresas, o risco que correm com a entrada do SPB é descobrir tardiamente que o fluxo de caixa entrou no vermelho e serem obrigadas a pagar os juros bancários. ?Muitas empresas serão pegas de surpresa, o que é um perigo?, diz Fernando Godeghesi, diretor de instituições financeiras da KPMG Consulting. Ciente disso, o Banco Central e a Federação Brasileira de Associações de Bancos (Febraban) resolveram há uma semana que a mudança irá ocorrer por etapas. Numa primeira fase, o SPB valerá apenas para as transações acima de R$ 5 milhões, o que deve afetar apenas as empresas de grande porte. No segundo semestre, o limite deverá voltar aos R$ 5 mil fixados anteriormente. ?Quando começar, o SPB vai afetar entre 1% e 5% das nossas operações. O impacto será maior mesmo quando o limite cair mais tarde?, diz Aldo Consentino, diretor-financeiro e de tesouraria do hipermercado Carrefour.
O adiamento dá uma folga maior para as empresas menores se prepararem (este foi o terceiro em menos de dois anos). Quando finalmente for implementado, a situação tenderá a ser mais crítica entre os varejistas, que recebem em cheques pequenos que só entram no dia seguinte e irão pagar seus fornecedores instantaneamente. No último dia 26, o Banco do Brasil lançou um programa que gerencia as contas naquele momento e faz previsões do caixa para os dias seguintes. O programa será operado por um profissional especializado, que já foi batizado de ?piloto de caixa?. Ele estará acompanhando o vaivém do dinheiro e, no caso de uma emergência, poderá usar o software para fazer transferências entre contas, adiar alguns pagamentos ou pedir um empréstimo. A Datasul, segunda maior empresa de software de gestão no Brasil, também já tem um protótipo de programa que consegue fazer essas mesmas operações manipulando dados digitais de vários bancos, o que o Banco do Brasil promete fazer mais adiante. Nos dois softwares, as informações sobre troca de valores entre as empresas, fornecedores e clientes estarão todas integradas no mesmo sistema para que o ?piloto? possa dirigir com segurança com base em gráficos e projeções. ?As empresas terão que reprogramar suas relações com todos os bancos, fornecedores e até mesmo entre seus próprios departamentos?, diz Clarice Messer, diretora do departamento de estudos econômicos da Fiesp. ?Se fizerem isso, a mudança não será nada traumática.?