Desde 2009, o fundador e CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, se propõe a cumprir uma meta pessoal de Ano Novo. Entre suas resoluções, ele já estudou mandarim, leu um livro a cada 15 dias, construiu um assistente pessoal de inteligência artificial para organizar sua casa e fez um tour para conhecer pessoas de cada um dos 50 Estados dos EUA. Neste ano, Zuckerberg quer simplesmente consertar o Facebook. “Não vamos prevenir todos os deslizes ou abuso, mas atualmente cometemos muitos erros ao aplicar nossas políticas e ao prevenir o mau uso de nossas ferramentas”, escreveu Zuckerberg, no começo deste ano, em sua página pessoal no Facebook. “Se tivermos sucesso neste ano, vamos terminar 2018 em uma trajetória muito melhor.”

No dia 11 de janeiro, Zuckerberg arregaçou as mangas e começou a trabalhar para cumprir sua meta pessoal. Ele anunciou o que está sendo considerado a maior mudança da história do Newsfeed, como é chamada a coluna central onde são mostrados os conteúdos publicados na rede social. De acordo com a nova diretriz, o algoritmo do Facebook passará a privilegiar os posts de amigos e familiares. Em segundo plano ficarão os conteúdos de marcas e de empresas jornalísticas. “Sentimos a necessidade de garantir que nossos serviços não sejam apenas divertidos de usar, mas também bons para o bem-estar das pessoas”, explicou Zuckerberg. “Ao fazer essas mudanças, espero que o tempo que as pessoas passem no Facebook e algumas medições de engajamento diminuam. Mas eu também espero que o tempo passado no Facebook seja mais valioso.” Com as alterações, o Facebook perdeu quase US$ 30 bilhões em valor em cinco dias. Mesmo assim, sua capitalização superava os US$ 500 bilhões na semana passada.

Em nenhum momento, o Facebook e o próprio Zuckerberg justificaram as mudanças como uma estratégia para combater as fake news (notícias falsas), uma epidemia do mundo moderno que se potencializa com o uso de ferramentas de internet. A mais poderosa delas, não há dúvida, é o Facebook com os seus 2 bilhões de usuários. Mas especialistas ouvidos por DINHEIRO acreditam ser esse o pano de fundo por trás das novas diretrizes do algoritmo da rede social. “Eles estão tirando o peso de suas próprias costas”, diz Elisabeth Saad, professora da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). “O algoritmo vai estreitar as escolhas e isso reduz o peso do Facebook como distribuidor de notícias falsas.”

Oportunidade: o Twitter, comandado por Jack Dorsey, conseguirá capitalizar a mudança do algoritmo do Facebook e atrair novos usuários? (Crédito:Michael Nagle/Bloomberg via Getty Images)

O problema é que o efeito das novas diretrizes do Facebook pode ser exatamente o contrário. No ano passado, a rede social de Zuckerberg começou a testar em países como Bolívia, Camboja, Eslováquia, Guatemala, Sérvia e Sri Lanka uma novo formato para o seu feed de notícias. A ideia era privilegiar conteúdo compartilhado por amigos e familiares, algo similar ao que foi anunciado no começo deste ano. As demais postagens, de marcas e de empresas jornalísticas, ficavam em uma aba batizada de Explorer.

A conclusão, segundo uma reportagem publicada no jornal americano The New York Times, é que o Facebook ampliou a disseminação das notícias falsas com essa nova estratégia. Em contraposição, os sites observaram o tráfego gerado através da rede social se reduzir. Na Eslováquia, o site jornalístico Denník N viu o engajamento dos leitores cair 30% nas redes sociais após as mudanças. “O Facebook está deixando uma mensagem clara que não é o lugar para notícias”, afirma Edney Souza, professor de redes sociais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). “Alguém pode ocupar esse espaço.”

Um dos candidatos é o Twitter. A companhia comandada por Jack Dorsey poderia capitalizar essa mudança no algoritmo do Facebook, atraindo atenção dos publicadores de conteúdo. A seu favor, ela conta com características que favorecem a disseminação de conteúdo jornalístico, como o tempo real e a instantaneidade. Contra está o fato de que o consumidor tem de alterar seu hábito de acesso da noite para o dia. “Você só frequenta uma rede social porque seus amigos estão lá”, afirma Marcelo Tripoli, vice-presidente de marketing digital da consultoria McKinsey.

O desafio do Twitter será fazer com que mais pessoas usem suas ferramentas. Algo que tem sido historicamente difícil. Com 330 milhões de usuários, a rede social do pássaro azul acrescentou 23 milhões de usuários a sua plataforma em dois anos. No mesmo período, o Facebook aumentou 461 milhões. Se quiser ganhar terreno diante da nova estratégia do Facebook, o Twitter precisará muito mais do que os apimentados tuítes do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.


Entenda as mudanças

Saiba o impacto do novo algoritmo do Facebook:

O que o Facebook anunciou?
Na maior mudança em seu feed de notícia, a rede social vai privilegiar publicações de amigos e familiares e reduzir exposição de páginas de marcas e de conteúdos jornalísticos.

Por que fez isso?
O Facebook alega que quer voltar às origens, privilegiando interações que são mais significativas aos usuários. Especialistas dizem que a empresa está pressionada por conta da disseminação de notícias falsas.

Qual o impacto para o Facebook?
A empresa acredita que o tempo gasto na rede social vai cair, mas que será mais bem aproveitado. Desde que anunciou as mudanças, empresa perdeu US$ 30 bilhões em valor.

Qual o impacto para marcas e empresas de mídia?
Elas terão redução do tráfego gerado pelo Facebook aos seus sites. Agora, terão de pagar se quiserem atingir um alcance maior.

O novo algoritmo vai combater as notícias falsas?
O efeito pode ser o inverso. Um teste que simulou recursos semelhantes aos anunciados no começo deste ano, na Bolívia, no Camboja, na Eslováquia, na Guatemala, na Sérvia e no Sri Lanka, ampliou a disseminação de fake news nesses países.